01/08/2007 - 10:00
Quando era aluno da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, o prefeito Gilberto Kassab (DEM) fez do projeto de construção do aeroporto de Guarulhos seu tema de estudo para conclusão de curso. Reputado como um articulador de bastidores, Kassab cresceu na vida pública como uma espécie de comissário político, servindo de ponte entre os comandantes partidários e os militantes. Na semana em que o Airbus da TAM se chocou contra o prédio da companhia, em São Paulo, ele foi a primeira autoridade a chegar ao local do desastre – e, desde então, despontou nacionalmente discutindo o tema de seu trabalho de conclusão de curso: engenharia e segurança de aeroportos. Solteiro aos 46 anos, o prefeito de São Paulo chegou à cabine de comando da maior cidade do País por força da desincompatibilização de José Serra, que deixou a vaga para se tornar governador. A primeira pesquisa de opinião divulgada depois do acidente da TAM registrou um aumento de 100% no número de pessoas que avaliam sua administração como boa ou ótima. Na terça-feira 24, ele recebeu ISTOÉ para esta entrevista:
Não, não tenho.
Sim.
Pousaria.
Congonhas é um problema do Brasil. Há vários anos que se apontam as soluções, mas as ações não se concretizam. Quando o presidente da República apresentou um conjunto de propostas na semana passada, minha manifestação foi para traduzir a ele a expectativa dos brasileiros de que não fosse feito mais um plano de intenções. Todos conhecem as responsabilidades.
Devemos ter uma diminuição drástica do número de vôos. Nos últimos três anos, Congonhas teve um aumento assustador do número de passageiros/ ano, passando de 12 milhões para 18 milhões. Desde então, ocorreram várias manifestações consistentes, tecnicamente embasadas, que mostravam a preocupação com o número de vôos, sua saturação. Em Congonhas, deve haver a redução drástica do número de viagens, a limitação do uso de aeronaves em função do seu peso e a criação de uma área de escape nas duas extremidades da pista. Para tanto, você precisa encontrar solução de engenharia. É inadmissível um aeroporto com essa quantidade de vôos não ter uma área de escape.
A prefeitura deve levar a voz da cidade. São 11 milhões de brasileiros que vivem em São Paulo e que exigem segurança, conforto e melhoria nas condições operacionais de nossa aviação.
E o problema vem se agravando. Eu acredito que chegamos no limite. Com a dimensão que o acidente teve, nós podemos afirmar que o sentimento dos brasileiros é o de não tolerar mais a ausência de soluções concretas. O acidente não teria acontecido se o Airbus da TAM tivesse pousado no aeroporto de Guarulhos, mesmo com problemas. Isso em função do tamanho da pista de lá, quase o dobro da de Congonhas. Os técnicos dizem que a área de escape em Congonhas precisaria ter entre 200 e 250 metros de cada lado.
A responsabilidade é do governo federal. Caberia a ele arcar com os custos. Isso não quer dizer que a prefeitura não irá, dentro de suas possibilidades, cooperar com uma solução.
Minha vontade era fechar essa obra amanhã, mas preciso de embasamento técnico para tomar essa decisão. A Secretaria de Habitação e a Secretaria de Coordenação das Subprefeituras já identificaram graves irregularidades no prédio. Projetos diferentes foram apresentados na Aeronáutica e na prefeitura. Com base nessas informações, eu determinei a anulação do alvará de aprovação e execução da edificação e pedi à Secretaria de Negócios Jurídicos que entre com ação demolitória do prédio.
O que estamos debatendo é a questão da segurança dos aeroportos, as medidas a serem adotadas. Eu quero que reduza o número de operações no Aeroporto de Congonhas. A cidade, o País, o Estado exigem. Isso não é uma decisão para dois, três meses. É uma decisão para agora.
Eu, como engenheiro, tenho certeza, e há muito tempo. Eu não sei por que não ampliar Guarulhos. Eu não sou contra um novo aeroporto. Mas a ampliação de Guarulhos é urgente. Devemos trazer para essa discussão o Ministério Público, o Tribunal de Contas.
O paulistano quer o Aeroporto de Congonhas. Mas com segurança.
Se não tivermos a transformação de Congonhas, para compatibilizá- lo com normas de segurança rigorosas, eu sou o primeiro a defender o seu fechamento. Congonhas é um aeroporto operacional, ajuda a cidade, ajuda o País, é bem localizado, mas tem que operar com 100% de segurança.
