As desavenças sobre o processo de paz na Colômbia entre o presidente, Juan Manuel Santos, e seu antecessor, Alvaro Uribe, permaneceram intactas nesta sexta-feira, mesmo depois da mediação do papa Francisco, em um dia que poderia ter sido histórico para o país sul-americano.

O papa Francisco recebeu no Vaticano os dois presidentes que se encontram em lados totalmente opostos quanto ao recente acordo de paz com a guerrilha das Farc para colocar fim a 50 anos de conflito.

O ex-presidente Uribe reiterou ante o papa suas críticas ao acordo de paz com a guerrilha das Farc.

Uribe insistiu em pedir mais reformas ao pacto, cujas normas aprovadas pelo Congresso não podem ser modificadas pelos legisladores.

“Não podem nos impor tudo isso, sua santidade”, lamentou Uribe.

Coincidindo com a visita prevista de Santos à Santa Sé, no âmbito de uma viagem pela Europa, o sumo pontífice convocou inesperadamente Uribe para uma reunião conjunta, em uma aparente tentativa de aproximar suas posições.

Um papa pela paz

O pontífice, que sempre apoiou o processo de paz colombiano, recebeu cada um em separado, depois os dois juntos e terminou por convidar os dirigentes ao diálogo, segundo um comunicado do Vaticano.

“O papa falou da ‘cultura do encontro’ e assinalou a importância de um diálogo sincero entre todos os atores da sociedade colombiana neste momento histórico”, destacou a nota.

O presidente Santos, por sua vez, agradeceu ao pontífice por “todos os esforços e gestos que teve para apoiar o processo de paz”, durante o encontro privado celebrado na biblioteca do Palácio Apostólico.

“O papa me reiterou também seu apoio ao novo acordo de paz e sua pronta implementação”, declarou Santos à imprensa, depois de um almoço com o presidente italiano, Sergio Mattarella.

“Aprendemos estuando os outros processos no mundo que é fundamental acordar os tempos entre o momento em que se assinam os acordos e o momento em que começam a ser implementados”, explicou.

Segundo as Nações Unidas, a aplicação dos acordos caminha a passos lentos e isto pode gerar um perigoso “vácuo de poder”, advertiu nesta sexta-feira o Alto Comissariado de Direitos Humanos.

O novo Prêmio Nobel da Paz, que se reuniu com o papa pela terceira vez, presenteou o Papa com a caneta – feita com uma bala – que em 24 de novembro serviu para assinar com o líder das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), Rodrigo Londoño (Timochenko), o renegociado acordo de paz, depois que uma primeira versão foi rejeitada em referendo popular.

Implementar o acordo ao invés de reformá-lo

Santos também agradeceu ao papa pelo gesto da reunião com Uribe.

“Disse ao ex-presidente Uribe que estamos sempre dispostos, como manifestamos em ocasiões anteriores, a continuar dialogando (…), que podemos entrar em acordo sobre coisas importantes para o país”, declarou Santos em encontro com a imprensa.

Uribe, que atualmente é senador, continua opondo-se ao acordo referendado há duas semanas pelo Congresso colombiano, apesar de o texto ter sido renegociado com a guerrilha para incluir propostas da oposição.

Santos e Uribe têm protagonizado um forte enfrentamento nos últimos tempos, que os levou a passar mais de cinco anos sem se encontrar frente a frente até 5 de outubro passado, quando se reuniram para falar da paz na Colômbia após o plebiscito.

A Colômbia vive um conflito armado do qual também participaram outras guerrilhas, paramilitares e agentes do Estado, que deixou 260 mil mortos, 60 mil desaparecidos e 6,9 milhões de deslocados ao longo de mais de meio século.

Encontro com o chefe de governo italiano

O penúltimo dia da visita europeia de Santos terminou com um encontro com o novo chefe de governo italiano, Paolo Gentiloni.

“A experiência do governo Santos é importante: um reformismo com coragem, em sintonia com a Itália”, afirmou Gentiloni em seu primeiro encontro oficial como chefe de governo no Palácio Chigi.

A Itália confirmou seu aporte para a retirada de minas na Colômbia e contribui para o fundo fiduciário de 95 milhões de euros, criado pela União Europeia para o pós-conflito no país sul-americano.

“Esperamos, dentro de cinco anos, depois de um grande esforço, ter nosso solo completamente livre de minas”, prometeu Santos.

No sábado, Santos receberá em Assis (centro da Itália), a cidade de São Francisco, o prêmio “A Lâmpada da Paz”, concedida pela comunidade franciscana, conhecido como o “Nobel dos católicos”, e em seguida retornará para a Colômbia.