Os empresários paulistas Michel  Farah e Ettore Ferdinando Casoria formam uma dupla de muita sorte nos negócios. Eles ganharam o equivalente
a uma mega-sena acumulada no valor de R$ 26,8 milhões em apenas um contrato e sem passar pelo desconfortável radar da concorrência pública, como exige a lei de licitações criada para interceptar privilégios em contratos e compras no serviço público. No final de 2003, a Infraero (Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária), subordinada ao Ministério da Defesa, embarcou os dois em um contrato de primeira classe. A empresa da dupla, a FS3 Comunicação e Sistemas, recebeu a missão de “gerenciamento de disponibilidade e comercialização de espaços publicitários aeroportuários”. Traduzindo, a FS3 vai desenvolver um programa de computador para vender publicidade à iniciativa privada nos 17 mil pontos de propaganda espalhados pelos 65 aeroportos brasileiros administrados pela Infraero e por onde transitam anualmente 72 milhões de passageiros. A
Infraero é pilotada pelo ex-senador Carlos Wilson, que vai enfrentar turbulências
com o Tribunal de Contas da União por causa desse plano de vôo. “A Infraero tem que pedir uma auditoria neste contrato. Há irregularidades nele”, alerta o procurador do TCU, Lucas Furtado.

O contrato de número 182, firmado pelos diretores Fernando Brendaglia (comercial) e Adenauher Nunes (financeiro), foi aprovado numa reunião de toda a diretoria – inclusive o presidente Carlos Wilson – e assinado às vésperas do Natal de 2003. A confirmação no Diário Oficial da União ocorreu seis dias depois. A Infraero alegou notória especialização para contratar a FS3. Aí surge o primeiro problema. A lei de licitações, em seu artigo 25, diz que a notória especialização não pode ser invocada na contratação de serviços de publicidade e divulgação. A segunda questão é que a FS3, segundo os registros oficiais na Junta Comercial de São Paulo, foi criada em agosto de 2003, quatro meses antes de ganhar um naco cobiçado do mercado publicitário brasileiro – mídia de aeroportos –, que rende R$ 35 milhões por ano, mas pode bater na casa dos R$ 160 milhões em cinco anos. Na Infraero ninguém explica direito como os empresários da FS3 adivinharam os interesses da empresa e aterrissaram por lá. “Eu nunca vi na minha vida os donos desta empresa”, jura o presidente Carlos Wilson, ressalvando que o contrato pretende gerar receita para a empresa. O diretor comercial, Fernando Brendaglia, garante que tudo não passou de um acaso, tão improvável quanto acidentes aéreos. “Ele – Michel Farah – ligou para a minha secretária, marcou um encontro, veio aqui e mostrou o produto e eu gostei. Ninguém me encaminhou nem pediu por ele.” Brendaglia foi condenado pelo TCU em 2003 a devolver R$ 530 mil aos cofres públicos no tempo em que dirigia o desconhecido Instituto Brasileiro de Frutas. O motivo foi a dispensa de licitação na contratação de uma empresa de marketing.

Farah, dono de outras empresas de marketing, afirma: “O contrato com a Infraero não teve nenhuma influência política.” Para levar os R$ 26,8 milhões, a FS3 prometeu implantar um produto que será acessado pela internet com a intenção de ampliar a receita publicitária da Infraero. No computador estarão as informações sobre os pontos de publicidade nos aeroportos, o fluxo de pessoas, os valores e a disponibilidade dos espaços de mídia. De acordo com o contrato, o custo para licença e manutenção do software – o Média Plus Advantage – não passa de R$ 6 milhões, o resto é lucro. O contrato, mesmo publicado a dois dias do final de 2003, já previa para aquele ano um pagamento antecipado de R$ 5,2 milhões. O cheque para 2004 é maior: R$ 7,6 milhões. Contaminado pelo espírito natalino, o contrato prevê ainda que a FS3 receberá 25% do crescimento das receitas publicitárias a partir do funcionamento do sistema. Até agora, mesmo a Infraero pagando R$ 300 mil em estadias, transporte e hospedagem aos funcionários da FS3, o sistema não opera em nenhum aeroporto. Dez meses depois ainda estão no fará.


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