Quanto mais contemplamos obras de arte, mais aprendemos sobre os costumes da época, os movimentos culturais, religiosos e literários, juntamente com um conjunto de ensinamentos sobre os mais diversos temas. Cada artista tem uma narrativa e é fascinante observar pinturas em busca de detalhes e de histórias escondidas. Para a coluna de hoje, selecionei 10 obras de arte de diferentes artistas que escondem segredos bem interessantes:

1- Pablo Picasso, “O Quarto Azul” – O quadro foi produzido entre 1901 e 1904, mas antes de mostrar a imagem de uma mulher nua tomando banho, a tela tinha um antigo retrato escondido debaixo das camadas de tinta azul. Após um cuidadoso estudo feito em 2008 com equipamentos de raios infravermelhos, encontraram o rosto de um velho de barba, usando um terno e gravata borboleta. Picasso tinha muitas ideias, mas nem sempre tinha dinheiro para comprar novas telas, principalmente no começo de sua carreira. Portanto, essa obra não é a única que foi produzida em cima de uma outra versão. O mistério agora é descobrir quem foi o modelo dessa pintura escondida.

2- Vinte Giocondas, mas apenas uma Mona Lisa – Existem quase duas dezenas de telas retratando La Gioconda. Existe um mistério se essas obras foram feitas pelo próprio Leonardo da Vinci ou se pintadas por alunos. Todas as réplicas, sem exceção, são um esforço para repetir o famoso sorriso de La Gioconda. Alguns retratos, como o que faz parte do acervo do Museu do Padro, parecem muito com o original, mas não exploram na profundidade com a técnica do Sfumato. Leonardo Da Vinci levou anos para pintar Mona Lisa, usando tinta a óleo sobre madeira, superfície muito utilizada nas pinturas do século XV. Clique aqui para ler uma coluna inteira que escrevi sobre Mona Lisa.

3- Sandro Botticelli, “Primavera” – A pintura foi criada a pedido de Lorenzo de ‘Medici e deveria se tornar um presente de casamento. Mostra uma mensagem secreta e sofisticada para o casamento que se aproxima. Vênus é uma mulher casada e seu véu insinua que é tímida. A pintura transmite a mensagem que se o noivo decidiu se casar com uma nobre garota parecida com uma deusa, sua vida certamente será doce e feliz. Prazer, castidade e beleza estão representados na pintura, assim como Mercúrio destaca as características masculinas de sensibilidade e eloquência. Os olhos vendados do Cupido antecipam que o amor é cego. Clique aqui para ler uma coluna que escrevi sobre arte renascentista.

4- Johannes Vermeer, “Garota Lendo uma Carta em uma Janela Aberta” – Esta pintura é um ótimo exemplo do talento de Vermeer, pintor holandês que também produziu a “Moça com Brinco de Pérola”. Mostra uma jovem perto de uma janela, mas possui mensagens ocultas. A janela aberta simboliza o desejo de liberdade e as maçãs no vaso de frutas simbolizam o lapso de virtude de Adão e Eva. Por baixo dessa pintura, descobriu-se outra original, que mostra um cupido na parede. Ainda não se sabe o que motivou o acréscimo do cupido e, depois, sua retirada do quadro final, mas para esconder essa imagem foram aplicadas camadas e mais camadas de tinta.

5- Paul Gauguin, “A Natividade” – Paul Gauguin nunca foi religioso, mas interessou-se pelo tema e até lançou um manuscrito chamado ‘The Modern Spirit and Catholicism’, no qual escreveu que “Deus pertence aos poetas, ao reino dos sonhos, sendo o símbolo da beleza em si”. Sabemos quem a natividade de Cristo é um dos grandes temas na arte Ocidental desde o século IV. O nascimento de Jesus é um tema recorrente na história da arte, mas não fazia parte do repertorio de Gauguin. Por trás de seu quadro Natividade e de outros produzidos no período natalino existe uma história bem triste. Quando morou no Taiti, sua mulher deu à luz uma filha, que morreu algumas semanas depois do nascimento. Com isso, pintou um Natal totalmente atípico, sem alegria. O Natal foi uma época de reflexão para Gauguin por causa do falecimento de sua filha e pela automutilação de Vincent van Gogh, que ocorreu após uma crise psicótica e uma briga dos dois, quando moraram na cidade de Arles. A Natividade não foi o único tema cristão que Gauguin pintou. Ele também produziu a Última Ceia, a Agonia no Getsêmani e Ave Maria, que está na coleção do MET, de Nova York. Nada mal para quem não acreditava em religião.

