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DILMA
Discurso em Brasília no auditório
do hotel Golden Tulip às 23 horas
 

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SERRA
Discurso em São Paulo no
Expo-Barra Funda à meia-noite

Aconteceu o que ninguém esperava. Nem mesmo os políticos mais otimistas do PSDB e do PV apostavam no desempenho impressionante da candidata à Presidência Marina Silva nesta reta final da campanha, que levou à realização do segundo turno. Diante do resultado surpreendente – com 99,99% da apuração concluída, Dilma somava 47,6 milhões de votos, contra 33,1 milhões de Serra e 19,6 milhões de Marina –, na mesma noite do domingo 3 as equipes de Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) se reuniram para discutir as estratégias a serem adotadas até o dia 31 de outubro. Na reunião do PT, foi usada uma expressão bélica para definir o espírito que norteará a campanha petista a partir de agora. “Teremos um bloco de forças atuando em forma de cunha numa direção única”, disse um poderoso membro do staff petista. Ele se referia à participação ativa na campanha de Dilma de governadores, deputados e senadores eleitos pelo PT e pela base aliada. A “campanha unificada” não foi posta em prática na primeira etapa das eleições por causa da dificuldade em conciliar as agendas nacional e regional, e por causa da disputa entre os partidos governistas em alguns Estados. Agora, explicou a mesma fonte, a expectativa é que não haja dispersão das forças aliadas. Dentro dessa estratégia de ação agregadora, Marina Silva, por seu passado petista, também será imediatamente sondada.

Já na campanha de Serra, que ainda festejava um resultado que muitos já não esperavam mais, o sentimento é de que, agora, vem pela frente outra eleição. Além de buscar os votos “verdes”, o PSDB pretende abrir mais a campanha nacional, até então restrita a poucos tucanos, a aliados, simpatizantes e setores refratários ao PT. Uma das ideias, com essa iniciativa, é tentar atrair artistas, intelectuais e personalidades da sociedade civil que estejam insatisfeitos com o atual governo e, por isso, declararam voto em Marina Silva no primeiro turno.

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PROMESSA
Campanha petista terá reforço: “Onde
houver segundo turno, haverá Lula”, anuncia o presidente

No domingo à noite, na reunião do PT, realizada no Hotel Brasília Imperial, participaram, além de Dilma, o ex-ministro Antônio Palocci, o secretário-geral do PT, José Eduardo Cardozo, o presidente do PT, José Eduardo Dutra, e o deputado estadual reeleito Rui Falcão (PT-SP), um dos coordenadores da campanha. Os petistas resolveram que Dilma também vai reforçar, em comícios pelo País e na televisão, a defesa da continuidade do governo Lula e a comparação com os oito anos da administração Fernando Henrique Cardoso. Apesar de terem acreditado o tempo todo na vitória em primeiro turno, o clima ainda é de otimismo pela vantagem de mais de 14 milhões de votos sobre José Serra. Integrantes da campanha lembram que o próprio Lula, um dos presidentes mais populares que o Brasil já teve, não conseguiu vencer as eleições de 2002 e 2006 sem necessidade de segundo turno. “A Dilma já começa na frente. A nossa arma será o debate de projetos e de programas. Além da comparação dos dois governos, o Serra vai ter que dizer a que veio”, disse o deputado eleito Cândido Vaccarezza (PT-SP).

