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“Temo o que pode acontecer a um país se os seus
suprimentos de uísque e charutos terminarem”

Winston Churchill, primeiro-ministro Inglês

Proeminente estadista britânico e um dos grandes líderes políticos da Segunda Guerra Mundial, o primeiro-ministro Winston Churchill (1875 – 1965) imprimiu à sua imagem pública o apreço pelos charutos. Seu nome estampa mais de uma centena de marcas de tabaco pelo mundo e, recentemente, a ponta de um charuto, supostamente deixada por ele, no estúdio de um escultor londrino, foi arrematada em leilão por US$ 6,5 mil. Durante o conflito mundial, Churchill fumava até dez charutos por dia e se tornou um tabagista ainda mais convicto diante da conhecida postura antifumo de seu inimigo alemão, o ditador nazista Adolf Hitler, cuja campanha contrária ao vício usava cartazes em que fumantes tinham suas cabeças esmagadas por botas do Exército. Histórias curiosas envolvendo o longo hábito do premiê – que fumou dos 24 aos 90 anos, idade em que morreu – estão no livro “O Charuto de Churchill” (Record), do escocês Stephen McGinty. Entre elas há o relato do piloto que o transportou até Moscou em 1940: “Ele encheu o avião com tanta fumaça que tivemos de abrir as saídas de bombas.”

Com o acirramento da guerra, os charutos do premiê se tornaram motivo de preocupação da agência de polícia britânica, a Scotland Yard. O livro reproduz o episódio de um móvel que lhe foi dado de presente com 24 caixas de tabaco provenientes de Cuba (entre elas a sua marca favorita, Romeo y Julieta). O presente alegrou Churchill, mas um especialista em envenenamento foi chamado para atestar a segurança. Após análises, nenhuma substância que pusesse em risco a vida do primeiro-ministro foi encontrada (acharam “dois pelos de rato, algo parecido com amido de milho e excrementos de inseto”). A obra revela, no entanto, que se os charutos estivessem envenenados vitimariam o alvo principal e todo o comitê de Defesa da Inglaterra; isso porque Churchill ignorou a segurança e decidiu provar as iguarias. Fez isso numa tensa reunião para discutir se o governo daria ou não auxílio militar à Rússia. A certa altura ele disse: “Cavalheiros, vou fazer uma experiência. Talvez resulte em alegria. Talvez termine em pesar – cada um desses charutos pode conter um veneno mortal”. Todos aceitaram os charutos e ao final concordaram em apoiar militarmente os soviéticos contra o avanço alemão. Decisão desejada por Churchill.

 

Leia trecho do prefácio de  “O Charuto de Churchill”, do escocês Stephen McGinty

“Não há dúvida quanto ao lugar que Winston Churchill ocupa no panteão dos fumantes de charuto…”
Gordon Mott, editor executivo da Cigar Aficionado.

