Três casamentos e um funeral deram o que falar no noticiário e nas redes sociais na semana passada. O que deveria ser a celebração do amor e da união entre duas pessoas virou motivo de piadas, indignação e repúdio na internet. E a separação de uma família baseada mais em conveniências políticas e econômicas tornou-se um enterro do bom-senso, um espetáculo público de rancores e arrependimento, colocando os mais jovens e os mais velhos em campos opostos. Nos quatro casos, os fatos dão o que pensar sobre a condição humana, a busca da felicidade e a utopia de uma sociedade mais livre e justa sob os aspectos da política, da economia e da cultura.

Nos EUA, um homem, Aaron Chervenak, casou-se com seu aparelho de celular em Las Vegas – aparentemente, um iPhone 6, da Apple. “Eu vos declaro marido e smartphone”, ouviu o noivo. Pobre sujeito. Tudo bem que o casamento na Little Vegas Chapel não tem valor legal nem religioso, mas o simples fato de alguém conceber a ideia de celebrar a união a uma máquina, por meio da qual se relaciona com centenas de outros humanos e outros computadores nas redes sociais, mostra a que ponto chegamos no uso da tecnologia em nossas vidas. Paradoxalmente, é a vitória da solidão.

Avessa a ficar sozinha, a cantora e dançarina Gretchen casou-se pela 17a vez, agora com o empresário português Carlos Marques. A festa foi bancada pela apresentadora Eliana e será vista na telinha do SBT para o deleite do distinto público que ainda se interessa pela vida de uma artista famosa no século passado por seu bumbum avantajado e pela interpretação inesquecível de Conga, Conga, Conga. É a vitória da fé no casamento e no marketing cultural de gosto duvidoso – sim, há quem goste, tanto entre os pobres e iletrados quanto entre os ricos e descolados.

Mas o casamento que deixou a todos os brasileiros de queixo caído foi outro, dos ilustres desconhecidos (até então) Felipe Amorim e Caroline Monteiro. Os pombinhos se uniram em alto estilo num clube de luxo na praia de Jurerê Internacional, no litoral de Santa Catarina. Seria apenas mais uma entre tantas cerimônias da abastada elite brasileira, não fosse o fato de que o regabofe teria sido pago por toda a população. Segundo a Polícia Federal, o casamento, com direito a show do cantor Leo Rodriguez, foi bancado por dinheiro público desviado da Lei Rouanet pelo pai do noivo, o empresário Antonio Carlos Bellini Amorim, do Grupo Bellini, especializado na viabilização de projetos financiados pelo Ministério da Cultura. Foi a vitória do cinismo, da desfaçatez de ladrões do dinheiro público que só acreditam no casamento espúrio de seus interesses com os dos corruptos instalados nas repartições do governo. Tudo ao som de Bara Bará Bere Berê, sucesso do cantor (sim, há quem goste), cujo cachê é de R$ 70 mil.

Felizmente, foi também a derrota da sensação de impunidade: a festança caiu no radar da Polícia Federal e Bellini foi preso pela Operação Boca Livre, que apura desvios de R$ 180 milhões da Cultura. Se o crime for realmente comprovado e ele, condenado, que isso sirva de exemplo e fortaleça o processo de moralização do País. Não se deve demonizar a Lei Rouanet e o incentivo à cultura por causa disso, mas deve-se punir os abusos com rigor e melhorar a fiscalização dos projetos beneficiados. Se bem conduzidos, a cultura e a lisura com o dinheiro público formam um belo par. Está em jogo a identidade cultural de um povo.

Entre tantos casamentos ilustres, um divórcio ruidoso – o dos britânicos com os europeus – coloca em xeque a união de 27 países. A saída da Grã-Bretanha da União Europeia foi decidida no voto pelos eleitores mais velhos, mas contra a vontade de milhões de jovens que podiam viajar, viver, trabalhar e casar-se sem enfrentar a burocracia da imigração em qualquer parte da União Europeia. É o funeral de um sonho bom para os britânicos, o fim do mundo sem fronteiras cantado por John Lennon em Imagine. Que pena.

Milton Gamez, jornalista, é diretor de Núcleo da Editora Três e coordena as revistas IstoÉ Dinheiro, Dinheiro Rural e MotorShow