Com a exibição fora de concurso de Não Devore Meu Coração, de Felipe Bragança, o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro dá início a uma programação especial para comemorar sua 50.ª edição. Na mesma noite de abertura, no Cine Brasília, será entregue a medalha Paulo Emílio Salles Gomes ao consagrado cineasta Nelson Pereira dos Santos, precursor do Cinema Novo e um dos diretores mais importantes do movimento.

Criado em 1965 por vários intelectuais, entre os quais Paulo Emílio, então ligado à Universidade de Brasília, o festival recebeu o nome de Semana do Cinema Brasileiro e foi interrompido durante três anos – 1972, 1973 e 1974 – pela censura da ditadura militar. Não fosse o regime autoritário, estaria fazendo este ano sua 53.ª edição.

Essa história de resistência a um regime de exceção tornou-se seu DNA e fez de Brasília o mais politizado do circuito de festivais brasileiros. Essa, a sua melhor tradição, a de apresentar filmes de impacto tanto estético como social, ser plugado no momento político do País, ter sessões muito quentes no Cine Brasília e abrigar debates igualmente intensos sobre os filmes apresentados.

O tempo passou, o festival mudou, tem testado formatos diferentes ao longo dos anos. Manter viva essa chama e adaptá-la aos novos tempos será a tarefa nada simples da nova curadoria, que assumiu ano passado e agora será posta à prova em evento gigantesco e festivo pelo número redondo da edição de 2017.

Este ano serão nove longas-metragens e 12 curtas em competição, num evento que se estende ao longo de dez dias – desta sexta-feira, dia 15, a 24 de setembro. O filme de abertura não compete, assim como o de encerramento, Abaixo a Gravidade, de Edgard Navarro.

Neste ano comemorativo, Brasília faz como os outros festivais brasileiros e transforma-se em maratona cinematográfica. Os filmes em competição representam o filé mignon de todo festival, mas ocupam apenas o período da noite. O resto do dia estará reservado a outras atividades, que se pretendem tão atraentes como a apresentação dos candidatos aos Troféus Candango.

Para começar, como é de hábito, os filmes vistos a cada noite serão debatidos com público e jornalistas na manhã seguinte. É uma atividade comum a muitos festivais, mas que sempre recebeu destaque especial no Festival de Brasília. Debates longos e às vezes polêmicos fazem parte de sua melhor história. Falar dos filmes, discuti-los, amá-los ou odiá-los, defendê-los ou atacá-los é também fazer cinema e Brasília compreendeu isso antes dos outros festivais.

As tardes serão ocupadas por mesas de debates e seminários com temáticas diversas, porém com foco no cinema. Além disso, haverá três master classes comandadas por mulheres de destaque no atual cinema brasileiro – as diretoras Anna Muylaert e Laís Bodanzky, e a produtora Vânia Catani. Livros serão lançados, alguns sobre a própria história do evento: Entre Olhares e Afetos, de Sérgio Bazi e Sérgio Moriconi, e Candango – Memórias de um Festival, de Lino Meireles. Haverá a também habitual Mostra Brasília (com a produção local) e outras, como 50 anos em 5 – Os Melhores Filmes da História do Festival, com títulos selecionados pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine).

O gigantismo da edição deste ano não se deve apenas à data comemorativa, mas ao aumento exponencial da produção, que cresce ano a ano. A organização do festival divulgou que nada menos de 778 filmes se inscreveram no evento, 25% a mais que no ano passado. Essa overdose cria problemas e soluções para os organizadores de festivais. Problemas, porque sobrecarrega as comissões de seleção; é ingênuo supor que tal quantidade venha necessariamente acompanhada de qualidade. Soluções, porque permite, como é o caso este ano, que se faça uma seleção diversificada do ponto de vista regional com títulos inéditos no Brasil.

Parece um bom ponto de partida. Mas é apenas isso. O resto se verá ao longo da maratona.

NA COMPETIÇÃO

Arábia, de Affonso Uchoa e João Dumans, MG

Café com Canela, de Ary Rosa e Glenda Nicácio, BA

Construindo Pontes, de Heloisa Passos, PR

Era Uma Vez Brasília, de Adirley Queirós, DF

Música para Quando as Luzes se Apagam, de Ismael Cannepele, RS

O Nó do Diabo, de Ramon Porto Mota, Gabriel Martins, Ian Abé, Jhesus Tribuzi, PB

Pendular, de Julia Murat, RJ

Por Trás da Linha de Escudos, de Marcelo Pedroso, PE

Vazante, de Daniela Thomas, SP

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.