O engenheiro Carlos Alberto Neves sofreu um infarto enquanto dirigia em uma avenida movimentada de São Paulo. Depois de perder os sentidos e bater o carro, Neves foi ajudado por um policial militar que passava pelo local. A caminho do Instituto do Coração (Incor), o engenheiro teve outras quatro paradas cardiorrespiratórias. A mais severa delas durou 25 minutos. Nesse tempo, seu coração literalmente parou de bater. “Eu não lembro de quase nada”, diz. “Todos achavam que não sobreviveria ou que poderia ficar vegetando em uma cama. Quando voltei, minha família não acreditou. Posso dizer que nasci de novo.” Como isso foi possível? Neves foi submetido à hipotermia terapêutica, técnica ainda pouco difundida no País que, ao lado de outras inovações no tratamento a pacientes enfartados, pode salvar incontáveis vidas. Apenas no Brasil, ocorrem 720 paradas cardíacas por dia.

Crédito: Marco Ankosqui

A técnica consiste em reduzir a temperatura do indivíduo para até 32 graus, quando o normal é 36,5. O paciente é envolvido por uma manta fria ou, em algumas situações, por cubos de gelo espalhados pele corpo. O processo dura no mínimo 24 horas e tem como objetivo fazer o organismo trabalhar menos, reduzindo o seu metabolismo. “Hoje em dia é mandatório que pacientes que tenham sofrido paradas cardiorrespiratórias passem por esse procedimento”, diz Sergio Timerman, diretor do Centro de Treinamento em Emergências do Incor e um dos responsáveis pela chegada da nova técnica ao Brasil. “O procedimento permite que o indivíduo tenha uma recuperação melhor, menos agressiva e fique quase sempre sem sequelas neurológicas permanentes.”

Redução de danos

Outro procedimento promete ser ainda mais eficaz. Nele, a pessoa é submetida a um cateterismo que induz a hipotermia em no máximo 18 minutos. O cateter é inserido na veia femural (que fica na perna) e, antes de chegar ao coração, resfria o sangue do paciente para uma temperatura entre 32 e 34 graus. Segundo Timerman, essa técnica reduz os impactos do infarto. “O procedimento melhora o pós-operatório, evitando arritmia, cicatrizes grandes e um futuro AVC”, afirma. A diferença desse método é que, além de ser mais rápido, ele permite que o paciente fique acordado o tempo todo.

Vítima de um segundo infarto, o aposentado Antônio Carlos Ramos passou pelo procedimento no ano passado. Ao sair da igreja, sentiu dores no peito, ligou para o filho e pediu ajuda. Quando chegou ao hospital, já estava enfartando. “O médico informou ao meu filho que iram fazer o cateterismo que induz a hipotermia para preservar a integridade do coração”, diz Ramos. Depois de passar 10 dias na UTI, recebeu alta sem ficar com sequelas. Para Natali Giannetti, cardiologista do Incor, a técnica permite a independência do paciente depois da alta, já que na maioria dos casos é possível levar uma vida normal. “Acompanhamos os pacientes até o trigésimo dia depois do infarto e todos tiveram boa recuperação”, diz a médica.

INOVAÇÃO Diretor do Incor, Sergio Timerman foi um dos responsáveis por trazer a técnica ao Brasil (Crédito:Kelsen Fernandes)

Estudos publicados na Europa mostraram que a técnica diminui as sequelas em 35% dos casos. O procedimento foi aplicado em 50 pacientes entre maio de 2016 e fevereiro deste ano. Marko Noc, coordenador da pesquisa e chefe do Centro de Medicina Intensiva da Universidade de Ljubljana, na Eslovênia, ressalta a importância do tratamento. “Eu vejo a técnica como uma terapia adjunta, contribuindo para a diminuição da lesão e aumentando a recuperação do miocárdio”, disse à ISTOÉ. “Vale ressaltar que o que faz um infarto ser categorizado como menor é a melhora dentro de um ano e também não ter insuficiência cardíaca depois da alta”. Desde o ano passado, 32 pacientes foram submetidos no Brasil ao novo método de hipotermia.

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