A trilogia se construiu informalmente – primeiro foi a adaptação de O Primo Basílio, da obra de Eça de Queiroz. Em seguida, Lisbela e o Prisioneiro, de Osman Lins. Agora, é a vez de Hoje É Dia de Maria – O Musical, que estreia nesta sexta, 30, no Teatro Cetip. “E podemos ainda aumentar para uma tetralogia”, diverte-se Ligia Paula Machado, protagonista e codiretora do espetáculo, ao lado de Dan Rosseto e Kléber Montanheiro. “Nosso projeto é apresentar musicais luso-brasileiros.”

Inspirado na obra do dramaturgo e pesquisador Carlos Alberto Soffredini (1939-2001), Hoje É Dia de Maria – O Musical não se aproxima, porém, da versão televisiva que a Globo exibiu em 2005, com direção de Luiz Fernando Carvalho. “Fomos muito mais fiéis ao original de Soffredini que, por si só, é fabuloso”, comenta Francisca Braga, responsável pela adaptação. “Aqui, Maria, menina pobre do interior paulista, é uma mulher valente e não se preocupa em formar um par romântico com o Pássaro.”

Pássaro (Cleto Baccic) é um dos seres encantados com quem Maria se encontra na busca da realização de seu sonho: encontrar as franjas do mar. Ela parte depois de ser maltratada pela madrasta (papel vivido por Montanheiro) e o pai (Luiz Araújo). “O Pássaro representa o alter ego de Maria, a imagem dessa busca pela liberdade. Um é o espelho do outro”, completa Francisca que, como nos demais espetáculos, enfrentou uma detalhada pesquisa até encontrar as canções que se encaixavam na trama, auxiliando a narrativa.

“Selecionamos 19 músicas, cuja poética ajuda a contar a história”, conta Dyonisio Moreno, diretor musical que, ao lado de Francisca, encontrou verdadeiras pérolas, como Menina Moça (Ary dos Snatos, Paulo de Carvalho, Fernando Tordo e Joaquim Pessoa), eternizada na voz de Tito Madi. O repertório inclui ainda canções populares e grandes compositores, como Caetano Veloso, Catulo da Paixão Cearense, Gonzaguinha, Renato Teixeira, Marisa Monte, Vinicius de Moraes, Herivelto Martins e até Victor e Léo.

Um dos momentos mais curiosos acontece quando é interpretada Cajuína, de Caetano: nesse instante, Maria e dois seres da floresta apresentam um sapateado irlandês, para o qual foi preciso importar sapatos específicos. Na verdade, trata-se de um detalhe que marca os trabalhos apresentados e comandados por Ligia Paula Machado: para estimular a ludicidade do espetáculo, além das músicas, são apresentados ainda coreografias de sapateado americano, balé clássico, acrobacias de solo e aéreas, o que estabelece a conexão entre o erudito e o popular.

“Maria é um personagem que precisa de elementos mágicos da natureza para se manter firme em sua viagem fantástica”, comenta a atriz, que contou com o apoio da filha de Soffredini, Renata, para a viabilização do projeto. “Ela até pretende lançar um livro com a peça para que a obra de Soffredini reencontre o sucesso merecido.”

De fato, o dramaturgo notabilizou-se pela pesquisa de elementos que formam o folclore brasileiro – para escrever Hoje É Dia de Maria, por exemplo, Soffredini inspirou-se na coletânea de contos de Câmara Cascudo e Silvio Romero, com destaque para A Menina da Figueira, Lenda do Dia e da Noite e Cinderela. A partir desse rico material, ele criou um texto que virou uma paráfrase, elemento que se tornou característico de sua dramaturgia e que se constrói na luta entre o bem e o mal, o medo e a esperança, a força e a tristeza. “Isso permite que ele trate de problemas sociais como a exploração infantil”, completa Dan Rosseto.

Assim, Hoje É Dia de Maria – O Musical não se apresenta como um espetáculo infantil por tratar de temas delicados. Ao mesmo tempo, recupera uma prosódia típica do interior paulista, uma adorável forma de falar que, bem recuperado, transformou Soffredini em um Shakespeare caipira.

HOJE É DIA DE MARIA – O MUSICAL. Teatro Cetip.

Rua Coropés, 88. Tel.: 4152-9370. 6ª, sáb., 21h. Dom., 18h. R$ 50 / R$ 150. Até 27/1

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.