Passada a empolgação com os Jogos Olímpicos Rio-2016, vários atletas brasileiros de ponta começaram a sentir na própria carne a dificuldade para manter o alto rendimento, que depende de muita dedicação, treino e assistência profissional. Sem patrocínio, até mesmo os medalhistas olímpicos precisam fazer malabarismos para arcar com as despesas de seus treinadores, as inscrições e as viagens para os campeonatos onde podem competir com a elite do esporte. Em muitos casos, a falta de dinheiro também vem acompanhada de outro problema: o terror das lesões.

Frequentes em quem busca superar marcas e conquistar recordes, elas cobram um preço alto dos esportistas. É aí que entra o CETE, Centro de Traumato-Ortopedia do Esporte, em São Paulo, criado para diminuir a desigualdade no atendimento médico especializado para atletas de esportes com menos reconhecimento.

Há 20 anos o CETE presta assistência ambulatorial, tratamento, reabilitação e realiza cirurgias de forma gratuita para atletas carentes lesionados. A lista dos beneficiados é de encher os olhos: já foram atendidos a saltadora Maurren Maggi, ouro em Pequim-2008; o bicampeão olímpico na vela, Robert Scheidt; a campeã mundial com a seleção brasileira de handebol, Sandra Oliveira, e o ginasta Arthur Zanetti, prata nos Rio em 2016, além de atletas de federações parceiras, como as de judô, rugby e MMA.

Cassino clandestino

Assim como os atletas que enfrentam dificuldades para se manter competitivos, o CETE também está abaixo do rendimento ideal. “Temos equipamentos de alta tecnologia e profissionais muito competentes, mas precisamos melhorar a estrutura do espaço para atender com mais qualidade e eficiência tanto atletas como o público em geral”, diz Moises Cohen, idealizador do CETE e chefe do departamento de ortopedia e traumatologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), à qual o espaço está vinculado desde sua origem — por sinal, bem curiosa.

O centro ocupa as instalações de um antigo clube e já serviu como sede de um cassino clandestino. Em uma das salas ainda está um cofre da época da jogatina. Abandonado, o edifício virou ponto de uso e venda de drogas até de ser desapropriado pela prefeitura e cedido à Unifesp. Hoje, mesmo com todo o empenho da equipe formada por voluntários — dos 120 funcionários apenas 11 recebem salário — o CETE não tem dinheiro para colocar em prática seu projeto de revitalização, estimado em R$ 8 milhões.

“Precisamos melhorar a estrutura para atender com qualidade tanto atletas quanto o público em geral”  Dr. Moises Cohen, criador do CETE (Crédito:Divulgação)
Divulgação

O dinheiro seria usado para melhorar as instalações e permitir a manutenção dos serviços médicos que hoje são fundamentais para aumentar o rendimento dos competidores e, principalmente, prevenir lesões. “Eles fazem um trabalho muito bom, principalmente de prevenção. Conseguem diagnosticar o que está faltando e mostram para o atleta o que é preciso ser feito.

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Ajudam também a melhorar o desempenho”, disse à ISTOÉ o ginasta Arthur Zanetti, que realizou uma cirurgia no ombro com o Dr. Benno Ejnisman, um dos fundadores do CETE. Desde a criação já foram realizadas mais de 35 mil consultas médicas, 70 mil atendimentos de fisioterapia e 4 mil cirurgias no centro.

Tudo isso permite com que ele também desenvolva excelência na pesquisa acadêmica, principalmente sobre genética do esporte, além de ser referência para cursos e especializações. Em 2014, o CETE foi certificado como Centro Médico de Excelência FIFA. Boa parte de seu corpo clínico participou da Copa do Mundo do Brasil e dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos no Rio de Janeiro, auxiliando no atendimento dos competidores.

Felizmente, não são só os aspirantes a campeões que têm esse privilégio. Atletas de fim de semana também podem ser beneficiados. Qualquer lesão relacionada à prática esportiva é tratada gratuitamente no CETE, que alterna o atendimento de cada área específica de acordo com o dia da semana. As lesões de joelho, o ponto fraco da maioria dos amadores, são atendidas por especialistas na terça-feira. Sem dinheiro, o centro vai deixar muita gente dolorida — e, pior ainda: menos brasileiros subirão ao pódio olímpico.

De promessa a ouro

Wander Roberto / COB
Maurren Maggi (foto) deixou de competir como atleta em 2015, mas ainda é referência como o maior nome da história do atletismo feminino do Brasil. Dona da medalha de ouro no salto em distância dos Jogos Olímpicos de Pequim, em 2008, foi umas das primeiras pacientes do consultório do CETE, lá no final dos anos 1990, quando ainda era uma promessa no esporte. “Eu, profissionalmente, e o CETE crescemos juntos”, diz a atleta.

Mesmo depois de consagrada, Maurren seguiu recebendo os cuidados do Dr. Moises Cohen. “Quando eu saí da competição (Mundial de Berlim em 2009) chorando, foi ele quem fez a minha cirurgia do joelho. Me entreguei de olhos fechados”, relembra. Agora, como técnica de atletismo de uma equipe que leva o seu nome, ela também confia ao centro a saúde dos competidores.

 


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