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> Liniker e os Caramelows

Origem: Araraquara (SP)
Álbuns: “Cru” (EP, 2015) e “Remonta” (2016)
Estilo: soul
Trecho de música: Zero
“A gente fica mordido, não fica? Dente, lábio, teu jeito de olhar Me lembro do beijo em teu pescoço Do meu toque grosso, com medo de te transpassar”

Argolas nas orelhas, batom roxo cintilante, pulseiras e saia. O visual montado para causar é de Liniker Barros. Quando ela (como prefere) canta, o efeito é hipnótico. A voz peculiar transita entre tons agudos, com falsetes precisos, e notas graves de uma rouquidão sexy. O suingue não deixa barato para nenhum cantor americano de soul. Liniker — nome de batismo, escolhido por um tio em homenagem a um jogador de futebol da Inglaterra — é a figura que melhor representa a nova geração de cantores e compositores brasileiros que escancara um lado transgressor da música popular, algo que andava meio esquecido. São artistas que vestem as cores da liberdade para tratar de questões prementes no Brasil de hoje, colocando o dedo nas feridas do preconceito: de gênero, de raça, de ideologia, de renda. Gente que se orgulha de sua condição. “Meu corpo é um corpo político”, já disse Liniker, 21 anos. “A questão do gênero não é somente o vestir-se. É numa dimensão de desconstruir a ideia de que a gente precisa viver num padrão e seguir uma estética normativa”, acredita. Em menos de um ano desde o lançamento, seu primeiro disco, “Cru”, se tornou uma febre. Liniker já rompeu a barreira de 10 milhões de visualizações no YouTube. Seus shows, ainda restritos ao circuito independente, não só lotam como deixam os fãs em êxtase. Recém-lançado, o álbum “Remonta” virou objeto de desejo. O sucesso rápido tem a ver com a qualidade do som que ele faz, mas também reflete a curiosidade de um público que se mostra aberto ao novo e sequioso de referências comportamentais que espelhem o momento atual. A atitude livre e ousada de Liniker, ao invés de intimidar, convida. E a surpresa se confirma no som sofisticado que faz com os Caramelows.

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> Karol Conka (Karoline dos Santos de Oliveira)

Origem: Curitiba (PR)
Álbuns: “Batuk Freak” (2013) e “Ambulante” (lançamento em novembro)
Estilo: pop, hip hop
Trecho de música: Marias
“Escrevendo histórias vivendo cada segundo Nomes do passado que ainda percorrem o mundo, orgulhando envergonhando. Muitas se sentem sobrando Sem estímulos na vida algumas seguem se enganando Sempre existirá aquelas que fazem a diferença…”

Como Liniker, há muita gente jovem na cena musical brasileira que desistiu de se apegar aos padrões estéticos e sonoros das décadas passadas para inaugurar os próprios. Uma geração que não pretende soar como Caetano Veloso (o que para eles jamais seria um problema), mas busca afirmar atitudes e protestos por meio da performance e das causas que abraça. Justamente como fez, no final da década de 1960, o autor de “É Proibido Proibir”, e vinte anos depois com “Eu Sou Neguinha?”.

Embora tenham voz própria e personalidades marcantes, às vezes é reconhecível a inspiração em figuras consagradas da música brasileira. O pernambucano Johnny Hooker, 29, não escapou de ser comparado a Ney Matogrosso, até hoje um ícone no que diz respeito à estética no palco. Mas fica claro, ao ouvi-lo, que a semelhança está apenas no lay-out.

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> Jaloo (Jaime Melo)

Origem: Castanhal (PA)
Álbuns: “Female & Brega” (EP, 2012), “Couve” (EP, 2013) “Insight” (EP, 2014) e #1 (2015) Estilo: sci-fi-brega
Trecho de música: A Cidade
“Todo mundo quer um Deus Pra ser seu Em verdade e valores Querem revolução E sem pisar no chão Postam seus rancores”

Assumidamente gay, Johnny já compôs trilhas sonoras de filmes (“Tatuagem”) e novelas (“Babilônia” e “Ger4ção Brasil”, na qual também atuou). Chegou ao primeiro lugar na plataforma de streaming Deezer e no iTunes Brasil. No ano passado, foi eleito o Melhor Cantor no 26o Prêmio da Música Brasileira pelo disco “Eu vou fazer uma macumba pra te amarrar, maldito!” — sob aplausos e elogios de Maria Bethânia e Alcione.

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> Rico Dalasam

Origem: São Paulo (SP)
Álbuns: Modo Diverso (EP, 2015) e Orgunga (2016)
Estilo: queer rap
Trecho de música: Aceite-C
“Minha saga é de quem Pegou dois busão e trem Faculdade, trampo porque a grana convêm Mistura o Brasil ser o ianque barém Quem vem da lama aqui não tem medo de rem”

RAP GAY

Quando era mais novo, em Castanhal, no Pará, o cantor Jaloo, hoje com 28 anos, tinha mania de fazer “cover” de outros artistas, mas acabou criando o seu próprio estilo — que ele batizou de sci-fi-brega — , misturando música eletrônica, tecnobrega e ritmos latinos à sua voz tímida, construída mais na base do trabalho que da vocação natural. Para coroar tanta autenticidade, Jaloo transita entre o masculino e o feminino com bastante destreza. Isso se deve não apenas ao estilo, mas aos traços bastante neutros. Tamanho foi o estranhamento com sua aparência feminina, que Jaloo optou por abraçar a causa e convocar apenas mulheres para integrar sua banda.

Até em um dos redutos mais machistas da música, o rap, brotam talentos revolucionários como Rico Dalasam e Karol Conka. Ele sofreu na infância por ser negro, pobre e gay. Ela, por ser mulher, antes de tudo. Ambos escolheram um gênero musical bastante restrito para se afirmar, e deu mais que certo: Dalasam, 25 anos, hoje é respeitado nas quebradas e se mantém como o único representante do movimento “queer rap” (ou rap gay) no Brasil, depois do sucesso de “Aceite-C”, música que não abre mão da alegria e da irreverência para falar sobre as maravilhas que coroam a própria aceitação.

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> Johnny Hooker (John Donovan)

Origem: Recife (PE)
Álbuns: “The Blink of The Whore´s Pussy” (EP, 2004), “Ultra Violenc Discotheque (EP, 2007), “Fire!” (EP, 2008), “Roquestar (EP, 2011, como Johnny & The Hookers), Eu Vou Fazer uma Macumba pra Te Amarrar, Maldito! (2015)
Estilo: pop e rock brega
Trecho de música: Boato
“Dizem que fugi até pra nunca mais Mas voltei sorridente, cantei até demais Dizem por aí que ando com álcool a me envenenar Mas é que existem coisas aqui em mim que preciso matar”

“Chapa Quente”

Karol, 29 anos, vai na mesma linha: se afirmou como ícone feminista com letras que retratam uma mulher livre para ser o quiser, em casa, na balada, ou na rua, sem medo de ser julgada. Ao lado da pequena MC Sofia, exaltou o poder feminino na abertura dos Jogos Olímpicos do Rio e viu sua música “Tombei” virar tema de abertura do seriado “Chapa Quente”, da TV Globo. No calor das discussões sobre igualdade racial e de gênero, muito inflamadas com a ajuda da internet e da invasão de privacidade, não seria surpreendente que de norte a sul do País a música manifestasse, aqui e ali, um posicionamento liberal e transgressor. Definitivamente, unir qualidade musical às novas bandeiras que estão surgindo torna tudo bem mais interessante.