Não quero me ater ao acidente em si. Seria uma leviandade eu dizer, antes de as investigações serem concluídas, que a culpa foi da pista, do piloto ou do avião.
Impotência diante de um acidente tão grave. Eu cheguei no momento em que o choque tinha acabado de acontecer. Senti o choque com a dimensão do acidente, misturada com a vontade de participar do processo para ajudar a salvar as vidas de quem tivesse sobrevivido. Isso vai ficar marcado como a maior tragédia que eu já vi.
Veja os absurdos que as administrações passadas cometeram. De qualquer modo, não podemos desviar o foco da atenção e o foco é o aeroporto, a aviação civil. Seria um grande erro, uma leviandade, uma irresponsabilidade dos brasileiros, desviar o foco para um prédio, para um posto de gasolina ou para uma asa de avião. O problema é da política de aviação civil do País. Estamos falando da morte de 200 pessoas, de algo muito grave que aconteceu, do desgoverno da nossa aviação civil. Mas é claro que ações pontuais devem ser feitas.
Ações que tenham sido equivocadamente cometidas no passado devem ser revistas, mas o mais importante é o presente. Existe hoje uma má condução da nossa política de aviação, as diretrizes estão equivocadas, não estão sendo focados os pontos de segurança, não está sendo avaliada a capacidade dos aeroportos. Tivemos investimentos e reformas, mas nós privilegiamos o cosmético em vez da segurança e da operação.
Nossas autoridades da aviação.
Eu não vou “fulanizar” porque senão ficaremos relatando os responsáveis nos últimos 40 anos.
Foi uma opção do governo ou das autoridades. O governo federal se manifestou. O comandante da Aeronáutica esteve presente. Não quero criticar nem defender a posição do governo federal. Mas eu, como prefeito de São Paulo, tinha que estar lá presente, atuando junto da defesa civil, apoiando as ações do governo do Estado e de todos aqueles voluntários envolvidos na ação de resgate.
Eu considero que foram manifestações infelizes, muito infelizes. Desrespeitosas para com a Nação brasileira. Mas também não quero ir por esse caminho porque é desviar o foco. O foco é: o que fazer para recuperar a qualidade da nossa aviação civil, em termos de conforto e segurança? O que precisamos é definitivamente ter coragem de afirmar: ou dotamos Congonhas de condições de segurança ou é melhor fechar.
Eu prefiro avaliar a nossa aviação e a política de aviação do governo federal, que é o seu governo…
Prefiro não dar nota. Avalio muito mal.
Vai. A prefeitura decidiu desapropriar o local. É uma homenagem às vítimas, aos seus familiares, e também uma maneira de lembramos ao Brasil a importância de repensarmos a política da aviação brasileira. Mas a hora continua sendo a de dar apoio às famílias das vítimas, em especial àquelas que não tiveram ainda o corpo de seus parentes ou amigos identificado.
Todas as nossas ações estão voltadas para fazer o melhor possível pela cidade. Nenhuma delas está atrelada a um objetivo de pesquisas, de serem bem avaliadas. Por outro lado, é muito gratificante, seja para o prefeito, seja para a equipe, saber que institutos com credibilidade avaliam positivamente o nosso trabalho. O importante é estarmos colhendo bons resultados. Esse é o nosso único objetivo. É muito gratificante que a população reconheça isso; traz entusiasmo para continuar o trabalho.
Isso não está na pauta; posso ser, posso não ser. Não trabalho por um reconhecimento para a reeleição. Na hora certa vamos discutir os dirigentes que compõem os partidos da aliança (PSDB-DEM). Eu mesmo sou dirigente de um dos partidos, me sinto credenciado para uma posição partidária. No ano que vem, a aliança encontrará um candidato e eu o apoiarei.
A relação é boa, é correta e em todo momento eu tenho deixado isso público, porque é importante para mostrar maturidade dos nossos governantes e é muito positivo para a democracia brasileira. É importante que isso seja dito e repetido e essa correção nas relações tem feito com que vários avanços aconteçam na cidade em diversas áreas – além da excelente relação que existe com o governo do Estado.
Acho que a relação administrativa não pode ser partidária. Eu defendo essa posição em qualquer ambiente, até dentro de instâncias partidárias.