21/07/2017 - 18:00
Passada a empolgação com os Jogos Olímpicos Rio-2016, vários atletas brasileiros de ponta começaram a sentir na própria carne a dificuldade para manter o alto rendimento, que depende de muita dedicação, treino e assistência profissional. Sem patrocínio, até mesmo os medalhistas olímpicos precisam fazer malabarismos para arcar com as despesas de seus treinadores, as inscrições e as viagens para os campeonatos onde podem competir com a elite do esporte. Em muitos casos, a falta de dinheiro também vem acompanhada de outro problema: o terror das lesões.
Frequentes em quem busca superar marcas e conquistar recordes, elas cobram um preço alto dos esportistas. É aí que entra o CETE, Centro de Traumato-Ortopedia do Esporte, em São Paulo, criado para diminuir a desigualdade no atendimento médico especializado para atletas de esportes com menos reconhecimento.
Há 20 anos o CETE presta assistência ambulatorial, tratamento, reabilitação e realiza cirurgias de forma gratuita para atletas carentes lesionados. A lista dos beneficiados é de encher os olhos: já foram atendidos a saltadora Maurren Maggi, ouro em Pequim-2008; o bicampeão olímpico na vela, Robert Scheidt; a campeã mundial com a seleção brasileira de handebol, Sandra Oliveira, e o ginasta Arthur Zanetti, prata nos Rio em 2016, além de atletas de federações parceiras, como as de judô, rugby e MMA.
Cassino clandestino
Assim como os atletas que enfrentam dificuldades para se manter competitivos, o CETE também está abaixo do rendimento ideal. “Temos equipamentos de alta tecnologia e profissionais muito competentes, mas precisamos melhorar a estrutura do espaço para atender com mais qualidade e eficiência tanto atletas como o público em geral”, diz Moises Cohen, idealizador do CETE e chefe do departamento de ortopedia e traumatologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), à qual o espaço está vinculado desde sua origem — por sinal, bem curiosa.
O centro ocupa as instalações de um antigo clube e já serviu como sede de um cassino clandestino. Em uma das salas ainda está um cofre da época da jogatina. Abandonado, o edifício virou ponto de uso e venda de drogas até de ser desapropriado pela prefeitura e cedido à Unifesp. Hoje, mesmo com todo o empenho da equipe formada por voluntários — dos 120 funcionários apenas 11 recebem salário — o CETE não tem dinheiro para colocar em prática seu projeto de revitalização, estimado em R$ 8 milhões.
O dinheiro seria usado para melhorar as instalações e permitir a manutenção dos serviços médicos que hoje são fundamentais para aumentar o rendimento dos competidores e, principalmente, prevenir lesões. “Eles fazem um trabalho muito bom, principalmente de prevenção. Conseguem diagnosticar o que está faltando e mostram para o atleta o que é preciso ser feito.
Ajudam também a melhorar o desempenho”, disse à ISTOÉ o ginasta Arthur Zanetti, que realizou uma cirurgia no ombro com o Dr. Benno Ejnisman, um dos fundadores do CETE. Desde a criação já foram realizadas mais de 35 mil consultas médicas, 70 mil atendimentos de fisioterapia e 4 mil cirurgias no centro.
Tudo isso permite com que ele também desenvolva excelência na pesquisa acadêmica, principalmente sobre genética do esporte, além de ser referência para cursos e especializações. Em 2014, o CETE foi certificado como Centro Médico de Excelência FIFA. Boa parte de seu corpo clínico participou da Copa do Mundo do Brasil e dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos no Rio de Janeiro, auxiliando no atendimento dos competidores.
Felizmente, não são só os aspirantes a campeões que têm esse privilégio. Atletas de fim de semana também podem ser beneficiados. Qualquer lesão relacionada à prática esportiva é tratada gratuitamente no CETE, que alterna o atendimento de cada área específica de acordo com o dia da semana. As lesões de joelho, o ponto fraco da maioria dos amadores, são atendidas por especialistas na terça-feira. Sem dinheiro, o centro vai deixar muita gente dolorida — e, pior ainda: menos brasileiros subirão ao pódio olímpico.
De promessa a ouro
Mesmo depois de consagrada, Maurren seguiu recebendo os cuidados do Dr. Moises Cohen. “Quando eu saí da competição (Mundial de Berlim em 2009) chorando, foi ele quem fez a minha cirurgia do joelho. Me entreguei de olhos fechados”, relembra. Agora, como técnica de atletismo de uma equipe que leva o seu nome, ela também confia ao centro a saúde dos competidores.