Em um pequeno parque em frente à casa do falecido vencedor do Prêmio Nobel da Paz Liu Xiaobo, em Pequim, sentados à mesa de pedra, policias verificam cada pessoa que se aproxima do local que vigiam.

Mais de uma semana após a morte do dissidente chinês, sob custódia, por consequência de um câncer no fígado, quatro agentes observam o acesso ao apartamento onde sua viúva, a poetisa Liu Xia, está em prisão domiciliar desde 2010.

Sua presença contradiz as declarações dos oficias na semana passada, segundo as quais Liu Xia, de 56 anos, estaria livre.

A escritora apareceu em um vídeo divulgado pelas autoridades em 15 de julho jogando as cinzas de seu marido no mar, mas vários amigos seus não conseguiram falar com ela desde então e acreditam que esteja sob custódia policial na província de Yunnan.

Entretanto, os agentes, alguns uniformizados e outros à paisana, vigiam com empenho o apartamento, embora ele possa estar vazio.

“Para onde vão?”, pergunta um policial a duas mulheres de meia-idade que se aproximam. “Moramos aqui”, responde uma delas, como se estivesse acostumada a este questionamento.

Do outro lado da cerca, um oficial uniformizado está sentado em uma cadeira em frente à porta do apartamento de Liu Xia. Outros três aguardam sentados na escuridão da entrada. Um deles com um pote de macarrão. Todos se levantam ao ver chegar um repórter da AFP.

“O que você está fazendo aqui? Não mora nessa vizinhança”, diz um policial uniformizado, indicando a saída ao repórter.

Diante da cerca, alguns agentes falam enquanto esperam a hora do almoço. “Ontem [quinta-feira] vieram cinco ou seis jornalistas”, conta um homem de meia-idade com uma camisa preta, vestimenta favorita dos policiais à paisana.

“Esses estrangeiros só vêm aqui criar problemas. Querem tirar fotos de tudo. A hora do almoço é a favorita, mas fica calmo depois das sete da noite”, explica.

Algumas horas antes, uma equipe de televisão formada por quatro pessoas chegou por uma das entradas principais do complexo, e vários policiais a rodeou rapidamente.

“Vocês sabem quem é Liu Xia?”, pergunta um dos jornalistas a um policial, que responde irritado: “nunca vi ninguém tão grosseiro como você!”.

Mais ou menos ao mesmo tempo, um agente prendeu um fotógrafo da AFP depois de ter pedido para apagar três fotos que havia tirado da parte de fora do apartamento. Ele se negou a fazer, mas foi liberado pouco depois.

– Um desconhecido –

Em uma avenida perto do apartamento de Liu, corredores, ciclistas e homens com aspecto de pescadores parecem alheios à agitação por conta da casa.

O governo chinês apagou todas as menções a Liu Xiaobo, um dos líderes da manifestação de Tian’anmen em 1989, da Internet e dos meios de comunicação locais.

Liu foi condenado a 11 anos de prisão em 2009 por subversão depois de coescrever a Carta 08, um documento em que pedia reformas democráticas no país comunista.

No ano seguinte, se tornou o primeiro chinês a vencer um Prêmio Nobel da Paz, mas não pode comparecer à cerimônia em Oslo.

“Não sei quem são [Liu Xia e Liu Xiaobo]”, declara uma mulher que mora no mesmo prédio. “Muitos funcionários do governo vivem nessas casas. Os guardas estão aqui para a sua segurança”, assinala.

Um idoso que recolhe o lixo acredita que essas medidas de segurança se devem à proximidade da principal avenida de Pequim. “E acho que [o presidente chinês] Xi Jinping esteve aqui”, diz hesitante.