Ele se iniciou como roteirista nos anos 1950, escrevendo episódios para séries de TV como Make Room for Daddy, The Dick Van Dyke Show e para o The Lucy Show, que substituiu I Love Lucy, quando Lucille Ball ainda era a rainha dos enlatados da ‘América’. Garry Marshall foi ator e, em 1982, virou diretor com Médicos Loucos e Apaixonados. Ele se orgulhava por ser prolífico – como produtor, diretor e roteirista, fez mais de mil episódios de séries e assinou alguns êxitos memoráveis no cinema. Não representa pouco o título que ostenta de ter sido o descobridor de Julia Roberts.

Na terça, 19, Garry Marshall morreu em Burbank, na Califórnia. Estava internado com pneumonia, seu estado se complicou. Tinha 81 anos. Irmão da também cineasta Penny Marshall, era casado há mais de 50 anos (desde 1963) com Barbara Sue Marshall. Tiveram três filhos e seis netos. Era o que se chama de ‘homem de família’. Fez da comédia romântica o seu estandarte. Na TV, é lembrado principalmente pela série Happy Days/Dias Felizes, que virou um fenômeno cultural nos anos 1970. No cinema, por O Diário da Princesa e, claro, Pretty Woman/Uma Linda Mulher. O ano era 1990 e devia haver alguma conjunção astral favorável, porque, em princípio, nada predispunha o filme a se transformar no sucesso planetário em que se converteu.

Para início de conversa, era para ser uma abordagem realista da prostituição de luxo em Los Angeles. O título original – US$ 3000, que é o valor que Vivien cobra para passar a semana com Edward. Só que as coisas foram mudando, o quase documentário adquiriu ares de fábula e virou uma moderna versão de Cinderela, com toques de Pigmalião. Edward é um milionário que precisa de uma acompanhante em Los Angeles, por uma semana. Contrata a prostituta das ruas, Vivian. Dá-lhe um banho de butique, entregando-lhe seu cartão de crédito para que ela trate da pele, do cabelo e adquira roupas de grife na exclusiva Rodeo Drive. Para o papel de Vivian, Marshall queria inicialmente Karen Allen, que havia feito o primeiro Indiana Jones. A Disney, que produzia a comédia, sugeriu sucessivamente Molly Ringwald, Winona Ryder e Jennifer Connelly. Vieram depois Meg Ryan, Michelle Pfeiffer e Daryl Hannah, que recusou o papel por considerá-lo degradante para as mulheres.

Em desespero, Marshall resolveu testar a jovem e pouco conhecida Julia Roberts, que havia sido indicada para o Oscar por Flores de Aço. Mas não estava totalmente decidido. Testou-a com Al Pacino e Richard Gere. Algo se passou nas cenas de Julia com Gere e ambos foram contratados. O resto é história. Uma Linda Mulher faturou quase US$ 500 milhões e se converteu na comédia romântica de maior sucesso em Hollywood. Julia virou estrela e até a carreira de Gere, que patinava, foi relançada. Dez anos depois, o diretor reuniu a dupla de novo e colheu novo êxito com Noiva em Fuga. Marshall sempre elogiou a determinação de Julia e reconheceu que, sem ela, Uma Linda Mulher não teria sido a mesma coisa. O curioso é que, apesar disso, recorreu a uma dublê de corpo nas cenas de sexo e até as pernas de Julia no cartaz são de sua sósia, Shelley Michelle. Uma excentricidade do diretor é que ele considerava o ator Hector Elizondo uma espécie de amuleto e sempre lhe reservava um papel em seus filmes. Em Uma Linda Mulher, ele é o ‘padrinho’ que ajuda a prostituta com lições de etiqueta e bom gosto.