Ser a maior editora do País em tempo recorde. A frase poderia ser um slogan meio óbvio da Editora Record, uma das grandes no ranking nacional. Mas esconde o plano ambicioso da Planeta do Brasil, que em apenas dois anos e meio de atividade está desestabilizando o mercado nacional com grandes contratações. De sua sala, no oitavo andar de um edifício que dá vista para o pulsante coração financeiro da avenida Paulista, em São Paulo, o diretor-geral da editora, o argentino César González de Kehrig, traça os objetivos da empresa. “A vocação da Planeta é essa. O grupo é líder em todos os mercados em que atua e o Brasil não pode ser exceção”, afirma. Além de Fernando Morais, já se tornaram “planetários” o jornalista Zuenir Ventura, contratado para quatro livros inéditos; o sociólogo Paulo Lins, que tenta repetir o sucesso de Cidade de Deus com Plano mago; e Eric Nepomuceno, encarregado de um relato sobre o massacre de Eldorado do Carajás. Nos bastidores comenta-se que as conversas já estariam avançadas com Carlos Heitor Cony, Moacyr Scliar, Frei Betto e Ronaldo Costa Couto. O grupo espanhol estaria de olho também em Amyr Klink, Luis Fernando Verissimo e Drauzio Varella. Cautelosos nas negociações, Kehrig e o diretor editorial, Pascoal Soto, não confirmam nada. Ao contrário, provocam. “Os grandes autores estão na mira da Planeta, e todos os nomes citados são grandes autores locais e fenômenos de venda. Sem dúvida alguma, que editor não gostaria de tê-los?”, ironiza Kehrig.

Crescimento – O avanço da Planeta, na chamada espanholização do mercado editorial brasileiro, traz na cauda o Grupo Oceano, especializado na área de paradidáticos – dicionários e enciclopédias –, e a Edições SM, voltada para o público infanto-juvenil. Transpõe também para cá a praça de guerra espanhola, já que o outro nome de peso recém-chegado é o grupo Prisa/Santillana, dono do jornal El País, que adquiriu 75% do capital da Editora Objetiva e vem a ser o grande concorrente da Planeta na Espanha. Para a Câmara Brasileira do Livro (CBL), a participação espanhola deve ser festejada. “O mercado brasileiro é um dos maiores do mundo e qualquer investimento é bem-vindo, pois garante diversidade e volume de lançamentos”, afirma Marino Lobelo, vice-presidente de comunicação da CBL. Segundo dados da CBL, um total de 26 milhões de brasileiros lê quatro livros por ano. Parece pouco, mas nem tanto. É a metade dos leitores europeus. “O que acontece é que lá eles já não têm mais para onde crescer e por isso estão buscando o aquecimento nos países do Terceiro Mundo”, completa Lobelo.

A avaliação é perfeita em relação aos planos de expansão da Planeta, que projeta para este ano um crescimento de 40% em relação a 2004. Com a credencial de mais de 50 anos de existência, o grupo espanhol é o quinto maior do mundo e o primeiro em língua espanhola, atuando em cerca de 20 países hispânicos, o que garante lançamentos globais de seus livros. “Não chegamos aqui para ver o que acontece. Em língua portuguesa, já estávamos em Portugal. Na América, só o Brasil é que estava faltando”, afirma Kehrig, que comemora os 230 títulos lançados. Quem não está gostando nada desta arrumação nas prateleiras são as concorrentes, que acusam a Planeta de inflacionar o passe dos escritores locais e desfalcar seus catálogos. “As mesmas editoras fizeram o mesmo em outro momento e, logicamente, pegaram os melhores. Fernando Morais não foi inventado pela Companhia das Letras, era de outra editora”, ataca Kehrig. Soto completa: “As grandes casas editoriais do Brasil não costumam economizar na disputa dos grandes best-sellers internacionais. Será que elas estão dando o mesmo tratamento para o autor nacional?”

Vinculado à Record, mas contratado pela Planeta para o projeto de Eldorado do Carajás, o escritor carioca Eric Nepomuceno vê o cenário com bons olhos. “Isso contribui, e muito, para profissionalizar o escritor brasileiro. Não tenho queixas da minha editora, mas reconheço que essa mexida no mercado é boa para todos nós.” Outro que andou conversando com Kehrig e Soto foi Jô Soares, sondado no ano passado. “Foi uma abordagem supersimpática e profissional. Mas eu tinha vínculos com a Companhia das Letras e não houve necessidade de quebrá-los”, conta Jô, que continua na mira dos espanhóis. “A chegada destes grupos é um sinal de que o mercado é bem maior do que pensam os próprios escritores.” Mas é bom não crescer os olhos. “Não chegamos com uma mala de dinheiro para repartir aos melhores. Oferecemos um projeto editorial”, diz Kehrig, com aquele humor de quem não veio para brincar.


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