Poucos espectadores são capazes de reconhecer o rosto de Andy Serkis. Mas muitos já se consideram quase amigos pessoais de algumas das criaturas mais marcantes elaboradas pelo ator britânico nos últimos anos: Gollum, o monstro avarento de “O Senhor dos Anéis”, e “O Hobbit”, o valente capitão Haddock, do filme “As Aventuras de Tintim”, e várias encarnações do sensível gorila King Kong, sem mencionar o vilão King Bohan do videogame “Heavenly Sword”. Serkis atinge o auge de sua arte interpretativa como Caesar, o condutor iluminado de uma nova linhagem de primatas inimiga dos homens, em “Planeta dos Macacos: a Guerra”, terceiro e último longa-metragem da franquia distópica futurista ­— e darwinista — iniciada em 2011 e dirigida por Matt Reeves, que acaba de estrear no Brasil.

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As bilheterias mundiais do filme atingiram US$ 220 milhões desde a estreia em 14 de julho, para um orçamento de US$ 120 milhões. O sucesso se deve ao talento dramático de una sujeito sorridente e agitado de 53 anos que começou interpretando personagens de William Shakespeare ­ — e atualmente empresta seus gestos e olhares a imagens geradas por computador, ou CGI (computer-generated imagery). “Os papéis se alteraram com o tempo, e a própria natureza da interpretação mudou por causa da geração digital de imagem ”, diz Serkis, que esteve no Brasil na semana passada para divulgar o filme. “Apesar das mudanças, no fundo, sou um ator e quero ser conhecido como tal.” Se era conhecido por atuações clássicas, hoje o seu rei Lear e o seu Hamlet são a simulação incorpórea de seres fantásticos.

Formação

Na pele de pixels do macaco Caesar, Serkis emociona com sua inteligência e refinamento. Até críticos severos se renderam à sensibilidade do ator. “Este é um filme de Serkis”, afirma Anthony Lane, da revista “The New Yorker”. “O que chama o público é a presença computadorizada de Caesar. Serkis não está visível, embora se faça intensamente perceptível em cada contração, grunhido ou olhar desamparado desse avatar de animal.”Até a moda do cinema CGI, no início deste século, a atuação se dava por expressões de rosto, maquiagens ou máscaras.

A partir de então, a captura de movimentos faciais e corporais passou formar a base do trabalho do ator. Serkis se tornou líder de um novo tipo de categoria profissional, a do capturador de movimento, ou ator digital. “O trabalho parece abstrato”, afirma. “Mas envolve o corpo todo.” Serkis não acha estranho contracenar com o vazio de uma tela verde à espera que a equipe técnica a preencha com uma criatura. “De um jeito ou de outro, o ator está sempre fingindo”, diz.

Sua formação é convencional. Filho de uma assistente social inglesa e de um médico de origem armênia, mora em Londres, é casado e tem três filhos. Começou a fazer teatro em 1984, trabalhou no cinema e na televisão (interpretou Van Gogh e Einstein) e finalmente encontrou seu elemento como ator e consultor de CGI.

Está para estrear seu primeiro filme como diretor, o drama “Breathe”, recém-concluído. “Descobri o óbvio: sou aquele tipo de diretor que gosta de infernizar os atores com minúcias de interpretação.” Alguém tinha dúvida?Seu Caesar é uma figura complexa. Como explica, o símio atravessa o sofrimento, educa-se, atinge o ápice espiritual e pode inspirar outros seres. Se não o fizer em relação a todos os homens, pelo menos tem incentivado os colegas a seguir uma nova carreira. Mesmo assim, não acha que um dia possa a vir a ganhar um Oscar por “atuação virtual”. “Isso deverá acontecer com outro ator”, diz. “Mas acho que não verei este dia.”

Papéis em carne e pixels
A trajetória de Andy Serkis em grandes desempenhos