O japonês Yoshinori Ohsumi foi anunciado nesta segunda-feira vencedor do prêmio Nobel de Medicina, por suas descobertas sobre a autofagia, processo pelo qual as células digerem seus próprios resíduos e cuja disfunção pode provocar doenças como o Parkinson ou a diabetes.

Um processo fundamental na fisiologia celular, a autofagia é essencial para a reciclagem ordenada de partes de células danificadas, e entendê-la melhor tem implicações importantes para a saúde e doenças como o câncer.

As descobertas de Ohsumi “levaram a um novo paradigma na compreensão de como a célula recicla seu conteúdo”, disse o júri.

“Mutações em genes da autofagia podem causar doenças, e o processo de autofagia está envolvido em várias condições, incluindo câncer e doenças neurológicas,” acrescentou.

Ganhar o Nobel “era meu sonho de infância, mas não foi o foco da minha preocupação desde que entrei para a pesquisa. Eu não gosto de competir”, disse Ohsumi a jornalistas em Tóquio após o anúncio.

“As dificuldades para estudar o fenômeno faziam com que soubéssemos pouco sobre o tema até que, em uma série de experimentos brilhantes no início dos anos 1990, Yoshinori Ohsumi utiliza o lêvedo para identificar os genes essenciais da autofagia”, explicou a Assembleia Nobel do Instituto Karolinska, que concede o prêmio.

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“Depois ele prosseguiu para elucidar os mecanismos subjacentes da autofagia no lêvedo e demonstrou que nossas células utilizavam um sofisticado mecanismo similar”, completou a Assembleia.

O processo é essencial para a renovação celular.

Na década de 1960, pesquisadores observaram que uma célula podia destruir seus próprios conteúdos, envolvendo-os em vesículas com dupla membrana e transportando-os para um compartimento de degradação chamado lisossomo, os organismos responsáveis por digerir e destruir os resíduos e bactérias.

O belga Christian de Duve, um dos três premiados com o Nobel de Medicina em 1974, foi quem cunhou o termo “autofagia”, que vem do grego e significa “comer a si mesmo”. De Duve também participou nos estudos que renderam em 2004 o Nobel de Química ao americano Irwin Rose e aos israelenses Aaron Ciechanover e Avram Hershko.

Ohsumi foi capaz de construir sobre o trabalho de De Duve e mostrar que o lisossoma “não era um depósito de lixo, mas uma fábrica de reciclagem”, resumiu para a Fundação Nobel Juleen Zierath, professora de Medicina Molecular.

Doenças lisossômicas

O mau funcionamento do processo pode provocar todo tipo de doenças, incluindo as chamadas “lisossômicas”, de origem genética, assim como a doença de Huntington, Alzheimer, Crohn, miopatias, entre outras.

“Problemas na autofagia estão ligados ao mal de Parkinson, à diabetes do tipo 2 e a outros problemas que aparecem nas pessoas mais velhas”, afirma o júri.

“As mutações dos genes da autofagia podem provocar doenças genéticas. Atualmente está acontecendo uma pesquisa intensa para desenvolver tratamentos que podem apontar para a autofagia em diferentes afecções”, destacou.

“Se a função da autofagia é defeituosa, as células nervosas não podem funcionar corretamente. Em estudos experimentais também foi observado que o embrião não pode se desenvolver com normalidade”, destacou o presidente da Assembleia Nobel de Medicina, Rune Toftgård, ao canal SVT.

Ohsumi, que hoje é professor do Instituto Tecnológico de Tóquio, receberá o prêmio de oito milhões de coroas suecas (834.000 euros, 934.000 dólares), além de um diploma e da medalha Nobel.


O biólogo, de 71 anos, atuou a maior parte de sua carreira na Universidade de Tóquio, pela qual recebeu um PhD e onde suas experiências se mostraram cruciais para compreender a renovação das células, o envelhecimento e a resposta do corpo à fome e às infecções.

“Esta é a maior honra para um pesquisador”, disse Ohsumi à emissora pública japonesa NHK.

“Meu moto é fazer o que os outros não querem fazer. Eu pensei (que a destruição celular) era muito interessante. Foi aí onde tudo começou”, afirmou.

Essa pesquisa “não chamou muita atenção no passado, mas agora estamos em um momento em que há um maior foco sobre isso”, acrescentou Ohsumi.

Temporada de prêmios

Yoshinori Ohsumi sucede William Campbell, americano nascido na Irlanda, o japonês Satoshi Omura e a chinesa Tu Youyou, premiados em 2015 por pesquisas sobre tratamentos contra as infecções parasitárias e a malária.

O Nobel de Medicina é o primeiro da temporada. Na terça-feira, será anunciado o prêmio de Física, para o qual a descoberta das ondas gravitacionais é vista como uma vencedora potencial.

A primeira observação de ondas gravitacionais foi anunciada em fevereiro de 2016, uma grande descoberta que confirma uma das previsões de Albert Einstein em sua teoria da relatividade geral.

O prêmio de Química, que será anunciado na quarta-feira, poderia ir para os pesquisadores que acrescentaram novos elementos à tabela periódica, como o nihonium ou o moscovium.

Na sexta-feira será a vez do Nobel da Paz, e na segunda-feira o de Economia. O Nobel de Literatura fecha a temporada, em 13 de outubro.

O júri norueguês que atribui o prêmio Nobel da Paz recebeu uma avalanche de indicações, 376, cem a mais que o recorde anterior, de 2014.

Entre estas, estão os artífices do acordo de paz na Colômbia e os envolvidos no tratado sobre o programa nuclear iraniano, vistos como vencedores potenciais.


O prêmio de Literatura tem entre os possíveis candidatos escritores conhecidos como o americano Philip Roth ou o japonês Haruki Murakami, assim como outros menos lidos, como o dramaturgo norueguês Jon Fosse ou o poeta sírio Adonis.


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