Na economia, poucas palavras são tão assustadoras quanto “inflação”. É ela que teima em dizer que a gasolina subiu, que o tomate ficou caro demais ou que vai ser impossível segurar o valor do aluguel. No Brasil, a temível palavra aniquilou sonhos durante décadas até ser domada pelo Plano Real. No governo Dilma Rousseff, a disparada de preços voltou a assustar, mas o velho pavor começou a ser contido no ano passado, quando a inflação finalmente se manteve nos limites da meta definida pelo governo. Agora, os brasileiros se deparam com uma novidade que não viam há 11 anos: a deflação. Em junho, o mercado projeta uma queda de 0,15% nos preços, e talvez o fenômeno não pare por aí.
Diante da crise política que impede uma retomada econômica vigorosa, essa é a melhor notícia do cenário econômico. A expectativa é que a queda dos preços anime as pessoas a voltar a comprar. “Ela passa para o consumidor o sentimento de que o seu dinheiro está valendo mais”, afirma Marcos Gouvêa de Souza, fundador da consultoria de varejo GS&MD. “A combinação da queda da inflação com a liberação do FGTS criou um movimento positivo no mercado.” Os gastos não serão estratosféricos, mas a discreta recuperação do varejo, um dos setores que mais sofreu com a crise econômica, começa a ser notada.

Mas é preciso ter cuidado. Quando se mantém por longos períodos, a deflação traz prejuízos. Nesses casos, ela é um sinal de que a economia vai mal: alto índice de desemprego, baixos salários, crescimento econômico tímido. Em um cenário assim, os consumidores têm medo de comprar e gastam cada vez menos – e o PIB não avança. Não deve ser esse o caso do Brasil. Segundo Gilberto Braga, professor de finanças do Ibmec, é possível que os resultados dos próximos meses também sejam negativos ou, se positivos, bem próximos a zero. Mas o consumo não deve parar. “Temos um cenário de medidas microeconômicas, como as novas regras do cartão de crédito e a redução da taxa de juros, que estimulam as compras.”

ALUGUEL O psicólogo Roger e a atriz Larissa: com a queda dos preços, eles acharam o imóvel ideal (Crédito:Gabriel Reis)

Bom para o consumidor

Nos supermercados, os consumidores já sentiram a diferença. Se os preços não caíram vertiginosamente, ao menos se estabilizaram. A secretária Vânia Santos, 37 anos, afirma que eles estão mais controlados. “Os produtos de alimentação estão com preços mais estáveis e no setor de hortifruti, acho até que caíram”, diz. “Com o que economizamos nisso, já podemos comprar outras coisas, como guloseimas.” O bom clima e os bons resultados agrícolas puxaram para baixo o custo dos alimentos: o setor, que no ano passado representou 25% da alta da inflação, deve significar 5% este ano. “Isso é bom porque é na comida que as famílias de baixa renda, que mais sofrem com a crise, comprometem 25% do seu orçamento”, diz André Braz, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) do FGV-IBRE. “Elas estão economizando onde gastam mais.”

O cenário também é positivo para aqueles consumidores que pretendem negociar contratos de aluguel ou mensalidade escolar. No caso dos imóveis, a grande oferta de casas e apartamentos aumenta o poder de barganha dos inquilinos. “Diante da conjuntura econômica, ele pode negociar o reajuste do contrato e, se isso não for vantajoso, pode procurar um imóvel de igual padrão com um preço menor”, afirma Braz. É essa oportunidade que o psicólogo Roger Recupero, 29, e a atriz Larissa Rizk, 30, pretendem aproveitar. De olho na baixa dos preços, o casal está procurando um imóvel de mesmo padrão, mas em regiões mais valorizadas de São Paulo. “Encontramos apartamentos com a mesma estrutura, o mesmo número de cômodos, e com valores mais baixos do que o que pagamos hoje”, afirma Recupero. “Na época em que procuramos nesses lugares, eles estavam mais caros.” Mal que persegue a população há décadas, o dragão da inflação encolheu – e o resultado, por enquanto, é bom para todos.