Reza a lenda que Curupira, uma estranha criatura que habita as matas brasileiras e possui os pés virados para trás, é implacável com quem maltrata os animais. Sem dó nem piedade, ele literalmente vira do avesso quem perturba a natureza. No que depender do empenho e da iniciativa de pesquisadores e ambientalistas, espera-se que daqui para a frente o pitoresco defensor das florestas tenha menos trabalho. Pelo menos na Mata Atlântica. Poucos lugares no planeta reúnem tão grande número de espécies exclusivas de plantas e animais. Um dos primeiros a escrever sobre a região foi o padre José de Anchieta. Em carta a seus superiores, por volta de 1560, ele retratou algumas das jóias da coroa. Agora, para mobilizar e sensibilizar os brasileiros para a conservação da mata, acabam de sair do forno dois livros sobre a floresta que já ocupou uma área de 1,3 milhão de quilômetros quadrados.

O livro Animais da Mata Atlântica (Ed. Empresa das Artes, R$ 70, 188 págs.) mostra quem são e como vivem os animais que habitam o bioma declarado Patrimônio da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco). O difícil foi selecionar o elenco a retratar, já que ali vivem cerca de 1.800 espécies só de vertebrados terrestres.
No livro há fotos e informações de 37 mamíferos, 35 aves, 25 répteis,  32 anfíbios, 15 peixes, 23 insetos e 24 outros invertebrados, entre eles aranhas e escorpiões. “Usamos o endemismo e a ameaça de extinção como critérios de escolha”, explica a bióloga Sandra Steinmetz, diretora da empresa Ambiental Consulting, patrocinadora da edição.

A obra conta a história da Mata Atlântica, sua ocupação, lendas e mitos, além dos primeiros registros da zoologia do Brasil. “O brasileiro precisa se orgulhar do que tem. As crianças conhecem mais os animais africanos do que os daqui”, reclama Sandra. Para isso, ela reuniu mais de dez especialistas para fazer uma radiografia de cada espécie apresentada no livro. O resultado é uma edição cuidadosa que prima pelo ineditismo de unir numa mesma coleção todas as classes de animais, inclusive peixes. A idéia é ampliar o projeto a ponto de editar um livro para cada bioma nacional, da Amazônia ao Pantanal.

Já o livro Muriqui, uma jornada fotográfica pelas florestas do maior macaco das Américas, de Luciano Candisani (DBA Editora, R$ 70, 144 págs.) se dedica a explorar os aspectos mais curiosos de uma das espécies-símbolo da conservação. O animal, que já habitou vastas áreas da Mata Atlântica, hoje está ameaçado de extinção e vive em pequenas áreas remanescentes de floresta. O nome desse macaco, que
em tupi significa “povo tranquilo”, expressa sua característica principal: a cordialidade. É comum ver os adultos se abraçando entre um pulo e outro nos galhos das árvores. Eles raramente brigam ou são violentos.

Entre as curiosidades mostradas com belíssimas fotos está o fato de os muriquis soltarem sons estridentes, como relinchos, para anunciar aos companheiros  que encontraram uma árvore cheia de frutas. Ou, ainda, que depois de se alimentar, os muriquis costumam fazer uma sesta. Já os seus filhotes, assim como as crianças, gostam de se divertir e suas brincadeiras têm papel fundamental no desenvolvimento motor e social. Com riqueza de imagens, os dois livros recém-lançados mostram que talvez esteja na hora de os seres humanos se espelharem no comportamento conciliador de seus ancestrais para garantir a preservação de sua própria espécie.