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Parece uma provocação, e é mesmo. A entrega do Prêmio Nobel da Paz ao ativista chinês Liu Xiaobo, na sexta-feira 8, foi um recado claro ao regime de Pequim, que tem se beneficiado das liberalidades do sistema econômico mundial, mas resiste a abrir-se para a democraciaz. Aliás, a China não é a única destinatária das mensagens do Comitê Nobel. O prêmio de Literatura, anunciado um dia antes, parou nas mãos do escritor peruano Mario Vargas Lhosa, que, apesar da vasta obra, virou persona non grata entre a esquerda latino-americana após defender o neoliberalismo. A mesma esquerda que hoje se identifica com governos autoritários como o da Venezuela de Hugo Chávez. O presidente do Comitê Nobel, Thorbjoern Jagland, declarou que a China, hoje a segunda maior economia, deve assumir “mais responsabilidades” por causa de seu cada vez mais importante papel no cenário internacional. “Nas duas últimas décadas, Liu Xiaobo foi um grande porta-voz em favor dos direitos fundamentais na China”, declarou Jagland.

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REAÇÃO
A China considerou uma ofensa premiação de Xiaobo e impediu que
ele fosse informado da conquista

 

Primeiro cidadão chinês a receber o prêmio, o ativista de 54 anos é um ex-professor de literatura que passou os últimos 20 anos entrando e saindo das prisões chinesas por defender reformas democráticas. Foi detido pela primeira vez durante a repressão aos protestos do movimento estudantil na Praça da Paz Celestial, em Pequim, em junho de 1989. Xiaobo voltou a ser preso em 2008, por ter sido um dos dez mil signatários da Carta 08, uma petição formulada para exigir reformas políticas no regime comunista. Em dezembro de 2009, o dissidente foi condenado a 11 anos de prisão por “subversão”. O julgamento provocou uma onda de protesto pelo planeta.
 

A reação indignada de Pequim, que bloqueou as notícias sobre o Nobel na internet, ajudou a respaldar o reconhecimento a Xiaobo. Em entrevista coletiva na Turquia, o primeiro-ministro chinês, Wen Jiabao, nem sequer respondeu às perguntas de jornalistas. O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores chinês, Ma Zhaoxu, emitiu uma nota alegando que “Liu Xiaobo é um criminoso condenado pelo sistema judiciário chinês”. Em tom bastante duro, disse que a concessão do Nobel “é uma perversão” que vai “deteriorar” as relações entre China e a Noruega. O embaixador norueguês em Pequim foi convocado ao ministério para ouvir as queixas. Mas o chanceler norueguês, Jonas Gahr Stoere, prevê um efeito negativo, caso haja uma reação diplomática mais hostil. O Nobel da Paz é atribuído todos os anos pelo Comitê Nobel em Oslo, composto por cinco pessoas indicadas pelo Parlamento norueguês e conta com o auxílio de consultores. Os demais prêmios são concedidos pelo comitê em Estocolmo, Suécia.

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PEDIDO
Liu Xia espera que agora seu marido seja libertado

 

A homenagem tende a aumentar o constrangimento de Pequim no cenário internacional, uma vez que várias lideranças elogiaram a homenagem a Xiaobo. O presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, ressaltou o “sacrifício pessoal” do ativista. E o Dalai Lama elogiou sua luta “por reformas políticas, jurídicas e constitucionais” na China. A mulher de Xiaobo, a poetisa Liu Xia, concluiu com um pedido e um conselho: “A China deve aceitar esta responsabilidade, sentir o orgulho de ter sido escolhida e libertar meu marido.” Caso contrário, demonstrará que, apesar da força de sua economia, o dragão asiático ainda não tem estatura moral para liderar politicamente.

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