O subprocurador-geral da República, Marcelo Antônio Muscogliati, afirmou nesta terça-feira, 22, que, em sua versão atual, a Medida Provisória (MP) 784 ainda comporta questionamentos de constitucionalidade. “Há questões atinentes, por exemplo, à criação de fundos. Isso me incomoda como cidadão, não como procurador da República, porque me preocupa a questão das contas públicas e da forma de gestão de contas”, afirmou, durante audiência pública na comissão mista do Congresso que analista a MP.

Alvo de críticas do Ministério Público Federal (MPF), a medida estabelece novo marco punitivo para instituições financeiras e que atuam no mercado de capitais. Além disso, cria o acordo de leniência administrativa com o BC e o termo de compromisso. O texto da MP também prevê a criação de dois fundos financiados pelo recolhimento de multas a serem aplicadas às instituições: um para o desenvolvimento do sistema financeiro e outro voltado para o desenvolvimento do mercado mobiliário.

“Lembrando que nossa história é inflacionária e que nas décadas de 1980 e 1990 tivemos uma série de fundos que falharam, eu vejo isso (criação dos fundos) com certa preocupação”, disse Muscogliati. “Eu gosto de dinheiro público encaminhado ao Tesouro, e depois o Legislativo define qual é o caminho que o Tesouro deve dar (aos recursos)”, acrescentou.

Muscogliati lembrou que a proposta de criação dos fundos surge justamente “em momento de crise econômica, em que grandes economistas explicam que uma das dificuldades do sistema é que muito dinheiro é carimbado, direcionado, sem margem para aplicação”. “Isso faz parte do dia a dia do Congresso e é um grande problema.”

O subprocurador-geral da República afirmou ainda que a MP 784, na forma atual, revoga a Lei 4.595 – que dispõe sobre a política e as instituições monetárias, bancárias e creditícias – no que diz respeito à punição a cidadãos e empresas. “No nosso ponto de vista, ela tem problemas e merece correção”, disse.

Sobre a criação do acordo de leniência com o BC, previsto também na MP 784, Muscogliati defendeu a ideia de que a leniência é um “instrumento de investigação”. “Leniência não serve para salvar instituição, empresa. É instrumento de investigação contra organização criminosa. É pra isso que serve”, afirmou. “Leniência não é necessariamente para aplicar multas e recuperar valores. Se o meu intuito é este, tenho que usar outro nome e outro instituto.”

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O representante do Ministério Público também chamou atenção para o risco de a leniência ser desqualificada. “O risco de desqualificar a leniência para instrumento de investigação é justamente precificar o cartel e precificar a organização criminosa, no sentido de que é possível fazer contingência para risco e exposição ilícita”, afirmou.

“Se resolvo um (problema de) cartel com multa, mando uma mensagem para este cartel a respeito da necessidade de guardar dinheiro para pagar uma multa”, exemplificou. “Este é o risco de não identificar na leniência um instrumento de investigação para conhecimento de fatos desconhecidos pela autoridade, e para desarticular organização criminosa.”

Apesar das críticas ao texto da MP 784, Muscogliati ressaltou que o MPF tem dialogado com o Banco Central para tentar entender “o que nos incomoda e o que os incomoda”. Ainda nesta terça-feira, representantes das duas instituições fariam nova reunião para discutir pontos da medida provisória.

Na audiência pública desta terça-feira, os representantes do BC sinalizaram a disposição de mudar pontos da MP, inclusive em relação ao acordo de leniência, para aperfeiçoá-la. Na quarta-feira (23) e na quinta-feira (24), ocorrem outras duas audiências públicas na comissão mista para tratar da matéria.


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