Antes tarde do que nunca. Aos 84 anos, Fidel Castro admitiu o óbvio:
o modelo econômico imposto à força ao povo cubano não funciona. Foram necessários 51 anos de uma ditadura com todos os seus ingredientes – torturas, mentiras, perseguições, fugas, greves de fome e execuções de dissidentes – para que o comandante, enfim, fizesse sua reflexão. Não foi propriamente um mea-culpa. Como todo ególatra, Fidel talvez tenha tentado se reabilitar perante a história, dando impulso ao incipiente processo de abertura econômica na ilha – o que não consola as almas de milhares de cubanos assassinados nos seus pelotões de fuzilamento.

Seja como for, Fidel deu um pequeno exemplo, que talvez também devesse ser seguido por aqui.
A começar pelo presidente Lula, que poderia reconhecer que a herança recebida dos que o antecederam não foi tão maldita assim – e que muito do que se colhe hoje foi plantado em governos anteriores. Por falar nisso, Fernando Henrique Cardoso poderia admitir que errou ao apostar no fracasso econômico do governo petista. Em 2003, alguns cardeais tucanos falavam em “Lula, o Breve”, apostando que o presidente operário não aguentaria o tranco e levaria o País a uma moratória da dívida – o que traria FHC de volta ao poder, carregado nos braços do povo.

Na disputa presidencial de 2010, os dois principais candidatos também teriam a chance de rever seus passados. Dilma Rousseff faria bem se reconhecesse os erros cometidos no período da luta armada, pois a guerrilha, em vez de abreviar a ditadura militar, serviu como argumento para que os trogloditas a prolongassem, endurecendo a repressão. E José Serra, que hoje se coloca como vítima de um Estado policial que devassa a privacidade de sua filha, do seu genro e de alguns aliados próximos, poderia expiar os próprios pecados e confessar que esse papel não lhe cai bem. Serra carregará para sempre na biografia o peso da Operação Lunus, feita em 2002 contra Roseana Sarney, que era sua adversária e potencial candidata à Presidência da República. Naquele momento, pariu-se o ovo da serpente e a Polícia Federal começou a ser convertida numa polícia política, tão fartamente utilizada pelo PT.

Evidentemente, nenhum dos quatro personagens, presidente, ex-presidente ou postulantes ao cargo, jamais admitirá qualquer mancha no currículo. São todos heróis, quase semideuses. Mas Fidel, ao confessar seu erro, revelou um lado humano até então desconhecido. Amoleceu, sem perder a ternura. E pode ter dado início à implosão de um dos mais anacrônicos regimes políticos do mundo.


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