O mundo político está naufragando e o sistema, paradoxalmente, continua funcionando. Ainda que precariamente. No entanto, quem pontifica é o Poder Judiciário. Com o Poder Executivo limitado por suas contradições e o Legislativo fragmentado, sob investigação e sem consenso, vivemos sob o império do Judiciário. Algo inédito na história política do Brasil e que foi definido pelo ministro Gilmar Mendes, do STF, como a “república de juízes e promotores”. Para o bem e para o mal.

O que favorece o predomínio do Judiciário? Basicamente, quatro fatores que abordo aqui de passagem. O primeiro deles é a incapacidade de o mundo político esboçar uma reação conjunta e coerente frente aos eventos derivados da Operação Lava Jato. Na Itália e na Espanha, que viveram escândalos políticos semelhantes, conseguiu-se esboçar reações. Tal inércia, no caso brasileiro, decorre tanto do comprometimento do mundo político com práticas questionáveis ética e judicialmente quanto pela qualidade de nossas lideranças, incapazes de justificar o injustificável ou de se opor à marcha dos acontecimentos.

O segundo fator resulta da crescente fragmentação do Congresso Nacional e de sua consequente incapacidade de decidir questões complexas. Existem simulacros de partidos e privilégios demais para microlegendas e partidos de aluguel. Tudo debaixo de uma imensa complacência do mundo político. Por consequência, o Judiciário tem sido chamado a decidir questões do âmbito político em um fenômeno conhecido como judicialização da política.

Como disse o ministro Luís Roberto Barroso, também do Supremo, “a judicialização é fato”. Curiosamente provocada pelo mundo político e estimulada pelo excessivo detalhamento de nossa Constituição.

O terceiro fato relaciona-se com essa judicialização da política, que tem levado a um ativismo crescente por parte de juízes e promotores, que testam ao máximo os limites da lei e acabam “legislando”, preenchendo lacunas do sistema legal. O Supremo Tribunal Federal terminou por decidir, por exemplo, sobre a questão da fidelidade partidária e do financiamento de campanha na reforma política, sobre a união homoafetiva, o aborto, entre outros tantos temas cuja legislação era insuficiente ou inexistente. Outro efeito do ativismo é a explosão de decisões monocráticas em ações de controle concentrado na Suprema Corte. Foram 191 decisões em 2010. Esse ano elas chegam a 334.

O quarto fator reside na tendência inexorável de punição aos políticos envolvidos nas investigações da Lava Jato. No curto prazo, um número relevante de políticos com mandatos poderá ser impedido de concorrer às eleições em 2018. Assim, o que se apresenta é um quadro nebuloso: teremos uma devastação nas cúpulas partidárias ou apenas a derrocada seletiva de uns e outros? Não há como fugir de um cenário de perdas. O futuro do atual mundo político está nas mãos de Têmis,
a deusa da Justiça. Que ela não tarde nem tampouco falhe.

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