Quando o telefone tocou, o senador Laércio estava recostado em sua cadeira, no apartamento de sua mãe, olhando o pôr do sol no Leblon e pensando em como pôde se encrencar dessa maneira.
– Senador Laércio? O senhor me ligou? É o Aluísio – disse a voz do outro lado da linha.
– Ô, Aluísio, que saudade, meu irmão… – Laércio forçou intimidade para lubrificar o pedido que viria adiante.
– Puxa, senador, tenho acompanhado aqui as notícias. Que coisa, hein? Sinto muito, viu?
– Ah, Aluísio. Lamentável. Intriga dessa gente. Mas política é isso mesmo…
– Nem me diga, senador. Mas, bora lá, como é que eu posso ajudá-lo?
– Então, Aluísio…, eu sei que você é um empresário ocupado, não quero tomar seu tempo. O problema é o seguinte: essas acusações que eu recebi, você sabe…, umas delações premiadas dizendo que eu teria recebido propina, você veja que absurdo…
– Blasfêmia! Foi o que eu gritei quando eu vi na capa de todos os jornais. O senhor está precisando de alguma ajuda?
– Não, não! Pra isso o Otávio lá da siderúrgica já me deu uma força enorme com os honorários dos advogados e está tudo encaminhado.
– Opa! Que boa notícia, senador! Então, como posso ajudá-lo?
– Então, Aluísio…, é que, infelizmente, o Otávio foi preso, você viu, não?
– Vi sim senhor. Uma fatalidade. Uma injustiça, senador. Um homem que só lutou pelo Brasil.
– Injustiça enorme! Por isso eu entendo que, para se livrar, ele foi obrigado a admitir que me deu esse dinheiro para os advogados.
– Eita! Sério?
– Sério. E agora você veja, eu, com uma carreira ilibada, me vejo com essas duas acusações de propina.
– Um pecado, senador! Por isso o senhor me ligou?
– Na verdade não, Aluísio. Nessa segunda acusação, o Plínio do BND já me deu uma força comprando aquele apartamento de Paris de minha mãe, assim tenho aí um dinheirinho para me defender nos dois processos, porque, você sabe, política no Brasil não sustenta ninguém.
– E o senhor sempre foi um abnegado, senador! Um celibatário. Um casto.
– Então, Aluísio, pois você veja que – não saiu ainda na mídia – o Plínio foi levado aí numa condução coercitiva desses juízes.
– Mesmo? Que safadeza!
– É. Aí começaram a questionar o fato de o valor do apartamento estar maior que o preço de mercado e pronto! O Plinião teve de contar que me ajudou.
– Ô, senador…, não sabia não. Sinto muito!
– Não sinta, Aluísio. Não sinta. Quem tem que sentir muito mesmo é o Guido que me ajudou com os advogados desse terceiro processo com um dinheiro que – olha, quem diria? – tirou aí de um Caixa 2 do partido.
– Caixa 2??? Tem isso, é?
– Para você ver. Quarto processo de propina, ou seja, vou precisar de mais advogados.
– Entendi! Por isso o senhor me ligou.
– Na verdade não, Aluísio. Para esse quarto processo quem contratou os advogados foi o Josney, lá da Josney Corporation.
– Ah…, esse tem muito!
– Tem muito problema, isso sim, Aluísio. Caiu na malha do Moro.
– Vixi, senador. Mais um?
– E teve que explicar porque me deu esse trocado aí. Justo eu, que fiz o melhor para o Brasil e sempre desprezei essa corja de corruptos, Aluísio!
– Opa. Assino embaixo, senador!
– Você acredita que o Josney me gravou pedindo o dinheiro?
– Oxe, senador. Não dá mais para confiar em ninguém hoje…, o Josney é?
– Em carne e osso. Me jogou para os leões. Quinto processo.
– Então é para esse processo que o senhor precisa de ajuda?
– Que nada, Aluísio. Esse eu dei um jeito lá com aquele meu amigo boliviano.
– O do helicóptero?!
– Esse. Mas aí pegaram ele, você veja que absurdo, com 120 quilos de cocaína!
– Ave Maria. Cocaína é? De onde a gente menos espera, né?
– É…, aí já viu né. Me entregou. Mal agradecido. Justo eu que apresentei aquele projeto de lei para legalizar a maconha.
– Aí o senhor precisa de minha ajuda para esse caso?
– Na verdade não, porque para esse caso eu já conversei com aquele meu amigo…, sabe aquele sírio?
– Sei! O das armas?
– Isso. Só que a CIA pegou o cara. Baita injustiça. Aí falou da ajuda que me deu e…