17/05/2021 - 21:02
Ela tem apenas 77 cm de altura x 53 cm de largura. Fica protegida por um vidro brindado e rodeada de centenas de pessoas a todo o momento. Os corajosos que topam aguardar horas em fila para vê-la só conseguem o feito por alguns segundos, mantendo sempre a distância. Com todas essas restrições, por que Mona Lisa (1503–1519) é a obra mais famosa do mundo há mais de cinco séculos?
+ O novo mistério de Mona Lisa
+ Brasileira é a primeira a ver a Mona Lisa após reabertura do Louvre
+ Mona Lisa de cubos mágicos leiloada por € 480.200
Sua fama é tão enigmática quanto seu sorriso lendário. Dizem que ela se tornou um ícone após ter sido roubada por um italiano que desejava resgatar a obra e devolvê-la ao seu país de origem. O roubo realmente aconteceu em 21 de agosto de 1911. Na época, o Museu do Louvre (França) demorou um dia para notar a falta da obra e chegou a suspeitar do pintor Pablo Picasso, chamando-o para uma investigação, mas, foi comprovado que o ex-funcionário, Vincenzo Peruggia, escondeu a tela embaixo do casaco, saiu de mansinho e ficou anos na moita. Foi preso alguns anos depois ao tentar oferecer a pintura para uma galeria de Florença.
A ocasião foi aproveitada por um crítico de arte, Walter Pater (1839-1894), que começou a promover a pintura de forma exagerada. Como acontece nas mídias sociais, de repente recebeu um elogio de um famoso e depois de outro, ganhando destaque de escritores como Oscar Wilde. Suas ideias deram manchete em muitas mídias europeias e internacionais, como no New York Times. Com isso, o ‘boca a boca’ da época foi apenas um gatilho inicial para uma trajetória de fama e sucesso. Todo esse movimento fez também com que gerações e gerações de seguidores continuassem mencionando seu texto (assim como estou fazendo agora – risos!).
Não podemos esquecer que Mona Lisa é uma obra prima de Leonardo da Vinci (1452-1519), uma das figuras mais importantes da história. Portanto, não concordo com a teoria que o roubo ou o texto foram os únicos fatores de promoção. É fato que a obra que nasceu em berço esplêndido, mas também é notório que continua no estrelato há centenas de anos simplesmente porque as pessoas gostam do retrato. Leonardo da Vinci tem uma séria de obras primas, como “A Última Ceia”, porém é o gosto do público que define a importância das pinturas. Marcel Duchamp, Andy Warhol, Salvador Dali, Banksy e uma infinidade de artistas fizeram releituras da Mona Lisa, cujo rosto é uma das imagens mais reproduzidas no mundo, sendo usada para vender de tudo: camiseta, bolsas, cadernos, champanhe, automóveis, entre outros itens.
Confesso que fiquei decepcionada quando vi Mona Lisa pela primeira vez. Na época viajar para o exterior não era algo comum, não existia Internet e circulava pouca informação sobre arte no Brasil. Estava curiosa para ver a obra-prima pela primeira e saber mais da técnica do Sfumato, que eu já havia lido e estudado a respeito. Achei a obra muito pequena, mas segundos depois fiquei hipnotizada e entendi sua importância para o mundo das artes.
Poderia passar dias estudando e falando de Mona Lisa, mas, apenas como espectadora da pintura, compartilho algumas curiosidades:
1- A mais famosa do mundo – Mona Lisa é a pintura mais famosa do mundo e está exposta desde 1804 no Louvre, o museu mais importante, conceituado e visitado do mundo. Por atrair milhões de pessoas por ano, o museu sempre busca novas ideias para melhorar a experiência dos visitantes. Investe em APPS, apresentações e atividades online, mas, nada conseguiu diminuir as filas que continuam para ver a Madona, antes mesmo das outras 35.000 preciosas obras de arte que compõem o seu amplo acervo. A obra foi alvo de ataques de ácido e de pedra no passado. O vidro blindado foi colocado para aumentar sua proteção, depois que imbecis tentaram jogar tinta spray (1974) e danificar a pintura com uma xícara de café (2009).
2- A obra tem apelido – O ícone mundial desde os tempos da Renascença também é conhecido como “La Gioconda”. Levou anos para ser pintado por Leonardo da Vinci e foi feito com tinta a óleo sobre madeira, superfície muito utilizada nas pinturas do século XVI. Representa uma mulher com uma expressão introspectiva e um pouco tímida, mas com olhar e sorriso sedutores. O seu corpo representa o padrão de beleza da época e a composição mostra a personagem à frente de uma paisagem, algo incomum no século XVI.
3- Quem inspirou a obra? – Segundo o famoso biógrafo de arte Giorgio Vasari, a obra é um retrato de Lisa Gherardini, segunda esposa do rico comerciante de seda e lã, Francesco del Giocondo. Daí, surgiu o apelido “La Gioconda”. Porém, com a ajuda da tecnologia, especialistas indicam grande semelhança facial entre a Mona Lisa e outras pinturas do mestre renascentista, como São João Batista. Com isso, alegam que o rosto da Mona Lisa tem feições de Leonardo Gian Giacomo Caprotti, também conhecido como Salai e que atuava como assistente e aprendiz de Leonardo da Vinci, além de ser seu amante. Recentemente surgiu nova polêmica a partir da teoria de alguns historiadores que defendem a tese de que se trata de um autorretrato do próprio Leonardo da Vinci. Acho pouco provável essa tese, pois Da Vinci tinha um rosto cumprido, grandes orelhas e um nariz horroroso. Mas, não ficarei surpresa se o corpo do artista vier a ser exumado para análises científicas computadorizadas. Para mim, independentemente da ou das inspirações, Leonardo da Vinci foi além e criou algo fascinante: produziu um retrato cujo rosto de uma pessoa real foi transformado em um mito. Dizem que a obra como conhecemos hoje está inacabada porque Da Vinci morreu em 1519 antes de concluí-la. Certamente se tivesse vivido mais, o retrato teria novos ajustes.
