Platão, Aristóteles, Schopenhauer, Matrix, Simpsons, Marilyn Monroe e futebol. Que loucura é essa? Embora possa parecer um desatino misturar filosofia com artistas ou produtos midiáticos, o livro Explicando a filosofia com arte, de Charles Feitosa (Ediouro, 200 págs., R$ 44,90), mostra que, ao contrário, é uma boa maneira de rebater o lugar-comum de que há um invencível apartheid entre o universo dos pensamentos e a realidade objetiva. Na prática, o que esta obra faz é utilizar fatos homogêneos para explicar a matéria dos sonhos – e vice-versa. O filme Matrix, por exemplo, nada mais seria do que a versão tecnológica da famosa Alegoria da caverna, descrita por Platão (427-347 a.C.) em A república. Ambos questionam o que é realidade e o que é alegoria da imaginação.

No texto de Platão, são descritas as certezas precárias de homens que estavam presos numa caverna e que acreditavam ser verdadeiras as sombras projetadas no fundo. Matrix retoma a questão usando o mundo virtual dos computadores capazes de oferecer “sombras” absolutamente convincentes. Mas nem por isso reais. Pelo viés descomplicado com que Feitosa discorre sobre o tema, o livro tem grandes chances de ser apreciado por adolescentes e jovens. De modo geral, tem o mérito de desmitificar o filósofo – “um homem velho, pois a velhice é associada à sabedoria; solitário, já que pensar pressupõe isolamento; frágil, talvez doente, porque quem usa muito a cabeça supostamente não usa o corpo” – e mostrar que interagimos com a filosofia muito mais do que supõe nossa vã imaginação.

Quando a banda inglesa de rock Supertramp fez uma capa de disco com a frase Crisis? What crisis? (1975), estava difundindo filosoficamente a idéia de que nossa “satisfação com os fatos da vida provém mais da habilidade de ignorar o que se passa à nossa volta do que de uma efetiva alegria de viver”. Uma bizarra foto de Arnold Schwarzenegger mostrando montanhas de músculos é o mote para dizer que um corpo tem outros poderes, como os de sentir, querer, imaginar e até pensar. Da mesma forma, ícones clássicos como a tela No leito da morte, de Edward Munch (1863-1944), são usados para lembrar que a dor da perda de alguém também é a “perda do ser” em toda a sua amplitude. O quadro Uma família, de Fernando Botero, é completado pela legenda: “Filhos não devem ser tratados como obras realizadas com o objetivo de trazer a eternidade para os progenitores. Crianças não são o mesmo que os pais nem são outros absolutos.” Por meio de associações semelhantes, o livro de Feitosa radiografa, com beleza, o elo entre a vida dita intelectual e a cotidiana.


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