Escrevo esse artigo ainda sob o impacto de um fim de semana muito estranho. Estranho não me parece ser o adjetivo mais adequado mas não consigo encontrar outro. Fatos – e as reações a eles – ainda me confundem. Olho para a tela da tevê e vejo um estádio cheio de gente gritando “Bruno! Bruno!” quando o ex-presidiário, condenado por assassinato, entra em campo. Seria exagero acreditar que qualquer profissional de qualquer área devesse deixar de ser exemplo de qualquer coisa depois de planejar a morte da ex-namorada?

Dou um tempo. Vou procurar algo na geladeira pensando se o senso comum foi redefinido por decreto enquanto eu não prestava atenção. Busco respostas no lugar menos indicado: as redes sociais.

E descubro que um assediador recebeu milhões de votos de telespectadores para continuar em um reality show da televisão.

O tal competidor (competidor? O que está em disputa? O escândalo mais escandaloso?) grita, ameaça e abusa fisicamente de uma outra competidora, uma jovem que, claramente, não consegue perceber o assédio que sofre. Já vi dezenas de casos iguais. Mulheres que não reagem ao abuso porque não o percebem como tal. Viram reféns voluntárias do algoz. Mas dessa vez o caso acontece em rede nacional. E a população o aprova. É um estádio de proporções continentais dizendo sim ao abusador, que só foi afastado do programa depois que uma delegada pediu as imagens da agressão. A jovem, me informo depois, talvez não tenha idade ou experiência para entender o que acontece a ela.

Mas o que dizer de uma jornalista que supomos bem informada e suficientemente responsável pelas próprias palavras e reações? O link me chama atenção. Silvio Santos, o ídolo da comunicação, humilha uma funcionária de seu canal no que deveria ser uma festa de premiação. Diz sem meias palavras que ela está ali para ser bonita e ler noticias escritas por outros. Se o funcionário em questão fosse um homem, seu Silvio usaria o mesmo tom?, penso eu. E aguardo, ansiosa, a reação da colega de profissão. Não veio. Nada. Descubro a seguir que a profissional em questão considerou tudo aquilo mais uma “brincadeira do patrão”.

Muita coisa deve ter acontecido depois que me sentei aqui para desabafar, dois dias depois de tudo isso. Espero, meio sem esperanças, que para melhor. O mundo anda muito estranho.

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Seria exagero acreditar que qualquer profissional devesse deixar de ser exemplo de qualquer coisa após planejar a morte da ex-namorada?


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