A mandatária afastada Dilma Rousseff está mesmo prestes a virar um retrato na galeria de ex-presidentes. Se restava ainda algum vestígio de dúvida, na última semana, dois eventos contribuíram para solidificar essa constatação no meio político. Um deles foi a acachapante derrota amargada por Dilma Rousseff durante apreciação do relatório favorável ao seu afastamento definitivo na Comissão Especial do Impeachment do Senado. O outro foi ainda mais emblemático. Coube ao próprio PT o tiro de misericórdia. Em reunião da Executiva, o partido abandonou-a à própria sorte. Além de não deliberar sobre o impeachment, a legenda fez a mais contundente crítica até então à proposta a qual Dilma se agarrava para tentar prolongar sua agonia no cargo: a ideia do plebiscito, destinada a antecipar a eleição presidencial de 2018. Ou seja, se faltava um sinal mais nítido de que, para o PT, Dilma já é pagina virada, não falta mais. O divórcio está selado. O presidente do partido, Rui Falcão, fulminou a proposta, sem qualquer cerimônia: “Em primeiro lugar, a presidente tem que pedir autorização para realizar plebiscito. Em segundo, para antecipar eleição teria que saber se é cláusula pétrea da Constituição ou não. Caso não seja, precisa de emenda constitucional, que requer duas votações na Câmara e no Senado com aprovação de dois terços. Em terceiro, e último, caso a antecipação seja aprovada as novas eleições só se realizarão em 2018, na melhor das hipóteses. Não vejo viabilidade”, detonou Falcão. Na próxima semana, a proposta já rechaçada pelo PT será empacotada pelo que os dilmistas chamam de nova “Carta aos Brasileiros”, nos moldes da apresentada por Lula antes de chegar ao poder. Enquanto isso os ex-ministros Aloizio Mercadante e Jaques Wagner travam disputas comezinhas nos bastidores. Como quem vai influenciar mais no tom do documento ou se a palavra “golpe” será contemplada ou não no texto. Um fim mais melancólico impossível, não só para ela como para seu entorno.

"Não foram meras formalidades contábeis. Dilma cometeu um autêntico atentado à Constituição" - Relator da Comissão do Impeachment, Antonio Anastasia
“Não foram meras formalidades contábeis. Dilma cometeu um autêntico atentado à Constituição” – Relator da Comissão do Impeachment, Antonio Anastasia

No mesmo dia em que Falcão rifou publicamente a presidente afastada, a Comissão do Impeachment no Senado por 14 a 5 votos acatou o parecer do relator Antonio Anastasia (PSDB-MG) pela deposição de Dilma. Segundo o tucano, “a gravidade dos fatos constatados não deixa dúvidas quanto à existência não de meras formalidades contábeis, mas de um autêntico atentado à Constituição”. Na terça-feira 16, o documento será apreciado pela totalidade dos senadores, que decidirá se há ou não provas suficientes para apear a presidente do cargo. Caso os argumentos de Anastasia sejam endossados por maioria simples (metade dos presentes mais um), terá início então a última fase do processo: o aguardado julgamento de Dilma por crime de responsabilidade. Nesta etapa, quem preside os trabalhos é o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski. Ao que tudo indica, a ação será concluída no final de agosto, quando serão ouvidas pela última vez testemunhas convocadas para a defesa e para a acusação.

O QUE RESTOU PARA A PETISTA

Dos 21 integrantes do colegiado, apenas a tropa de choque de Dilma na Casa se manteve fiel. A ex-ministra da Casa Civil Gleisi Hoffmann (PT-PR), a ex-ministra da Agricultura Kátia Abreu (PMDB-TO), Lindbergh Farias (PT-RJ), Telmário Mota (PDT-RR) e Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) somaram os únicos cinco votos contrários ao relatório. Entre os políticos predomina a previsão de que o cenário arrasador para Dilma seja mantido no Plenário. Lá, aliados do presidente interino, Michel Temer, já estimam que pelo menos 60 dos 81 senadores decretarão o fim do governo Dilma. Para que a previsão dos peemedebistas se confirme, serão necessários no mínimo 54 votos.

Temer e aliados contabilizam pelo menos 60 votos pelo afastamento definitivo de Dilma
Temer e aliados contabilizam pelo menos 60 votos pelo afastamento definitivo de Dilma

De resto,  a maioria dos apoiadores da presidente afastada torce apenas para que o processo se estenda ao máximo, de forma que seja possível capitalizar ainda nas eleições de outubro a pretensa tese de “um golpe de Estado orquestrado pela direita”. As imagens da saída de Dilma, dizem alguns petistas, poderiam contribuir para a unificação da militância de esquerda em torno das candidaturas da sigla pelo País, hoje extremamente enfraquecidas.

O fato é que o País começa, mesmo que lentamente, a mover suas engrenagens e a despertar do estado vegetativo em que se encontrava com o agonizante comando de Dilma. O próprio PT já se sente muito mais à vontade na condição de oposição do que defendendo uma gestão petista desastrosa. O que restou a Dilma, nos últimos dias, foi uma série de entrevistas a jornais estrangeiros e veículos nacionais politicamente alinhados, em que ela tenta inutilmente se defender e, paralelamente, atacar seu sucessor. Ao jornal espanhol El Mundo, a petista afirmou que Temer seria um intruso na cerimônia de abertura das Olimpíadas do Rio de Janeiro. “Não somente o considero um traidor, mas também um usurpador. Conspirou para o golpe e se alinhou ao ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha num processo de impeachment conduzido de forma pouco ética comigo e com população”, apelou ela, na última terça-feira 3. Em entrevista a um blog bem aquinhoado com verba pública durante a gestão petista, na última semana, Dilma beirou a desfaçatez. Ela, que nunca teve a hombridade de reconhecer seus erros, cobrou que o Partido dos Trabalhadores fizesse uma autocrítica, como se tentasse se dissociar da legenda. Sem chance.

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