De todos os livros de Machado de Assis, Memórias póstumas de Brás Cubas talvez seja o mais difícil de adaptar para as telas. Mas o cineasta paulista André Klotzel dá conta do recado no filme homônimo, de 2000. Para encarnar o narrador-defunto, a escolha recaiu sobre Reginaldo Faria, que usa o artifício de se dirigir ao espectador no intuito de repassar os lances de sua vida. Como afirma em determinado momento, ?a franqueza é a primeira virtude de um defunto?. Klotzel mantém-se fiel à ironia e ao sarcasmo machadiano ao retratar um fracassado no amor que constata com melancolia sua própria mediocridade. A excelente direção de arte de Adrian Cooper mantém a credibilidade nas cenas de época, filmadas no Rio de Janeiro, em São Paulo, Salvador e Coimbra, em Portugal. Mesmo nas sequências fantásticas, a exemplo do delírio pré-morte, quando Brás Cubas se imagina cavalgando um hipopótamo na neve, o clima não destoa. Inspirada no cinema de Méliès, a passagem é muito bem realizada. Klotzel tempera de humor e leveza a filosofia barata do protagonista em relação à função do nariz no destino da humanidade e da roupa na perpetuação da espécie. Outras ótimas passagens são as visitas à cortesã Marcela (Sonia Braga), que o ama por ?15 meses e 11 contos de réis?, e o romance fortuito com a jovem Eugênia (Milena Toscano), aquela que era ?bonita, porém coxa?.