O aroma da fumaça de charuto tem o dom de perfumar o ar a uma distância considerável de onde está aceso. Multiplique um fumante solitário por quatro mil e não se surpreenda com o fato de que os participantes do “Big Smoke”, que ocorre no centro de convenções do cassino
Mandalay Bay, em Las Vegas, quase não precisem de sinais luminosos que indiquem o caminho até o lugar do evento. Eles só precisam seguir o cheiro.
Durante uma hora homens de cabelo à escovinha com grossos bigodes e em trajes esportivos — tênis brancos, bermudas e camisas abotoadas — transitaram pelos corredores dessa ampla metrópole. Eles contornaram a vegetação parecida com uma floresta tropical enjaulada, passaram pelo aquário de tubarões com seus tubarões-tigre e ouviram os grunhidos desalmados dos bandidos de um só braço, saqueadores que agem como se tivessem dois braços. Poucos se acompanham de mulheres: louras quarentonas, morenas de 30 anos e até mesmo jovenzinhas ocasionais cujo esplendor, a julgar pela aparência, poderia soar como um ato ilegal.
Muitas fumam. As mulheres fumam charutos curtos, e os homens, enormes charutos que mais parecem toras de cedro: um ato num estabelecimento público que em qualquer outra cidade talvez desse em cadeia, mas, em Las Vegas — onde você pode perder sua casa na roleta antes de se consolar nos seios fartos de uma dançarina —, encoraja-se o ato de fumar, principalmente charutos. O Caesar’s Palace chega a ter um cartaz que ridiculariza a propaganda antitabagista: uma mulher de tentadores olhos negros que se reclina num sofá e mantém um charuto entre os lábios vermelhos. No cartaz está escrito: “É permitido fumar.”
Os corredores do centro de convenções são tão amplos que os hóspedes teriam de recorrer a carrinhos de golfe para cruzá-los. Ainda assim, lá pelas 18h25 de uma sexta-feira de novembro de 2004, quatro mil amantes de charuto abarrotavam um extenso corredor, um grande número de fumantes que produzia nuvenzinhas de fumaça azul no ar enquanto esperava com paciência pelo evento de abertura do “Big Smoke”. No principal centro de conferência, um grande salão quase do tamanho de um campo de futebol, o correcorre dos últimos arranjos. Cada um dos 21 fabricantes de charutos apresentando estandes decorados, distribuindo amostras e iscas: jovens de sorrisos brancos e brilhantes, pernas longas e torneadas, e um decote de tirar o fôlego. Organizado pela revista Cigar Aficionado como um meio de exaltar o charuto e apresentar novas marcas para o consumidor, o “Big Smoke” é de fato uma oportunidade para os obsessivos que cogitam tostar (às vezes, torrar) o seu tempo livre.
À entrada, cada participante recebe uma sacola com o logotipo da Cigar Aficionado e um bloco de tíquetes numerados.
Os números correspondem a um estande de charutos onde o tíquete pode ser trocado por uma amostra grátis. Embora os estandes estejam posicionados no centro do grande salão, os equipamentos essenciais que constituem “a boa vida” bailam diante dos olhos como fumaça. Em exposição há carros como Jaguar, Mercedes e o imenso Hummer de estilo militar.
Em uma tenda cercada por uma rede branca, um jogador de golfe profissional ensina a tacada perfeita. Em outra, uma longa fila de homens gordos e barbudos aguarda a vez de ter seus charutos acesos pela garota da Montecristo Platinum. É a modelo estonteante de nudez total e corpo coberto de tinta prateada que aparece na série de cartazes de enorme popularidade da Montecristo Platinum, uma marca de charutos produzidos pela Altadis USA Cigars, a maior indústria dos Estados Unidos. Ela também representa um monte de pixels, visto que os homens são fotografados sozinhos e em seguida adiciona-se a “garota” à foto com auxílio de computador. O único estande com uma fila gigantesca é aquele que os entusiastas do futebol americano ganham uma foto e um férreo aperto de mão de uma celebridade do esporte.
É curioso imaginar o que Winston Churchill, o santo secular do fumante de charuto, faria nessa farra. Afinal, ele é o homem que incorporou a tríade de valores, força, poder e riqueza, ou ilusão de riqueza, pelo menos no caso dele, valores que hoje são mais associados a esse conjunto de folhas de tabaco enroladas. Será que na época da “guerra” ele torceria o nariz para tantos jovens bem-postos e desocupados? Talvez, mas talvez não. Até porque a “guerra do terror” não é nada quando comparada à guerra que o primeiro-ministro britânico empreendeu em seu país entre 1940 e 1945. Talvez ele apreciasse o evento. Não podemos esquecer que Churchill amava intensamente os americanos. Filho de uma mãe americana que ele adorava (embora ela quase não tivesse tempo para ele), Churchill fez frequentes viagens ao país antes e depois da guerra. Durante o conflito ele solicitou aos Estados Unidos: “Deem-nos os instrumentos, e nós terminaremos o trabalho”. Contudo, ninguém ficou mais aliviado do que ele quando os EUA entraram na guerra após Pearl Harbor.