O otimismo da campanha de Dilma está ancorado em números. Para o diretor do Vox Populi, Marcos Coimbra, enquanto para a petista é necessário convencer apenas 3% do eleitorado no segundo turno, para liquidar a eleição, Serra precisa conquistar quase 20 milhões de eleitores. “O caminho de Dilma é muito mais fácil. Ela continua sendo a favorita para vencer a eleição”, disse Coimbra. Segundo ele, o que o PT deve fazer é procurar entender por que pessoas que pensavam em votar em Dilma desistiram. “Daí a questão é encontrar argumentos para trazer de volta esses eleitores.” Outro especialista em pesquisa, o sociólogo Antônio Lavareda, pensa na mesma linha: “O segundo turno leva em conta a votação que o candidato teve no primeiro turno e mais a distribuição dos eleitores do terceiro lugar”. Segundo ele, Serra precisaria atrair 85% dos eleitores da Marina. Já para Dilma bastaria conquistar apenas algo em torno de 20% dos eleitores da candidata do Partido Verde. A campanha de Dilma, pela previsão de Lavareda, vai procurar mostrar o segundo turno como uma “prorrogação da partida”. O desafio da campanha de Serra é consideravelmente maior: reunir votos suficientes para “uma nova partida”.
O ministro Marco Aurélio Garcia, assessor de Assuntos Internacionais da Presidência, insiste que Dilma tem tudo para ganhar no segundo turno. “Teríamos que fazer um esforço gigantesco para perdermos essa eleição”, disse ele. “A Dilma era uma candidata pouco conhecida e chegou a 47% dos votos, o que é um resultado extremamente significativo”. Garcia, um dos responsáveis pela formatação do programa de governo da candidata, acredita que teve impacto negativo o fato de dois candidatos estarem pressionando por um segundo turno . “Nossa candidatura foi atacada em dois níveis”, lembrou. O secretário-geral do PT, José Eduardo Cardozo, também considera que o resultado do primeiro turno foi excelente. “Não há o que mudar na campanha. Temos que reforçar que Dilma representa a continuidade do governo Lula que se saiu muito melhor do que o governo Fernando Henrique Cardoso, representado por Serra”, afirmou.

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Para não deixar a militância petista esmorecer, o presidente Lula estará ainda mais presente na campanha. Em conversas com aliados, quando a pesquisa de boca de urna já apontava o segundo turno, Lula garantiu: “Onde houver segundo turno, haverá Lula”. Por volta das 19 horas de domingo 3, o presidente encontrou-se com a candidata do PT no Palácio da Alvorada. Também estava presente o chefe de gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho. Foi nessa conversa que, em consenso com Lula, Dilma decidiu fazer um pronunciamento aos jornalistas no fim da noite. Durante a tarde, pelo telefone, Lula havia aconselhado a petista a evitar declarações públicas até o fim da apuração. A entrevista ocorreu no Hotel Golden Tulip. Dilma estava acompanhada do vice Michel Temer, dos ministros da Fazenda, Guido Mantega, e de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, além de Palocci e Dutra. Ela explicou que daria a declaração em consideração aos jornalistas e à militância. “Começo agradecendo a todos os brasileiros e brasileiras que votaram em mim neste 1º turno. Agradeço os mais de 46 milhões de votos. Me sinto muito honrada”, disse.

Em seguida, Dilma cumprimentou Marina e Serra, especialmente a senadora, pelo desempenho obtido na eleição. “Gostaria de dizer para vocês que considero essa campanha um momento especial da minha vida. Vamos encarar esse segundo turno com muita garra e muita energia”, afirmou. Dilma ressaltou ainda que no segundo turno terá mais tempo para detalhar seus projetos para erradicação da miséria e para o desenvolvimento do País: “Vamos fazer com que os 190 milhões de brasileiros possam desfrutar das riquezas do Brasil”. Dilma aproveitou ainda para destacar a vitória do PT e da base aliada nas eleições proporcionais. Ao fim, a candidata do PT, afinada com a estratégia definida horas antes pela coordenação de sua campanha, fez um agradecimento especial “à militância aguerrida”, citando nominalmente as legendas aliadas. “Nós somos bastante guerreiros, acostumados a desafios e somos de chegada. Tradicionalmente, a gente tem se desempenhado bem no segundo turno. Tenho certeza que nós vamos ter um processo muito importante de esclarecimento, de diálogo com a população, com os movimentos sociais e com todos os representantes da sociedade civil”, encerrou.
Pelo lado tucano, para conquistar novos apoios, a idéia é acentuar as diferenças entre José Serra e Dilma Rousseff nos programas de TV e em comícios pelo País. “Apostamos na rejeição de parte do eleitorado ao PT. Esperamos atrair todos aqueles que não querem a continuidade deste governo”, disse à ISTOÉ um dos integrantes da campanha tucana.

