“O petrolão e o mensalão eram uma coisa só”. Dessa forma simples, o ex-deputado Pedro Corrêa (PP-PE), antigo aliado do ex-presidente Lula, definiu em depoimento aos procuradores da Lava Jato como os recursos da Petrobras foram usados de maneira espúria para obter apoio político durante o governo do petista. O relato mostra como Lula atuou decisivamente para garantir a nomeação de um diretor indicado pelo PP com o objetivo único de roubar para o partido, no fim de 2003, e escancara um “modus operandi” pelo qual políticos vêm assaltando os cofres públicos.

O nome escolhido pela legenda para a diretoria de Abastecimento da Petrobras foi o de Paulo Roberto Costa, funcionário de carreira da estatal, mas a nomeação estava demorando. O motivo: o Conselho de Administração tinha resistência em aprovar a indicação. O PP, então, acionou Lula para resolver o entrave e o caso foi discutido em uma reunião no Palácio do Planalto, na presença do então presidente da Petrobras José Eduardo Dutra. “Lula disse a Dutra para mandar um recado aos conselheiros que se Paulo Roberto Costa não estivesse nomeado em uma semana, ele iria demitir e trocar os conselheiros da Petrobras”, relatou Pedro Corrêa em seu depoimento. Pouco depois, o apadrinhado do PP assumiu o cargo prometido.

Corrêa já assinou delação

Em uma outra reunião de Lula com integrantes do PP, na qual Pedro Corrêa estava presente, foi exigido mais espaço no governo, com vaga em um ministério. Os pepistas receberam como resposta uma amostra de que o então presidente da República sabia que a finalidade das indicações era desviar recursos. “Vocês têm uma diretoria muito importante, estão muito bem atendidos financeiramente. Paulinho tem me dito”, teria afirmado Lula, segundo o depoimento de Corrêa. O Paulinho era o mesmo Paulo Roberto Costa que, anos depois, foi preso pela Lava Jato e fechou o primeiro acordo de delação premiada, desencadeando um dos maiores escândalos de corrupção já vistos. Quando o PMDB passou a também dar apoio político à permanência de Paulo Roberto na diretoria de Abastecimento, novamente o PP foi reclamar com Lula. Pedro Corrêa relata a reação do presidente: “Lula disse que a diretoria era muito grande e que tinha que atender aos outros aliados, pois o orçamento era muito grande e a diretoria era capaz de atender todo mundo”.

O que pesa contra Pedro Corrêa
O ex-deputado tem duas condenações na Justiça

Mensalão
Autorizou assessor a receber valores do operador Marcos Valério. Foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal a 7 anos e 2 meses de prisão, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro

Petrolão
Recebeu recursos desviados da Petrobras estimados em R$ 11 milhões, por meio da diretoria de Abastecimento. Foi condenado por Sérgio Moro a 20 anos e 7 meses de prisão e está preso atualmente em Curitiba

Fantasma
Acusado ainda de desviar recursos da Câmara por meio da manutenção de funcionário fantasma no gabinete da filha Aline Corrêa, ex-deputada pelo PP-SP

Esse depoimento do ex-deputado foi tomado no último dia 1º para servir como base à denúncia feita pela Lava Jato contra Lula. Ele, porém, já assinou um acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal, ainda não homologado pela Justiça. Atualmente Corrêa está preso na carceragem da Polícia Federal em Curitiba, mas já foi um dos parlamentares mais influentes do PP, tendo ocupado a presidência nacional da legenda em 2005. Exerceu mandatos de deputado federal desde 1979, à época pelo Arena, o partido da ditadura militar. Sua ficha corrida também não é pequena: foi condenado no mensalão a 7 anos e 2 meses, por corrupção e lavagem de dinheiro, e cumpria pena em regime semiaberto quando foi preso por causa da Lava Jato. Neste caso, também já foi condenado pelo juiz Sérgio Moro, agora a uma pena superior a 20 anos.

Repasse a parlamentares

Questionado pelos procuradores sobre o mensalão, ele afirmou que “Lula tinha convicção de que a propina arrecadada junto aos órgãos governamentais era para que os políticos mantivessem as suas bases eleitorais mantidas com as propinas e continuassem a integrar a base aliada do governo, votando as matérias de interesse do Executivo no Congresso Nacional”. A contrapartida ao mensalão e ao petrolão, além do apoio aos projetos do governo, era também impedir a criação de CPIs ou convocação de integrantes do governo para prestar esclarecimentos. Ou seja, deixar de lado totalmente a função fiscalizadora do Legislativo e ficar de joelhos para o governo em troca do recebimento das propinas milionárias.

A contrapartida ao mensalão e ao Petrolão, além do apoio aos
projetos do governo, era também impedir a criação de CPIs

Pedro Corrêa relatou que a arrecadação de propinas por meio de cargos públicos já estava arraigada no PP e era uma prática recorrente. “As ilicitudes consistiam no seguinte: determinadas pessoas eram indicadas, estrategicamente, para altos cargos nos ministérios, secretarias, empresas públicas, autarquias, a fim de, ao atender o interesse de empresários, possibilitar a arrecadação de propina destinada ao partido e seus integrantes”. Sua franqueza chega a assustar. O ex-deputado confirma o que se comenta nos bastidores de Brasília sobre indicações a cargos públicos. “Os indicados pelos partidos eram responsáveis por conseguir a propina dos empresários e repassar aos parlamentares”. Afirmou ainda que o “modus operandi” do partido foi o mesmo nos outros governos. “Perguntado como funcionaram as indicações pelo partido nos governos Sarney, Collor, Itamar, Fernando Henrique Cardoso e Lula, afirmou que as indicações funcionavam da mesma forma”, contou. E, por último, disse que toda a estrutura partidária se beneficiava, não apenas a cúpula. “A arrecadação beneficiava, inclusive, deputados estaduais, prefeitos e vereadores, sendo o objetivo maior manter os mandatos e o poder”.

Foto: Félix R./Futura Press