Nos três primeiros meses de 2017, três casas foram invadidas na rua Engenheiro Alonso de Azevedo, na zona sul de São Paulo. Pelo cotidiano de insegurança que viviam, os vizinhos criaram um grupo no Whatsapp para se comunicarem quando notassem movimentações estranhas.

Às 6h48 da terça-feira 30, Sônia Maria Ferreira dos Santos, 39 anos, acordou com uma mensagem preocupante enviada pela vizinha da direita. “Acho que tem uma pessoa no meu quintal.” Sônia e o marido olharam por um gradil que separa uma propriedade da outra e viram um jovem deitado, imóvel, na casa ao lado. Andreas Albert von Richthofen, 29 anos, não se identificou quando foi abordado pelos policiais que chegaram para resolver o caso.

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Dizia frases desconexas, não foi violento, parecia assustado.

Às perguntas sobre quem era e o que fazia, respondeu: “Não queiram saber da minha vida.” Disse apenas que vivia na rua República do Iraque, a dois quilômetros dali, mas que sua casa era “zoada”.

O local a que se referia é uma mansão e, na data em que a reportagem foi ao local, parecia vazia. Fica perto do palco da maior tragédia da vida de Andreas von Richthofen.

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Numa casa próxima, a de sua infância, os pais Manfred e Marísia foram mortos pelos irmãos Daniel e Cristian Cravinhos, em 2002, com a ajuda de sua irmã, Suzane.

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TRISTEZA A medalha com o brasão dos von Richthofen que o jovem levava dentro de uma caixa de joias
TRISTEZA A medalha com o brasão dos von Richthofen que o jovem levava dentro de uma caixa de joias

SEM VISITA NO HOSPITAL

Andreas havia desaparecido da atenção pública até a manhã da última terça. Só foi reconhecido como o irmão de Suzane no Hospital Municipal do Campo Limpo, para o qual foi levado. Quando foi encontrado, estava com a roupa rasgada e tinha as pernas marcadas por escoriações e ferimentos. E carregava consigo uma caixa de joias dentro da qual havia uma medalha cunhada com o sobrenome von Richthofen.

No prontuário do hospital, o rapaz foi descrito como alguém com “higiene precária” e “os olhos vidrados”. Ele teria dito que faz uso esporádico de álcool e maconha, mas que não havia consumido nenhuma das substâncias recentemente. Às 21 horas do mesmo dia, o médico Miguel Abdalla, tio materno e tutor de Andreas até sua maioridade, foi à unidade para receber os pertences do sobrinho. Mas o rapaz havia sido transferido para a clínica São João de Deus, especializada na recuperação de usuários de drogas e conveniada com o SUS. Andreas chegou de ambulância e sem acompanhantes. Números de telefones de pessoas que seriam próximas foram acionados, mas ninguém atendeu. Andreas também não recebeu visitas nos primeiros dias na clínica. Pelos próximos 30 dias, ficará internado em regime de desintoxicação.

 ARQUIVO Bastante ligado ao pai, Manfred, o jovem tinha bom convívio familiar e era próximo da irmã, Suzane
ARQUIVO Bastante ligado ao pai, Manfred, o jovem tinha bom convívio familiar e era próximo da irmã, Suzane (Crédito:Sérgio Castro)

CARREIRA PROMISSORA

Andreas vivia recluso desde o assassinato dos pais, muito para escapar dos olhares curiosos ou até mesmo recriminatórios. “As pessoas questionavam se ele tinha alguma participação no crime”, conta o advogado Roberto Tardelli, responsável pela acusação criminal de Suzane. “Ele foi a grande vítima e sobrevivente do crime.” Na adolescência, ao contrário da maioria dos jovens, o irmão de Suzane não era adepto de redes sociais e dispensava baladas.

Único herdeiro da família, o rapaz se concentrou numa carreira acadêmica promissora: pulou da graduação em Farmácia diretamente para o doutorado em Química na Universidade de São Paulo (USP). Uma rápida conversa com quem conviveu com ele nos tempos de estudo revela uma pessoa de inteligência excepcional, afável e educado. “Além de extremamente inteligente, sempre foi atencioso, respeitoso e gentil”, diz uma professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP e orientadora de Andreas em seu trabalho de conclusão de curso. “Ele apresentava um enorme potencial de pesquisador e, depois do seu doutorado, pensei que estivesse fora do País em algum centro de pesquisa.” O professor Claudio di Vitta, que o orientou no doutorado, também fez elogios ao ex-aluno. “A relação dele comigo e com todos era absolutamente normal”, afirma.

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De sua saída da USP, em 2015, até hoje, não há uma linha clara da trajetória de Andreas. Na única vez em que fez uma declaração pública sobre sua história, há dois anos, Andreas afirmou que planejava deixar o Brasil por causa do peso do sobrenome. Manifestou esse desejo também em uma das últimas conversas com o advogado Tardelli. Contou, inclusive, que havia recebido convites para estudar no Exterior. A tragédia do rapaz encontrado sujo e em surto, agarrado a um símbolo do mesmo sobrenome do qual queria se livrar, demonstra, infelizmente, que a tristeza de Andreas parece não ter um fim.

Por onde andou Andreas
A vida do herdeiro dos von Richtofen após a tragédia

> 2002
Depois da morte dos pais, em outubro, Andreas passa a viver sob a tutela da avó, Lourdes Maganani Abdalla, e do tio, o ginecologista Miguel Abdalla Neto. Lourdes morreu quatro anos depois

Com 15 anos, o jovem muda de colégio e vive sob uma barreira de proteção de amigos e familiares. Estudava na melhor escola de São Paulo e dizia que queria trabalhar com remédios e laboratórios


> 2005
É aprovado no vestibular para o curso de Farmácia e Bioquímica da USP em terceiro lugar. Passa em outras quatro faculdades, entre elas Medicina na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Na USP, era tido como um aluno excelente

> 2010
Logo após a graduação, é aprovado para o doutorado na Faculdade de Química, também da USP. Com uma carreira acadêmica se consolidando, viaja para eventos de divulgação de trabalhos e acumula 11 publicações científicas no currículo

> 2015
Na única vez em que falou publicamente desde a tragédia, entregou uma carta a um repórter da Rádio Estadão. Sobre o crime, disse apenas que compartilhava a raiva e a indignação contra os “três assassinos”.


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