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Prova de que a campanha deverá mesmo ser descentralizada neste segundo turno é que logo depois da confirmação do resultado, Serra telefonou para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que ficou à margem e foi pouquíssimo consultado no primeiro turno. Na conversa, FHC recomendou uma maior participação na campanha de Geraldo Alckmin, governador eleito de São Paulo, e de Aécio Neves, senador eleito por Minas Gerais, e principal padrinho de Antonio Anastasia, o governador vitorioso em seu Estado, e ainda de Beto Richa, eleito governador do Paraná. A estratégia é interessante, na opinião do sociólogo Antônio Lavareda. “Se você leva em conta eleição de governadores, o quadro ficou equilibrado: a coligação governista elegeu maior número de governadores, mas, se você pensa em número de população, há um relativo equilíbrio de 50% de cada lado”, avalia. O PSDB, ressalta Lavareda, elegeu os dois governadores dos principais estados do País e venceu também no Paraná. “Em Minas e São Paulo você tem alguma coisa como 35% do eleitorado. Junta com Paraná dá 42%”, ressalta o sociólogo que é ligado ao DEM.

Na conversa com Serra, o ex-presidente Fernando Henrique sugeriu também que o PSDB incorporasse novas bandeiras nas próximas três semanas, entre as quais as defendidas por Marina, como o desenvolvimento sustentável e a defesa intransigente do meio ambiente. Outro conselho foi que se fizesse um forte pronunciamento para celebrar a ida para o segundo turno e motivar os aliados, o que ocorreu na madrugada de segunda-feira 4. “Quero fazer um chamado aos partidos, aos políticos e aos brasileiros. Vamos juntos, na luta, para construir um país melhor, com os mesmos ideais democráticos que nos trouxeram até aqui. Tenho a oferecer a minha vida, a minha biografia e a capacidade de tirar as coisas do papel e fazer acontecer”, disse Serra em discurso emocionado na Expo Barra Funda, em São Paulo. O ex-governador havia sumido desde que votou pela manhã na capital paulista. Na verdade, Serra aguardava o resultado e, após a confirmação da realização do segundo turno, elaborou cuidadosamente seu pronunciamento. E repetiu tópicos usados durante o debate da TV Globo, realizado na última quinta-feira. “De braços dados, cabeça aberta e coração leve nós vamos caminhar para vitória. Vamos para a vitória pela Presidência e pelo Brasil”, conclamou Serra, ao lado da mulher Mônica.

Até agora, a campanha do PSDB havia sido conduzida quase que exclusivamente por Serra e pelo marqueteiro Luiz Gonzalez. Entre os poucos conselheiros de Serra, estão o senador eleito por São Paulo, Aloysio Nunes Ferreira, que deverá exercer papel ainda mais importante daqui para frente, o deputado baiano Jutahy Magalhães Jr. e o ex-secretário de Cultura de SP, Andrea Matarazzo. Mas não faltaram críticas dos próprios tucanos a esse modelo, em que poucos decidem e a maioria não tem voz. Nas conversas mantidas no domingo à noite, dirigentes do PSDB, embora animados com a nova etapa da eleição, reconheceram que a passagem de Serra para o segundo turno foi mais fruto da sensacional reta final da candidata do PV, Marina Silva, do que da ação dos tucanos. Dessa forma, espera-se que Gonzalez, idealizador e mentor dos programas na televisão, seja mais sensível, nos próximos dias, aos conselhos dos aliados. Entre os erros na primeira fase das eleições, debitados na conta do marqueteiro, estão o fato de Serra ter exibido, em seus primeiros programas de televisão, sua imagem ao lado de Lula, e as promessas consideradas eleitoreiras e oportunistas pelos próprios aliados, como a criação do 13° para o programa Bolsa Família.

No início da noite do domingo, especulou-se que Serra estaria sendo pressionado pelo comando do PSDB para substituir o vice do Democratas, Índio da Costa (RJ), por um político do PV. O escolhido pelos idealizadores dessa mudança seria Fernando Gabeira, candidato derrotado ao governo do Rio de Janeiro. Mas, em seu discurso na Barra Funda, Serra praticamente afastou a hipótese, ao elogiar publicamente o companheiro de chapa. “O Índio deu um alento na juventude, contribuiu muito na área da internet e comunicação e, com certeza, será um grande companheiro de jornada”, disse. Além de questionável do ponto de vista jurídico, a mudança poderia se transformar em mais um equívoco eleitoral. E de uma coisa os tucanos estão convencidos. Até o dia 31 de outubro, data do segundo turno, não há mais espaço para erros, sob pena de todo o esforço feito para levar a eleição para o segundo turno ir por água abaixo.

Com reportagem: Claudio Dantas Sequeira e Hugo Marques