O presidente Michel Temer prepara o lançamento de um programa de reforma agrária que vai interromper a distribuição de terras no País e esvaziar a atuação de movimentos sociais ligados ao PT na política fundiária. A proposta consiste em acelerar a emissão de títulos de domínio das propriedades e transferir às prefeituras a função de identificar assentados aptos a recebê-los.

A medida limita o poder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). A organização seleciona as famílias a serem beneficiadas com lotes em novos assentamentos e também aponta aquelas que serão contempladas com o título de domínio. De posse do documento, assentados podem ter acesso a recursos do Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf) ou vender a propriedade.

O programa deve ser lançado no dia 22 deste mês, em Mato Grosso, logo após o presidente voltar de viagem internacional pela Ásia. A meta de Temer é entregar 753.933 títulos até 2018. Segundo levantamento do atual governo, na gestão Fernando Henrique Cardoso foram expedidos 62.196 documentos entre 2000 e 2002. Em 13 anos de administrações petistas (Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff), foram 22.729 títulos entregues a assentados.

A estratégia do governo Temer é imprimir uma nova marca no programa de reforma agrária, diferentemente do que fez com o Bolsa Família, em que manteve o modelo criado pelo ex-presidente Lula.

Em meio ao ajuste fiscal, o Planalto, ao interromper a criação de novos assentamentos, justifica que a distribuição de terra realizada até agora precisa ser reorganizada e regularizada. Com isso, o governo pretende corrigir distorções apontadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que identificou até casos de servidores públicos beneficiados com lotes.

Reações

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O modelo, porém, já provoca reação contrária de movimentos sociais. Militantes alegam que a concessão dos títulos de domínio das propriedades pode provocar uma nova concentração de terras, o que enfraqueceria os assentamentos já existentes. A reforma agrária dos governos anteriores tinha como principal objetivo distribuir terras, não priorizando a concessão dos títulos.

Para Alexandre Conceição, da coordenação nacional do MST, o governo Temer segue uma pauta de privatização das terras. “Isso não é plano de reforma agrária, é plano de retrocesso à reforma agrária”, disse. Ele também afirmou não ver problema no método como o cadastro das famílias para a distribuição de terras foi realizado até hoje. “O problema é não querer fazer novas desapropriações.”

Patrus Ananias, ex-ministro do Desenvolvimento Agrário de Dilma, diz que Temer está fazendo uma “operação de desmonte”, para atingir políticas sociais implementadas pelo PT. Apesar do argumento do ex-ministro, Dilma foi duramente criticada pelos movimentos sociais por ter diminuído o ritmo da reforma agrária no País. No ano passado, dados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) mostraram que o ritmo de famílias assentadas pela ex-presidente foi o pior em 20 anos.

A pesquisadora Mirian Cláudia Simonetti destaca que o MST cumpre um papel importante dentro do Incra. “O MST organiza os assentamentos, as ocupações. Esse diálogo deve ser preservado”, disse a professora do Centro de Pesquisa de e Estudos Agrários e Ambientais da Unesp, em Marília (SP), ressaltando que há mais de 100 grupos de interesse em política agrária, não somente o MST, atuantes na defesa do direito à terra.

Mudança

O programa é a segunda mudança de impacto no setor agrário a ser promovida por Temer. Em maio, ele extinguiu o Ministério do Desenvolvimento Agrário e transferiu a administração de cinco setores responsáveis pelas políticas de reforma agrária do governo federal para a Casa Civil, comandada pelo ministro Eliseu Padilha.


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