Motivados pela reabertura da economia ou pelo medo de uma nova escassez de mercadorias por conta da falta de transporte, muitos dos grandes varejistas mundiais abasteceram seus estoques esperando um aumento na demanda, mas não foi o que aconteceu. O mundo está entrando em recessão e os consumidores com medo de gastar por falta de dinheiro ou pela queda do seu poder aquisitivo estão mais criteriosos e comedidos em suas compras, fazendo o perfil do consumo mudar.

O estoque de 2.349 grandes companhias globais chegou a um valor recorde de US$ 1,87 trilhão (R$ 10 trilhões) no final de março, segundo dados da FactSet compilados pelo jornal japonês Nikkei. Uma diferença de US$ 97 bilhões (R$ 523 bilhões) em relação ao trimestre anterior.

EM ALERTA Magazine Luiza equilibra estoque para não sentir os reflexos da recessão — Centro de Distribuição Magalu (Crédito:Divulgação)

Mas o problema não fica restrito aos EUA. Com a inflação se espalhando pelo mundo, empresas de outros países também estão com produtos demais para vender. A Samsung, por exemplo, interrompeu temporariamente a compra de painéis LCD usados na produção de televisores, devido à baixa demanda de produtos eletrônicos. A empresa sul-coreana acumulou estoque de US$ 39,2 bilhões (R$ 211 bilhões) em março, aumento de 13% em relação ao fim do ano passado.

Reflexos amenos

O Brasil também sentiu os efeitos do caos logístico causado pela pandemia e a crise do combustível, mas bem menos que outros países.

Segundo a especialista em mercado varejista da USP e CEO da AGR Consultores, Ana Paula Tozzi, um dos pontos a favor do Brasil é a regionalização das indústrias e varejos. “Ter uma economia verticalizada, diversificada e pouco internacionalizada faz com que o país sofra menos com as rupturas na cadeia de abastecimento”, declara.

De acordo com a especialista, o Brasil, por já possuir um leque de empresas nacionais que atendem boa parte da cadeia de suprimento, vem sofrendo menos com a crise de ruptura global, mas não está imune. “Faltam estoques, insumos para a produção ficando mais caro (milho caro faz leite muito caro! Aí falta leite, porque fica mais barato abater o gado); inflação nos fertilizantes, diesel, enfim, os estoque ficam menores e os preços mais caros”, pontua.

A rede varejista Magalu, por exemplo, uma das maiores do país, diz que está com níveis de estoque dentro da normalidade. Segundo Vanessa Rossini, gerente de relações com investidores da empresa, os resultados do primeiro trimestre de 2022 mostram que os níveis de estoque foram ajustados, com redução do saldo em mais de R$ 1 bilhão comparado ao fechamento de 2021. “Nosso ajuste de estoque vem do fim do ano, o que nos coloca em uma posição bastante confortável”, diz.

Ana Paula Tozzi, CEO da AGR Consultores (Crédito:Rodrigo Fernandes)

De acordo com ela, a companhia se antecipou ao risco de desabastecimento da pandemia e não teve dificuldades com os produtos. “Vale citar que não começamos esse processo neste trimestre. Nosso ajuste de estoque vem do fim do ano, o que nos coloca em uma posição bastante confortável para a realidade da atualidade”, explica.

Em meio à marca histórica de 66,6 milhões inadimplentes no Brasil, segundo indicador da Serasa Experian em maio, as vendas do varejo enfrentam dificuldades. O número é o maior desde o começo da série histórica iniciada em 2016.

Para a executiva, o varejo é um dos setores que mais sente os efeitos da atual fase macroeconômica e da inflação alta. “Nessas condições, o consumidor perde poder de compra e, consequentemente, gasta menos. No nosso caso, adotamos diversas iniciativas com o objetivo de ajustar nossa operação para as condições de mercado atuais, como redução dos níveis de estoque, revisão e otimização das despesas”, resume.