Alfred Dubs, o Lorde britânico que chegou ao país aos 6 anos fugindo dos nazistas, pediu em uma entrevista com a AFP que “a estupidez” desencadeada por meio do Brexit não impeça a chegada de crianças refugiadas.

Quase 80 anos após chegar da Checoslováquia, na época ocupada pelos nazistas, esse funcionário político da Câmara dos Lordes (alta), acredita, apesar de toda a situação, que seu país de adoção não tenha perdido o desejo de ajudar os perseguidos.

“Creio que existe uma vontade geral de aceitar ao menos algumas crianças refugiadas, dentre a maioria das pessoas, não todas”, afirmou.

“Não acredito que a estupidez britânica diante do Brexit vá afetar o princípio do que estamos fazendo”, emendou.

O referendo realizado em 23 de junho, que deu a opção dos britânicos abandonarem a União Europeia, esteve marcado por uma agressiva campanha anti-imigração.

Dubs, de 84 anos, promoveu uma emenda adotada em maio para permitir que menores vulneráveis busquem asilo no Reino Unido.

Esse político conseguiu entrar em território britânico em 1938 devido ao programa “Kindertransport”, que foi responsável por trazer mais de 10 mil crianças da Alemanha, Áustria e da então Checoslováquia, região na qual atualmente ficam a República Tcheca e a Eslováquia, países sob domínio nazista.

“Mesmo compreendendo que as razões da emenda não tem diretamente a ver com a minha história pessoal, tenho uma relação mais sentimental com o tema”, admitiu.

“Acredito que isso ajudou a exercer pressão sobre sobre o governo”.

A emenda feita por Dubs foi aprovada no mesmo momento em que milhares de pessoas se acumulam em um campo no norte da França, em Calais, com a esperança de cruzar o canal da Mancha e conseguir se instalar no Reino Unido.

“A Selva”, como era conhecido o campo em que os refugiados estavam, foi desmontada por autoridades francesas em outubro, enquanto o Reino Unido aceitou então receber as 300 crianças que estavam em Calais.

Outras 1.600 crianças sem acompanhantes aguardam resposta, em centros distribuídos pelo território da França, se Londres os aceitam.

Londres exclui as “crianças vulneráveis”

Desde que o campo de refugiados de Calais foi desmontado, o governo britânico anunciou novos critérios para a entrada de imigrantes no Reino Unido.

De acordo com essas novas condições, uma criança de até 15 anos pode ser aceita se for síria ou sudanesa, mas caso seja de outra nacionalidade, o critério para entrada admite crianças de até 12 anos.

Também são aceitas crianças sob perigo de exploração sexual, e os menores de até 18 anos que acompanham alguma criança mais nova que esteja dentro das condições.

Além disso, o ministério do Interior exige que os menores tenham chegado à Europa até 20 de março, e tenham entrado em Calais, na França, até 24 de outubro.

Dubs qualificou as novas medidas como um “erro”, e afirmou que elas excluem “crianças muito vulneráveis da Eritreia e Etiópia”.

“Discutir sobre ‘elegibilidade’ vai contra o texto e o espírito da emenda a qual o governo prometeu respeitar”, ressaltou.

O político aparece em um novo filme sobre refugiados, que é o primeiro com a atriz britânica Vanessa Redgrave atrás das câmeras, que elogiou o Lorde.

“É incrível que os ministros do governo não façam o que Dubs os solicitam”, declarou Redgrave à AFP em uma entrevista sobre seu filme, “Sea Sorrow”.

Nem Londres, nem Paris anunciaram quantos menores sem acompanhantes poderão se instalar no Reino Unido – algumas fontes falam em torno de 600 -, e a França deseja que sejam mais.

Porém Dubs está decepcionado com a lentidão do processo, e teme que as eleições presidenciais francesas do próximo ano, juntamente com a influência da Frente Nacional, piorem a situação.

“Pensava que poderíamos decidir entre nós sem a necessidade de haver uma briga”, lamentou Dubs referindo-se aos britânicos e franceses, “que conseguiríamos resolver fácil e rapidamente”.