A jovem Daniele Martins ganha dinheiro de uma forma pouco ortodoxa: xeretando a vida dos outros. Aos 30 anos, Daniele é detetive particular há doze e tem troféus e diplomas espalhados pela sala de trabalho. Agitada e de fala rápida, a detetive não revela o faturamento da sua agência, mas garante que atende a 50 casos mensais.

Daniele Martins é detetive particular há 12 anos
Daniele Martins é detetive particular há 12 anos (Crédito:Alan Rodrigues)

Em sua contabilidade sobre o mercado da bisbilhotagem, 70% dos clientes querem saber sobre relações extraconjugais, 20% são casos empresariais e 10% casos de família, como pais monitorando filhos.

“Se trair, a gente descobre”, garante Daniele. O preço para contratar um serviço de uma agência de detetive particular, que lhe dará um dossiê completo do investigado, com fotos, gravações de áudio e vídeos, fica em torno de R$ 5 mil.

Mercado em alta

O mercado de detetives particulares ganhou mais força nos últimos meses, com a novela “A força do querer”, de Glória Perez. Na trama das 21h da TV Globo, a atriz Juliana Paes vive a personagem Bibi, uma esposa neurótica que usa diversas artimanhas para espionar o marido. “O papel da Juliana Paes monitorando o seu homem desperta a atenção de outras mulheres a investigar os parceiros”, diz Daniele.

Veja abaixo entrevista com a detetive Daniele Martins

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Restrições jurídicas

“As escutas têm uma regulamentação legal. Por exemplo, ninguém pode grampear o telefone do outro, mas grampear o próprio aparelho ou gravar a própria voz não é crime”, esclarece o delegado de polícia Jorge Lordello, especialista em segurança pública e privada.

Algumas pessoas dão celulares de presente a cônjuges já com o software espião instalado. A prática é mais comum em empresas, que já distribuem aparelhos para seus executivos com o software “espião” instalado. “No caso dos cônjuges, como não existe mais o crime de adultério muitas pessoas querem filmar a infidelidade do outro para depois humilhá-lo. Porém, acabam cometendo atos ilegais quando tornam públicas o conteúdo”, diz Lordello.

O impacto das redes sociais

[posts-relacionados]A popularidade das redes sociais tem gerado mais demanda de trabalho para os espiões. “Nosso serviço cresceu 25% nos últimos tempos por causa do WhatsApp”, atesta a detetive Daniele. Ela afirma que o aumento no número de usuários de aplicativos de relacionamento despertou a tentação dos ciumentos de fustigar o comportamento dos parceiros.

A detetive revela que o sucesso nas investigações – sete em cada dez pessoas investigadas são flagradas em relacionamento extraconjugal – motiva as pessoas a contratar os serviços de espionagem. “Elas já têm certeza da traição, só precisam da comprovação.”

Tecnologia ajuda na espionagem

Em suas investigações, detetives particulares usam uma série de equipamentos, como bonés, botões de camisas, cabides, canetas, gravatas, relógios e até sutiãs. Todos equipados com microcâmeras, gravadores e até GPS para monitorar pessoas e conversas.

A reportagem de ISTOÉ testou nas últimas semanas alguns desses equipamentos. Testou também um software usado em investigações particulares. Instalado em aparelhos com sistema Android, o programa funciona como um vírus e monitora todas as atividades do celular. É preciso ter acesso físico ao celular para instalar o programa. A instalação em si leva menos de dez minutos e há tutoriais na internet para ajudar no processo. O software é projetado para ser oculto, e não é fácil descobrir que ele está funcionando.

Depois de instalado o software “espião”, é possível monitorar a localização da pessoa por meio de GPS, acompanhar conversas no Whats App e Facebook, ver as páginas web acessadas e áudio de conversas telefônicas. É possível ainda ligar a câmera do celular a distância e assistir em tempo real a imagens e ouvir sons captados pelo aparelho. “Às vezes, o celular está na bolsa ou na blusa, então, a captação do áudio é muito importante”, observa a detetive Daniele.


Uma peça fundamental entre os equipamentos dos detetives é o mini-GPS magnético colado nos carros. Por meio dele é possível acompanhar em tempo real a circulação do carro onde estiver instalado o aparelho. A caixinha cabe na palma da mão. ISTOÉ testou este equipamento e ele funciona como prometido.