6- Gustave Courbet, “Preparação da Noiva” – O pintor realista Gustave Courbet gostava de retratar a vida cotidiana das pessoas, o trabalho, o cochilo após almoço e até funerais. A pintura “Preparação da Noiva” poderia ter passado despercebida entre outras obras, mas foi estudada com a ajuda de aparelhos de raios infravermelhos. Descobriu-se nas primeiras camadas de pintura que a mulher estava nua e as meninas ao seu redor usavam vestidos pretos. A tela originalmente se chamava “Preparação da Garota Morta” e acabou virando a imagem de uma noiva. Essa história parece piada.

7- Vasili Pukirev, “O Casamento Desigual” – Essa pintura mostra o drama da própria vida do artista. A mulher é a tão desejada noiva de Pukirev, Praskovia Varentsova, enquanto o noivo era o líder da nobreza, o idoso Tver, Alexey Markovich Poltoratskiy. A pintura tem uma senhora de pé atrás do noivo usando um vestido branco e uma coroa de flores na cabeça. Especialistas dizem que é a imagem da primeira esposa do pintor. Bem estranho pintar a noiva com outro homem e colocar a falecida mulher na obra.

8- Francisco de Goya, “Retrato de Don Ramón Satué” – O retrato foi pintado em agradecimento ao fato da família Satué ter escondido o artista quando ele precisou fugir de perseguições após queda do governo da época. Durante um estudo de raios-X, especialistas encontraram uma pintura de base mostrando a imagem de um homem com um uniforme. Goya pintava as celebridades da época como o rei da Espanha e o irmão de Napoleão Bonaparte, mas não se sabe quem foi registrado na primeira pintura da tela. Pelo fato de o desenho estar inacabado, esse mistério não será solucionado.

9- Hans Holbein, “Os Embaixadores” – O pintor fez retratos da realeza: Jean de Dinteville e Georges de Selve. Mas a obra se tornou interessante porque ele inseriu objetos enigmáticos (como o relógio de sol, os livros e o globo) para incentivar as reflexões sobre a disputa entre o clero e a ciência. Há uma mancha bem estranha no primeiro plano do quadro. Descobriu-se muitos anos depois que se trata de um crânio distorcido para simbolizar a morte. A caveira é quase imperceptível para quem olha a pintura de frente, mas é visível pelo ângulo lateral, destacando que a morte distorce a realidade e pode ocorrer a qualquer momento.

10 – Nariguda que virou uma princesa – O retrato renascentista de Isabella de’ Medici diz muito sobre como os ricos cuidavam de sua imagem no passado. Ela tinha um nariz feio, uma testa enorme e um queixo desajeitado. A primeira versão do quadro mostra bem sua fisionomia, mas a segunda versão, pintada em cima, foi retratada como se não existisse nenhuma dessas características. Aparece na pintura de Allesandro Allori como uma garota aristocrática medieval, com um rosto bonito, lábios sorridentes e mãos delicadas. Esses ajustes no retrato para adequar seu rosto ao seu ideal de beleza da época devem ter sido feitos a pedido da família, que era uma das mais ricas e influentes da Europa. O ‘photoshop’ na pintura foi descoberto graças aos modernos recursos de imagem que analisam atualmente os quadros. Restauradores conseguiram retirar as camadas de tinta usadas para os reparos da segunda versão e recuperar a imagem original da jovem, mais de duzentos anos depois da data de produção da pintura.

Isabella foi criada nos maravilhosos Palazzo Pitti e no Palazzo Vecchio, de Florença. No verão, vivia na propriedade rural da família, a Villa di Castello. Ela falava várias línguas e era conhecida por ser comunicativa e espirituosa. Como era costume entre os ricos da época, seu casamento foi arranjado. Ela se casou aos 16 anos com Paolo d’Orsini, em um enlace planejado por seu pai para manter relacionamento com o poderoso clã Orsini, baseado em Roma. Estranhamente, Isabella permaneceu na casa de sua família e seu novo marido voltou a Roma no dia seguinte ao casamento. Ela preferiu ficar em Florença, onde mantinha festas, encontros intelectuais e era patrona das artes. Seu caso de amor extraconjugal a levou à morte. Foi cruelmente assassinada para manter a honra do marido, que descobriu que seu primo era seu amante. Que pena que o photoshop não corrige crimes como esse.

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