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O maior destino turístico do mundo entrou em colapso na semana passada. Milhões de franceses tomaram as ruas em 260 cidades para protestar contra a reforma previdenciária proposta pelo presidente Nicolas Sarkozy. Um dos pontos mais polêmicos da proposta é aumentar a idade mínima de aposentadoria de 60 para 62 anos para tentar conter o déficit da Previdência, que chega a 7,7% do PIB. Desde a terça-feira 19, as manifestações eclodiram por todo o país, em algumas cidades de forma mais violenta, como em Lyon, onde 40 carros foram queimados. Soma-se aos protestos a paralisação das refinarias de petróleo, dos transportes públicos e até dos coletores de lixo. Em Marselha, não há coleta desde o dia 12. Quase metade dos postos de gasolina do país ficou sem combustível, o que gerou filas intermináveis para abastecer. Até voos foram cancelados por causa de bloqueios feitos pelos manifestantes em torno de diversos aeroportos.

O movimento contra a proposta de Sarkozy foi liderado pelas centrais sindicais, em especial pela CGT, a maior delas. Os estudantes secundaristas e universitários também marcaram presença em peso nas passeatas e houve confronto com a polícia. Isso porque um dos temores dos franceses em relação à nova idade para se aposentar é que falte emprego para os mais novos, o que já é um problema. O desemprego gira em torno de 12% no país, mas o número dobra entre jovens de até 24 anos.

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CONFUSÃO
Manifestações em Paris, fila para abastecer em Rennes e o lixo acumulado em Marselha;
 caos já afetou setores da economia como a construção civil e o turismo

 

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Mesmo com o país mergulhado na ­desordem, Sarkozy mostrou-se irredutível. Mandou as tropas militares desbloquearem as refinarias e se manteve firme quanto à proposta de reforma previdenciária. “A França está engajada. A França a implementará”, disse na quarta-feira 20. “O governo se mantém intransigente. Precisamos continuar com grandes ações”, rebateu Bernard Thibault, presidente da CGT. Os líderes sindicais anunciaram mais dois protestos nacionais nos dias 28 de outubro e 2 de novembro. Diversos setores da economia sentiram o baque, principalmente o da construção civil, muito dependente do petróleo. A Federação Nacional de Aviação Comercial anunciou que as greves já causaram mais danos às companhias aéreas do que a erupção do vulcão islandês no começo do ano.
As paralisações revelam mais que o descontentamento com a questão previdenciária. São um símbolo de uma insatisfação crescente contra o governo Sarkozy, que está no poder desde 2007. Para Roseli Coelho, professora e cientista política da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), os franceses estão insatisfeitos com os rumos da nação desde governos anteriores. “Ninguém consegue resolver problemas críticos como o alto desemprego”, afirma.

Pesa contra o presidente o fato de que quase 80% da população apoia a greve – até porque os franceses são mestres na arte de protestar. Mas, se o caos continuar, talvez esse suporte diminua. A cientista política lembra que Sarkozy não está sozinho na batalha pela reforma da previdência – ele tem por trás dele a União Europeia pressionando para que tais ajustes sejam feitos rapidamente. Escassez de trabalho e déficit previdenciário são questões que afligem outros países europeus. “Mas também não podemos desprezar o poder da classe trabalhadora francesa. São mais de dois séculos de luta. Quando eles querem, vão até o fim”, diz Roseli. “A briga vai ser boa.”

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