Relator de inquérito criminal contra o presidente Michel Temer, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou para enviar diretamente à Câmara dos Deputados a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Temer por participação em organização criminosa e obstrução de justiça. Fachin destacou que cabe à Câmara o primeiro julgamento sobre a denúncia, que seria o julgamento político, e só depois o Supremo poderia discutir os pedidos feitos pela defesa do acusado. “Entendo que não cabe ao STF proferir juízo antecipado a respeito de eventuais teses defensivas”, afirmou Fachin. Os ministros Alexandre de Moraes, Rosa Webber, Luis Roberto Barroso, Luis Fux e Ricardo Lewandowski acompanharam o voto de Fachin. Dias Toffoli abriu divergência e entendeu que a Corte poderia analisar sobre os fatos contra o presidente ocorreram durante o mandato.

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Edson Fachin

Os dois pedidos da defesa de Temer que Fachin transformou em questão de ordem são os de suspender o andamento da denúncia contra o presidente até que sejam esclarecidos os fatos “gravíssimos” que surgiram após divulgação de áudio de conversa entre delatores Joesley Batista e Ricardo Saud, do Grupo J&F, no qual constavam indícios de omissão de informações importantes para o acordo de colaboração premiada. O outro pedido da defesa de Temer é o da discussão sobre a validade das provas.

“Ambas as questões jurídicas já foram enfrentadas pela Corte em mais de um momento. Colhe-se oportunidade para reafirmar os precedentes do STF visando ao bom andamento dos processos”, disse Fachin.

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“À Câmara dos Deputados compete deliberar por primeiro. Somente após autorização da Câmara é que tem cabimento dar prosseguimento à persecução criminal no STF. Não cabendo a essa Suprema Corte proferir juízo de admissibilidade sobre denúncia antes do exame e da autorização ou não pela Câmara, igualmente entendo que não cabe a essa Corte proferir juízo antecipado a respeito de eventuais teses defensivas”, afirmou Fachin, que citou precedentes dos ministros Dias Toffoli e também argumento da obra jurídica do ministro Alexandre de Moraes.

Fachin afirmou que “o acordo de colaboração, como negócio jurídico personalíssimo, não vincula o delatado e não atinge diretamente a sua esfera jurídica”. O ministro, então, leu um trecho de decisão do ministro Toffoli de julgamento em 2015: “Ainda que o colaborador, por descumprir alguma condição do acordo, não faça jus a qualquer sanção premial por ocasião da sentença, suas declarações, desde que amparadas por outras provas idôneas (art. 4º, § 16, da Lei nº 12.850/13), poderão ser consideradas meio de prova válido para fundamentar a condenação de coautores e partícipes da organização criminosa”.

Sobre a validade das provas, também questionada pela defesa do presidente Michel Temer, Fachin disse que também não é momento de entrar nesta análise agora, mas apenas posterior a uma eventual aceitação da Câmara para o processamento da denúncia no Supremo.

“A ilustrada peça demonstrada pela douta defesa em meu modo de ver antecipa a discussão de mérito judicial somente cognoscível admissível nesta Corte se e após o juízo positivo for proferido pela Câmara”, disse Fachin.

“A possibilidade de revisão total ou parcial de acordo homologado de colaboração premiada por descumprimento de deveres assumidos pelo colaborador, que deve ser reconhecido pelo Judiciário, tem efeito somente entre as partes não atingindo a esfera jurídica de terceiros”, acrescentou o ministro.

Alexandre de Moraes

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta quarta-feira, 20, contra a suspensão da tramitação da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente Michel Temer pelos crimes de obstrução de justiça e organização criminosa.

Segundo Moraes, o caso J&F levou à reflexão sobre questões da colaboração premiada. Sem citar nomes, o ministro disse que “delatores que pactuaram esse acordo esconderam sua verdadeira motivação”.

“Claramente por parte dos delatores, ficou demonstrado pelas próprias palavras dos delatores que havia desvio de finalidade, finalidade criminosa ao buscar esses acordos. Uma vez pedida a rescisão da homologação, e uma vez presos, os delatores passam a chantagear o Poder Público e a informar que teriam uma série de gravações, inclusive no exterior”, comentou Moraes.

“Estamos a analisar uma situação absolutamente inédita, tão inédita que há investigação de dois membros do Ministério Público”, ressaltou o ministro.

Legalidade


Moraes destacou em seu voto o entendimento firmado pela Corte em junho deste ano, quando o STF decidiu que as colaborações premiadas homologadas só podem ser revisadas pelo colegiado se o delator descumprir os termos firmados com o Ministério Público Federal (MPF) ou se forem verificadas ilegalidades que possam motivar a anulação do acordo.

“Fica muito claro o absoluto acerto desta Corte, no dia 29 de junho, ao determinar que o acordo homologado em regra haverá de ser observado, sendo possível ao plenário a análise da sua legalidade”, pontuou Alexandre de Moraes.

“Nós teremos um encontro marcado com análise sobre licitude de provas”, destacou Moraes, ressaltando que a discussão sobre o tema pelo plenário do STF deve ocorrer apenas depois de a Câmara dos Deputados dar aval para o prosseguimento da denúncia.

“Esse segundo momento da análise da licitude ou ilicitude das provas, dos meios de prova, deve ser realizado processualmente quando o STF adquire para esse fim jurisdição decisória”, explicou o ministro.

“A partir dessa autorização (da Câmara), aí, sim, o STF naquele momento do recebimento da denúncia, se vier a ocorrer, é que poderá realmente analisar o que foi alegado pela defesa. Não é (agora) o momento processual de se analisar licitude seja dos meios de provas seja das provas”, concluiu Moraes.

O ministro Marco Aurélio Mello, que ainda não votou, sinalizou que deve ter entendimento semelhante. “Até aqui, a denúncia é intocável pelo Poder Judiciário”, disse Marco Aurélio.

Julgamento

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta tarde o julgamento de uma questão de ordem sobre o processamento da denúncia apresentada pelo então procurador-geral da República Rodrigo Janot contra Temer pelos crimes de organização criminosa e obstrução de justiça.

A defesa do presidente Temer quer a suspensão da tramitação da denúncia, até que sejam esclarecidos os indícios de irregularidade envolvendo as delações do empresário Joesley Batista e do executivo Ricardo Saud, do grupo J&F. O advogado do presidente, Antônio Cláudio Mariz, também pretende pedir em plenário que a Corte decida sobre a devolução da peça à PGR.

Outros temas poderão ser levados ao centro do debate na sessão, como a discussão sobre a validade de provas.


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