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Quando o historiador Sérgio Buarque de Holanda escreveu, em “Raízes do Brasil”, que o povo brasileiro é cordial, não se referia à polidez. Expressava a ideia de que somos movidos muito mais por impulsos emocionais do que racionais. Fazia uma crítica, portanto. Nos Jogos do Rio, a premissa de Holanda nunca foi tão latente. A performance nacional foi marcada por um desfile de choros incontidos, risos eufóricos, gestos efusivos e outras demonstrações de que a emoção, para o esportista nacional, fala mais alto do que o preparo físico e técnico. Houve quem dissesse que Thiago Braz conquistou o ouro inédito no salto com vara graças, em boa parte, à sua força mental durante a prova. Da mesma forma, é surpreendente que a seleção feminina de vôlei tenha sucumbido diante das chinesas, inferiores em diversos aspectos, mesmo depois de tê-las massacrado no primeiro set. Bastou um revés do jogo para o time inteiro fraquejar. O mesmo se aplica à seleção feminina de futebol, que venceu a Suécia por 5 a 1 na primeira fase e depois, na semifinal, foi derrotada nos pênaltis. Nos dois casos, o que fez a diferença foi o tumulto de emoções vivido pelas atletas brasileiras.

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Houve um tempo em que se dizia que os brasileiros falhavam no Exterior porque se sentiam oprimidos pela torcida adversária. Uma vaia aqui, uma zombaria ali eram suficientes para desestabilizar o time inteiro. Nos últimos dois anos, os atletas tiveram a chance rara de se apresentar para uma multidão apaixonada. Na Copa do Mundo, o apoio popular surtiu um efeito contrário ao esperado. O 7 a 1 para a Alemanha não representa a diferença técnica entre os dois times: os alemães eram melhores, mas não tanto assim. O que pesou, e isso é inegável, foi o medo de perder – ou a responsabilidade de ganhar – diante da própria torcida. A mesma inconstância emocional pode ter influenciado no desempenho de Marta e companhia no futebol feminino na Olimpíada. Prata com o vôlei feminino em Atlanta-96, Ana Moser faz uma análise lúcida da questão. “No Brasil, é tudo ou nada, porque o competidor vive com a expectativa de que uma medalha irá mudar a vida dele.”

A exibição consagradora de um atleta ou o fracasso inesperado podem estar ligados à maneira como ele gerencia as emoções. Isso ficou claro nas palavras de Diego Hypolito, depois que ele conquistou a prata no solo nos Jogos do Rio. “Na hora que fui para a última acrobacia, me veio um filme de Pequim”, recordou o ginasta, referindo-se à Olímpiada realizada em 2008, na qual ele chegou como favorito ao ouro, mas fracassou. “Mas não deixei nenhum pensamento negativo me atrapalhar.” De acordo com a psicóloga Mara Raboni, que presta atendimento a atletas profissionais, expressar emoção não fragiliza o competidor. “Pelo contrário, dá a ele um caráter de garra e vivacidade e tem o poder de motivar os torcedores”, diz ela. “A manifestação emocional sadia pode até desestabilizar o adversário.” Isso, reforça Nuno Cobra, ex-preparador físico e mental de Ayrton Senna, é a maior força de um atleta. “Se ele não se emocionar, é grande a chance de ter um desempenho medíocre”, afirma. “Tanto é verdade que, no atletismo, muitos competidores pedem palmas para o público a fim de sentir a emoção.”

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Medo e ansiedade são os sentimentos que derrubam um atleta. O que eles provocam:

POR QUE AS EMOÇÕES NEGATIVAS PREJUDICAM O DESEMPENHO

1 – O cérebro prepara o corpo para reagir ao que interpreta como uma ameaça

> A freqüência cardíaca e a pressão arterial se elevam

> A respiração torna-se mais curta

> Com menos oxigênio, o atleta sente-se mais cansado

> Os músculos ficam tensos, prejudicando a execução dos movimentos

> As pupilas se dilatam, perturbando a visão

2 – A mente é atingida

> O foco mental passa a ser a ameaça. A concentração no jogo acaba

> Cresce a irritabilidade com os erros consecutivos

> A sensação de impotência toma conta e o descontrole pode resultar em crises de choro