No livro “O Verde Violentou o Muro”, um clássico da literatura nacional, o escritor paulista Ignácio de Loyola Brandão faz um relato contundente das duas Alemanhas divididas pelo Muro de Berlim – paredão este que, afinal, acabaria sendo superado pela febre de liberdade que varreria o continente. Na São Paulo do prefeito João Doria (PSDB), o verde também começa a vencer o cinza – e, a exemplo do que aconteceu na então capital alemã, a mudança poderá trazer incontáveis benefícios. Há alguns dias, Doria inaugurou o primeiro trecho do que ele espera ser “o maior corredor verde do mundo.” A novidade fica na Avenida 23 de Maio, uma das mais movimentados de São Paulo, e consiste em jardins verticais formados por pelo menos 30 espécies diferentes, como alecrim, manjericão e brilhantina. Esta é apenas uma entre muitas outras iniciativas que buscam ampliar a cobertura vegetal de umas das metrópoles menos ecológicas do mundo. “A ideia é humanizar a cidade”, disse Doria à ISTOÉ.

CORREDOR VERDE O projeto tem capacidade para absorver a mesma quantidade de dióxido de carbono do que 3.300 árvores
CORREDOR VERDE O projeto tem capacidade para absorver a mesma quantidade de dióxido de carbono do que 3.300 árvores (Crédito:Felipe Gabriel)

Se fosse preciso apontar uma cidade que faz jus à expressão “Selva de Pedra”, este lugar seria São Paulo. A megalópole tem ínfimos 2,6 metros quadrados de área verde para cada um de seus 11 milhões de habitantes. É, de fato, uma ninharia. Para efeito de comparação, trata-se de um décimo do índice de Nova York e um quinto do recomendado pela Organização Mundial de Saúde. Mais grave ainda: na capital paulista, o verde está distribuído de forma desigual. Nos bairros com moradores de alta renda, há mais árvores que pessoas. Na periferia, a relação é uma árvore para cada 17 habitantes. Não é preciso muito esforço, portanto, para entender a urgência de uma medida como a anunciada por Doria. O prefeito quer fazer da temática verde uma das bandeiras de sua gestão. Não à toa, ele aumentou em um terço o orçamento da secretaria do Verde e Meio Ambiente. Seu antecessor, o petista Fernando Haddad, reduziu as despesas dessa área de 1,4% do orçamento municipal para 0,3%.

Projeções da prefeitura mostram que o novo corredor ecológico tem potencial para absorver a mesma quantidade de dióxido de carbono do que 3.330 árvores. Mas esse não é o único benefício. “Ele embeleza a cidade e estimula as pessoas a terem uma convivência fraterna com o verde”, diz o prefeito. Outros programas também estão sendo adotados em São Paulo. Um deles é o Cidade Verde, que tem por objetivo plantar um milhão de árvores na cidade durante os quatro anos de gestão. Apenas em 2017 a meta é semear 150 mil mudas. Detalhe: bairros distantes das regiões nobres serão priorizados. De acordo com Doria, a

PARQUE ALFREDO VOLPI Convênio com o Hospital São Luiz fará a prefeitura economizar R$ 1,2 milhão por ano
PARQUE ALFREDO VOLPI Convênio com o Hospital São Luiz fará a Prefeitura economizar R$ 1,2 milhão por ano (Crédito:André Lessa)

medida pretende melhorar a distribuição de áreas verdes na cidade. “A prioridade de plantio é nos bairros da periferia”, afirma.

Parques maltratados

Por mais que muitos gestores considerem a pasta ambiental irrelevante, ela é vital por diversas razões. Cidades verdes são saudáveis e ajudam a preservar a vida de seus moradores, muito embora os indicadores de São Paulo estejam a anos-luz de proteger os pulmões dos paulistanos. Os parques têm inúmeros atributos: são também áreas de lazer frequentadas por pessoas que não dispõem de outras fontes de diversão. Diante da escassez de recursos, Doria pensou numa saída criativa para melhorar a qualidade das áreas verdes da cidade. A ideia é que empresas privadas administrem os 107 parques do município, que em troca poderão exibir suas marcas corporativas. “Nós recebemos os parques maltratados”, diz Gilberto Natalini, secretário municipal do Verde e Meio Ambiente. “É uma luta sobre-humana recuperar.” O Parque Alfredo Volpi, que tem uma boa cobertura de Mata Atlântica preservada, foi o primeiro a ser adotado. O local que estava degradado e tinha virado alvo dos ladrões foi conveniado à Rede D’Or São Luiz, administradora do Hospital São Luiz. Com o convênio, que tem duração de um ano e vai custar R$ 1,2 milhão para a Rede D’Or, o hospital será responsável pelo manejo, manutenção e a segurança do parque. O curioso é que Doria chegou a ser criticado por rivais ao apagar grafites e pichações da cidade com tinta cinza. Agora, muitos destes muros serão cobertos por verde – disso, ninguém pode reclamar.

JARDINS VERTICAIS Prédios verdes embelezam a cidade e podem ajudar a melhorar o ar da cidade
JARDINS VERTICAIS Prédios verdes embelezam a cidade e podem ajudar a melhorar o ar da cidade (Crédito:Bruno Santos/Folhapress)

Os programas ambientais da Prefeitura

Cidade Verde
O objetivo é plantar um milhão de árvores nos
4 anos da gestão Doria.
A prefeitura vai se encarregar de 600 mil mudas. O restante, 400 mil árvores, será distribuído para a população

Corredor Verde – 23 de Maio
Será o maior jardim vertical do mundo. Instalado na Avenida 23 de Maio, o corredor vai ter 10.950 m² de muros cobertos com cerca de 30 espécies diferentes de vegetação

Privatização de Parques
Concessão dos parques à iniciativa privada. A empresa se responsabiliza pelo manejo, manutenção e segurança do parque e, em troca, pode explorar comercialmente a área

Programa Adote uma Praça
Empresas e cidadãos podem adotar uma praça na cidade. A meta é que cinco mil áreas verdes sejam conservadas por parceiros

JOÃO DORIA O prefeito diz que a ideia é humanizar a cidade
JOÃO DORIA O prefeito diz que a ideia é humanizar a cidade (Crédito:Divulgação)