A primeira vez que o músico brasileiro Marcos Valle e a cantora americana Stacey Kent dividiram o palco foi num dueto de Samba de Verão, no show em comemoração aos 80 anos do Cristo Redentor, no Rio, em 2011, do qual participaram outros artistas. Até então, eles nunca tinham se visto pessoalmente, mas já se conheciam – e já se admiravam – pela música. Ela há mais tempo do que ele. Na adolescência, Stacey descobriu o disco clássico Getz/Gilberto, de Stan Getz e João Gilberto (1964). Ela decidiu então ir até a Tower Records, em Nova York, para ‘desbravar’ álbuns de outros nomes da música brasileira, como Tom Jobim, Elis, Roberto Menescal. Encontrou também Samba’ 68, de Marcos Valle. Integrante da chamada segunda geração da bossa nova, Valle, por sua vez, entrou em contato com o trabalho de Stacey cantando em francês.

Após terem suas histórias cruzadas no palco em 2011, os dois iniciaram uma grande amizade e engataram outros projetos juntos ao longo desses anos: uma série de shows pelo Brasil, um disco gravado ao vivo e lançado em comemoração aos 50 anos de carreira de Valle, em 2013, e agora o novo Marcos Valle e Stacey Kent – Live at Birdland – New York City, especial que reúne CD e DVD gravados ao vivo na casa de jazz nova-iorquina, além de documentário dirigido por Charles Gavin e registrado nos bastidores das temporadas no Birdland e na Tokyo Blue Note, no Japão. O kit será lançado nesta sexta-feira, 29, em plataformas digitais, e, a partir de 1.º de agosto, nas lojas.

O projeto reunirá a dupla mais uma vez em duas apresentações: no próximo dia 4, no Teatro Bradesco, em São Paulo, e no dia 6, no Vivo Rio, com as participações especiais de Dori Caymmi e Edu Lobo, que, além de serem amigos de Valle, são dois artistas importantes em sua trajetória. “Quando iniciei minha carreira, começamos eu, Edu Lobo e Dori Caymmi juntos. Edu havia estudado comigo no colégio quando eu tinha 12, 13 anos, éramos da mesma sala. Passaram-se os anos, um dia entrei no ônibus. Eu tinha de 19 para 20 anos, olhei para o Edu, e ele estava lá com o violão na mão. Eu o reconheci, ele também. Perguntei: ‘você está tocando violão?’. E ele: ‘sim, adoro música’. E eu: ‘meu mundo é esse, estou estudando para ser advogado, mas sei que não vou me formar, já tenho músicas feitas”, lembra Marcos Valle, em entrevista ao Estado, por telefone, do Rio.

Edu já era muito amigo de Dori e propôs a Valle que os três se encontrassem em sua casa. O entrosamento foi imediato. “Fizemos um trio: Edu e Dori tocando violão e eu, piano, e a gente cantando as nossas primeiras músicas.” Eles se apresentaram em programas como o de Sérgio Porto, mas o trio não durou muito, conta Valle, porque, por intermédio justamente de Edu e Dori, ele começou a frequentar rodas de música e conheceu de perto grandes figuras como Roberto Menescal, Tom Jobim, Carlos Lyra, Vinicius de Moraes, Baden Powell, entre tantos outros. Teve oportunidade de mostrar suas próprias músicas e sua carreira deslanchou.

Após 53 anos, os três amigos se reencontram no palco. “Vai ser emoção total”, prevê Valle. Os momentos com Edu incluem Pra Dizer Adeus e A História de Lily Braun e, com Dori, Viola Enluarada e Rio Amazonas. “O que posso dizer é que Edu e Dori são os mestres da música mundial que compuseram as canções mais lindas do mundo inteiro. Para mim, ficar com esses três amigos tão talentosos é algo incrivelmente forte”, diz Stacey Kent, por telefone, de Londres – ela está na Europa em turnê, fala fluentemente português e tem profundo conhecimento da música brasileira.

Poetinha. O repertório de Marcos Valle e Stacey Kent – Live at Birdland contempla a obra de Valle, mas, nessa viagem, Stacey se sente perfeitamente confortável. E, claro, estão lá canções de ‘Samba’ 68’, como ‘Batucada, ‘The Face I Love’, ‘The Answer’ e ‘Summer Samba’. “Eu queria cantar um pouco de tudo, de todas as épocas, mas começamos com as canções do Samba’ 68, porque era bem parte da minha vida pessoal”, afirma a cantora, recordando-se da época em que estavam ela e Marcos Valle pensando no repertório que fariam em dupla. Valle diz que pensou em colocar seus sucessos, em versões em inglês e português, como Pigmalião 70 e If You Went Away (Preciso Aprender A Ser Só). E também uma canção em francês, pois foi assim que ele conheceu Stacey.

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Há ainda a parceria inédita e póstuma de Marcos Valle e Vinicius de Moraes, Amando Demais. A letra do poetinha chegou a Carlinhos Lyra, amigo e padrinho de casamento de Valle, por intermédio de um jornalista. Embaixo da letra, estava o nome de Lyra, mas ele não se lembrava dela. Então, numa reunião de amigos que comemoravam o centenário de Vinicius, em 2014, veio a surpresa. “Carlinhos falou: ‘quero criar uma parceria que não existe, quero corrigir essa lacuna, quero fazer uma parceria de Marcos Valle e Vinicius’ e me entregou a letra na mão. Eu disse: ‘vocês querem me matar do coração!’. É uma típica letra do Vinicius”, diz Valle, que guardou a canção para esse projeto. É a cereja do bolo.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.


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