4- Rosto enigmático– A grande habilidade de Leonardo foi dar vida a este notável retrato. O sorriso, o olhar, a suavidade da pele e as curvas do cabelo chamam a atenção dessa obra repleta de técnicas para hipnotizar a atenção de quem a admira. A boca se inclina suavemente para cima, tornando a pintura ainda mais enigmática para despertar a curiosidade sobre o humor da musa e a intenção do artista. O sorriso de Mona Lisa tem sido repetidamente objeto de muitos estudos para entender as características usadas que despertam a sensação de felicidade do público. Seus olhos parecem seguir os espectadores por terem sido pintados no ângulo de 15 graus para criar uma expressão ambígua e instigante. A maioria das pessoas tem a falsa sensação que a Mona Lisa não tinha pelos, mas isso não é verdade. A pintura original tinha sobrancelhas e cílios, mas com o passar dos séculos esses contornos começaram a desaparecer.
5- Corpo que fala – Outro enigma é a posição do braço direito. Foi a primeira vez na história que uma pintura retratou essa posição. Depois, centenas de artistas copiaram a ideia. É fascinante ver as curvas sensuais do cabelo, do corpo e das roupas da mulher, que ecoam nos ondulantes vales e rios imaginários atrás dela, repletos de contornos borrados para destacar a figura graciosa e transmitir a sensação geral de calma, sempre presente no trabalho de Da Vinci.
6- Rascunhos escondidos – Imagens infravermelhas revelaram os desenhos preparatórios em carvão de Da Vinci que ficaram atrás de camadas e camadas de verniz e de tinta aplicados durante anos. Sensacional notar que até o mestre da Renascença fazia esboços e mudava de ideia durante o processo de criação. Dois dedos da mão esquerda mudaram de posição e há um dedo inacabado. Uma mancha no canto do olho e no queixo são acidentes com verniz, contrariando as alegações de que Mona Lisa estava doente ou com problemas no trato e nas vias biliares.
7- Paisagem – O povo de Arezzo alega que a paisagem do fundo da obra de Mona Lisa é de um vale daquela região da Toscana. Adoro essa teoria porque minha avó é de lá. Graças à técnica do Sfumato (fumaça, em italiano), a cena não tem linhas ou bordas, fazendo com que as cores da paisagem se misturem, hipnotizando nossos olhos com as gradações e transições sutis de luz e sombra. O horizonte se encontra desnivelado, com o lado esquerdo mais alto que o da direita, fazendo com que a Mona Lisa pareça muito maior vista da esquerda do que da direita.
8 – Patrimônio – A obra não pode ser vendida, de acordo com uma lei de proteção do patrimônio francês. Como parte da coleção do Louvre, Mona Lisa pertence ao público. Há algumas décadas, aceitou convite da primeira-dama dos Estados Unidos, Jackie Kennedy, e foi de transatlântico, em uma cabine de primeira classe, para ser exposta no Metropolitan Museum (Nova York) e na National Gallery of Art (Washington, DC). Dez anos depois, foi apresentada no Japão. Esses tempos estão suspensos: as viagens não estão mais autorizadas.
9 – Arte com ciência – A Renascença reunia todas as atividades humanas. Arte significava ciência e verdade para a vida. Leonardo da Vinci combinava a sensibilidade flutuante de um artista com a sabedoria profunda de um cientista, que também tinha muitas outras habilidades. Mona Lisa mostra a personagem como uma criação milagrosa da natureza, ultrapassando as limitações sociais para adquirir um sentido universal. Com uma nova apresentação e uma atitude diferenciada da modelo, conseguiu criar uma fórmula mais monumental, viva, concreta e poética do que os retratos produzidos por seus antecessores.
10 – Segredos continuam aparecendo, com muitas especulações – Cinco séculos depois de Leonardo da Vinci pintar a Mona Lisa, o retrato continua sendo alvo de estudos científicos e de muita especulação. Cito um exemplo disso: em dezembro de 2010, o historiador de arte italiano Silvano Vinceti relatou que a Mona Lisa tem minúsculas letras e números em seus olhos e que esses ícones poderiam ser vistos com uma lupa. O Louvre imediatamente rebateu essa tese, indicando que não tinha vestígios disso em seus testes de laboratório, assim como não tinha encontrando nenhuma inscrição, letra ou número. Alegou que o envelhecimento da pintura sobre madeira tinha criado muitas fissuras na tinta, que poderiam parecer uma série de formas, mas que as interpretações definitivamente não eram pertinentes.
Mona Lisa continua sendo a obra mais famosa do Louvre e, consequentemente, a mais visitada. Além disso, recebe cartas de amor e flores de admiradores todos os dias, sem contar a correspondência online. Pelo jeito, seu sucesso vai continuar por muitos anos e torço para que isso aconteça. Se tiver uma boa história para compartilhar, por favor lembre de mim. Aguardo sugestões pelo Instagram Keka Consiglio, Facebook ou no Twitter.