“Foi uma pequena grande maravilha na minha vida”. A frase, dita pelo pediatra paulista Daniel Jarovsky, pode parecer exagerada. Mas para quem, como ele, sofreu com dores de cabeça quase que diariamente durante anos, ela tem o tamanho certo. Daniel refere-se a um novo aparelho responsável por poupá-lo do uso dos analgésicos e pelo acréscimo de mais qualidade à rotina. Ao longo de seis meses, o médico usou o Diva® (dispositivo interoclusal de vigília) e conseguiu fazer sumir o bruxismo que estava por trás da cefaleia recorrente.

Tensão de dia

O bruxismo é uma das principais causas da dor de cabeça tensional, registrada na região das têmporas e normalmente mais acentuada no final do dia. Ele é caracterizado pela contração irregular dos músculos temporal e masseter, fundamentais na sustentação da mandíbula. Além dessa função, ambos também foram projetados para serem acionados no fechamento e na abertura da boca, permitindo a mastigação e a deglutição da saliva. Nesses momentos, realizam contrações de alta intensidade que duram apenas o tempo dos movimentos. O problema é que a tensão e o estresse podem levar as pessoas a mantê-los contraídos boa parte do tempo, e, o pior, sem perceber. Neste caso, embora constante, a contração é fraca.

Durante muito tempo acreditou-se que a contração feita ao longo do sono fosse a responsável pela dor do dia seguinte. Hoje, sabe-se que a culpa, na verdade, é do bruxismo de vigília. “Em média, em oito horas de sono há apenas oito minutos de musculatura contraída”, afirma o dentista Alain Haggiag, pesquisador do time de Dor Orofacial do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC/SP). “É pouco e não justifica a dor.”

Baseado nessa constatação, Haggiag criou um tratamento que previne as contrações fora de hora ocorridas de dia. Seu princípio é o de ensinar o paciente a identificar quando elas estão ocorrendo e evitar que prossigam. Para isso, primeiro é feita uma avaliação por meio da qual a pessoa enxerga em uma tela quando está contraindo os músculos e a respectiva altura dos dentes. O correto é que exista um espaçamento entre as arcadas superior e inferior. Se os dentes se tocam é porque a musculatura está contraída. “O exercício é um aprendizado. O indivíduo passa a perceber a contração que levará à dor”, explica Haggiag. A análise ainda informa o espaço ideal entre as arcadas. O Diva® é confeccionado na medida, colocado entre os dentes e ajuda a manter o espaçamento. O dispositivo também serve de alerta: toda vez que a pessoa contrai o músculo quando não deveria, aciona o aparelho e, voluntariamente, relaxa a musculatura. Assim, reverte-se o hábito responsável pela dor.

O dispositivo já teve patente requerida e foi testado durante três meses em 62 pacientes. Todos tinham queixa de dor moderada quando começaram a usá-lo. Uma semana depois, relataram melhora de cerca de 60% na sua intensidade. Ao final dos noventa dias, a redução relatada era de 85%. “A reeducação promovida pelo aparelho é o que melhor funciona”, diz Haggiag. Além de servir de alerta, o aparelho ajuda a promover uma reconfiguração no sistema de envio dos sinais dolorosos ao cérebro. Aos poucos, ocorre uma diminuição da sensibilização central à dor.

Há uma questão que ainda precisa ser observada. Não se sabe se e em quanto tempo o paciente se habituaria ao estímulo causado pelo aparelho, tornando-o ineficaz. É isso o que ocorre muitas vezes com as placas usadas à noite. Depois de um tempo, há uma conformação do sistema nervoso central ao novo elemento e ele perde sua função de relaxamento muscular. No caso do Diva®, uma das estratégias para evitar que isso aconteça é mudá-lo de lado periodicamente. E o objetivo é que a pessoa o use apenas por tempo suficiente para que evite as contrações sem precisar dele. Haggiag prepara-se para testá-lo em mais pacientes. O dentista José Tadeu Siqueira, coordenador da equipe de dor orofacial do HC/SP, acredita no potencial da novidade. “Hoje o bruxismo do dia está sendo melhor compreendido. O aparelho é um caminho viável de tratamento.”

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PERCEPÇÃO Na terapia desenvolvida por Alain, o paciente identifica quando a musculatura está contraída (Crédito:Marco Ankosqui)

 


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