Detetive Luciana Leonel diz que rastreamento pelo celular é mais eficaz
Detetive Luciana Leonel diz que rastreamento pelo celular é mais eficaz (Crédito:Alan Rodrigues)

Esse equipamento, porém, perde seu uso quando o vigiado não usa seu automóvel. “Muitas pessoas deixam os próprios carros nos shoppings, ruas ou estacionamentos e partem para os encontros de Uber ou táxi”, revela a detetive Luciana Leonel.

“Por isso, é mais certeiro rastrear pelo celular. Esse não falha. Só se a pessoa deixá-lo no veículo”, completa. Em alguns casos, detetives particulares aplicam a tática mais tradicional de usar motos para seguir o vigiado.

Desconfiança motiva investigação

O dentista paulistano Manuel C., 35 anos, é um exemplo do cliente que costuma acionar escritórios de investigação. Vivendo há três anos com o arquiteto Alvaro, ele contratou uma agência de detetives para investigar o cotidiano do namorado que só chegava em casa de madrugada e andava meio misterioso. Desconfiado que o parceiro estava tendo um caso, ele gastou R$ 5 mil com uma agência. “Descobri que ele estava me traindo. A sacanagem ainda era maior já que ele ficava com um dos meus melhores amigos. Fiquei mal, fiz um barraco e me separei”, conta.

A empresária Juliana também recorreu aos serviços de uma detetive particular para investigar o marido. Depois de dez anos de casados, ela conta que instalou um software que espionava “tudo” no celular dele. Em uma semana, conseguiu provar que o marido estava tendo um caso.

De acordo com a empresária, seu marido andava estranho, “ficava horas” no banheiro com o celular, brigava se alguém tocasse no aparelho, chegava tarde em casa e dizia que estava trabalhando. “A mulher sente quando está sendo traída”, diz. Não contente com o que bisbilhotava no aparelho dele, a empresária queria ver com os próprios olhos o que as detetives lhe haviam mostrado em um dossiê. “Flagrei meu marido no motel com uma namorada. O mundo caiu”, finaliza.

Razões da traição

As razões que levam alguém a trair vão desde desejo sexual até vingança contra o parceiro, passando pela busca de novas experiências. O terapeuta familiar M. Gary Neuman, autor do livro “The Truth About Cheating” (“A verdade sobre a traição”), diz que 92% dos homens que traem não fazem isso primeiramente para ter sexo.

Entre os entrevistados por Neuman, um motivo citado para uma relação extraconjugal com bastante frequência é sentir-se desvalorizado no casamento ou distante da esposa. A pesquisa de Neuman mostra que cinco em cada dez homens traem por causa da insatisfação emocional. “Talvez por isso os homens sejam mais descuidados na hora de trair”, revela a detetive Luciana. “Eles são mais fáceis de serem pegos no flagra”.

Pais e filhos

Engana-se quem acha que o detetive particular só faz investigações conjugais. “Tem crescido o número de pessoas que contratam os serviços de detetives para investigar os próprios filhos”, diz a detetive Luciana. Problemas com más companhias, envolvimentos com drogas ou crimes são motivos que têm levado pais a investigar os filhos. “Boa parte deles quer saber se o filho é usuário de drogas e tem uma parcela que quer saber se os filhos são gays”, explica a detetive Daniele. “Visto como invasão de privacidade por muitos, o ato pode revelar condutas impróprias e salvar o adolescente do submundo do crime”, avalia.


Na psicologia, a fiscalização excessiva dos pais na vida dos filhos é chamada de monitoria negativa. Esse tipo de padrão caracteriza-se por uma grande quantidade de instruções repetitivas, que acabam não tendo efeito algum, já que não são seguidas pelos filhos.

De acordo com o psicólogo Leonardo Rinaldo Del Paggio, especialista em análise comportamental, a consequência desse monitoramento radical é que as crianças podem ter comportamentos agressivos na tentativa de proteger sua privacidade. “Algumas tentativas dos pais podem também interferir no desenvolvimento da independência do filho, podendo torná-lo dependente emocionalmente e contribuindo para sentimentos de culpa, angústia e inadequação”, avalia Del Paggio.


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