06/06/2017 - 17:47
Executivos da empreiteira Odebrecht prestaram novos depoimentos, após seus acordos de delação premiada, a investigadores da Operação Janus no mês de maio e abril, o que pode ampliar o foco sobre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu “sobrinho” Taiguara Rodrigues Santos. Segundo ISTOÉ apurou, o patriarca da família, Emílio Odebrecht, foi confrontado com emails de seus subordinados e mudou versão que ele próprio fizera à Procuradoria Geral da República: agora, ele diz que Taiguara fez serviços ruins e imprestáveis para a empresa – o que, para o Ministério Público, significa que serviram apenas para mascarar propinas para Lula. O tio, o sobrinho e os funcionários da empreiteira, incluindo Marcelo Odebrecht, já respondem a ação penal na 10ª Vara Federal de Curitiba.
Emílio disse que, em uma das palestras bancadas pela empresa para Lula falar em Angola, ele apresentou Taiguara a um subordinado da empresa como fornecedor da empreiteira. Em 2011 e 2015, o ex-presidente fez duas palestras no país africano onde a construtora tem negócios bilionários financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A Odebrecht repassou R$ 20 milhões à empresa de Taiguara, a Exergia. Segundo o Ministério Público, essa foi a forma de a empresa pagar corrupção ao ex-presidente.
Na segunda palestra, em 2014, também bancada pela Odebrecht, há fotos e vídeos de Lula e Emílio. O computador de Taiguara apreendido pela Polícia Federal mostra ainda fotos do petista e do sobrinho no país africano. Todos já foram denunciados criminalmente na 10ª Vara Federal de Brasília na Operação Janus, uma das mais documentadas acusações contra o petista feita ainda no ano passado. Mas advogados das defesas pediram ao juiz Vallisney Oliveira para que as delações da Odebrecht fossem acrescentadas ao caso.
Semanas depois do pedido dos advogados – coincidência ou não – novos depoimentos foram prestados por executivos da empreiteira em abril e maio em Brasília, incluindo Emílio e Alexandrino Alencar. Eles indicam que o sobrinho de Lula fez um trabalho ruim e mal feito, apurou ISTOÉ após ouvir seis fontes ligadas ao caso. Num caso específico, sequer serviço prestou, de acordo com as fontes ouvidas. Eles afirmaram ainda a autoridades foi Lula quem pediu para contratar Taiguara e que, se ele não fosse parente do petista, jamais conseguiria o trabalho, para o qual recebeu os US$ 20 milhões por meio da empresa Exergia.
Hidrelétrica
Os novos depoimentos dos delatores são importantes por três motivos. Primeiro, fecham o cerco sobre Lula e Taiguara em mais uma ação penal que ele responde, esclarecendo ainda mais detalhes sobre um negócio no exterior. A Odebrecht fazia obras na usina hidrelétrica de Laúca, em Angola, empreendimento que contou com empréstimo de R$ 2 bilhões do BNDES. As duas palestras de Lula, custaram US$ 100 mil e US$ 479 mil, respectivamente. Para o Ministério Público, o petista fazia lobby no banco e no país estrangeiro em favor da empreiteira, o que é negado por Lula.
Segundo, porque mostram como Emílio Odebrecht mudou seu depoimento prestado em delação premiada à Procuradoria Geral da República na Operação Lava Jato. Primeiro, ele disse aos investigadores que, possivelmente, o serviço de Taiguara tinha sido útil. “A oportunidade pode e deve ser dada, mas ele só continuará (…) se efetivamente tiver condições de fazer com qualidade e competitividade”, declarou o patriarca à PGR. Ao depor novamente para investigadores da Operação Janus, Emílio foi confrontado com emails da empresa em que há reclamações da qualidade do serviço do sobrinho – contratado entre 2011 e 2015 para consultorias, projetos sondagens, perfurações e serviços de topografia. Aí, mudou a versão “suave” do que dissera antes.
Em terceiro lugar, a importância dos depoimentos é que eles reconfiguram o quadro de denunciados na ação penal e garantem a punição baixa para membros grupo Odebrecht, acusados de corrupção ativa, efeito colateral negativo do acordo de delação premiada fechado com a Lava Jato. Pelos novos depoimentos, ficou maior a participação de Emílio e Alexandrino no esquema e praticamente descartada a atuação de Marcelo Odebrecht, preso em Curitiba. Além disso, muitos dos diretores da empresa denunciados pela Procuradoria sequer fizeram parte dos 77 funcionários e acionistas arrolados para confessar crimes na delação para auxiliar nas investigações. “Espero a exclusão de meu cliente agora”, diz um advogado que prefere o anonimato. “Se não está na lista [de delatores], é porque se sabe inocente”, afirma Antônio Pitombo, advogado de outro ex-funcionário da empreiteira na ação penal.
Sem explicação
ISTOÉ questionou a defesa de Lula se houve reunião com Taiguara e Emílio em 2011 ou 2014 e qual o tema da conversa, mas não obteve esclarecimentos. O petista disse ao Ministério Público e à PF que “nunca fez lobby” em favor da Odebrecht no BNDES. Afirmou ainda que “nunca apresentou Taiguara” a empresários e que “não chegou a tratar” com ele sobre “relações comerciais”. O Ministério Público Federal não quis comentar o assunto, mas disse apenas que executivos da construtora estão sendo ouvidos e que estuda reavaliar a denúncia criminal já apresentada.
A Odebrecht não comentou o tema. Sua assessoria disse apenas que a empresa colabora com as apurações e que “entende que é de responsabilidade da Justiça a avaliação de relatos específicos feitos pelos seus executivos e ex-executivos”. A construtora destacou que “já reconheceu os seus erros, pediu desculpas públicas, assinou um acordo de leniência com as autoridades brasileiras, da Suíça, República Dominicana e com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, e está comprometida a combater e não tolerar a corrupção em quaisquer de suas formas”. Advogados dos demais denunciados não foram localizados ou preferiram não comentar caso.
Os denunciados
Os acusados na Operação Janus têm negados as imputações criminais
– Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente da República. Acusações: organização criminosa, lavagem de dinheiro, tráfico de influência, corrupção passiva.
– Marcelo Bahia Odebrecht, presidente afastado do grupo Odebrecht. Preso em Curitiba. Acusações: organização criminosa, lavagem de dinheiro, corrupção ativa.
– Taiguara Rodrigues dos Santos, dono da Exergia Brasil e “sobrinho” de Lula. Acusação: organização criminosa, lavagem de dinheiro.
– José Emmanuel Camano, sócio de Taiguara na Exergia Brasil. Acusações: organização criminosa, lavagem de dinheiro
– José Mário de Madureira Correia, português representante da Exergia Portugal. Acusação: lavagem
– Diretores de contrato da Odebrecht Pedro Henrique Schettino, Maurizio Ponde Bastianelli, Javier Chuman Rojas, Marcus Fábio Souza Azeredo, Eduardo de Athayde Badin e Gustavo Teixeira Belitardo. Acusação: lavagem