Oui, teremos Brasil no próximo Festival de Cannes, o de número 70, que este ano ocorre entre 17 e 28 de maio. Não há nenhum filme brasileiro na seleção oficial, anunciada na semana passada – competição e Un Certain Regard -, mas há um curta brasileiro na Quinzena dos Realizadores e um longa na Semana da Crítica. Os dois programas foram anunciados nesta sexta-feira, 21, por meio de coletivas, em Paris.

O longa é Gabriel e a Montanha, de Fellipe Barbosa, o talentoso autor de Casa Grande. Há três anos, o longa anterior do cineasta foi colocado pela crítica na vertente de O Som ao Redor, de Kleber Mendonça Filho, e na sequência Que Horas Ela Volta?, de Anna Muylaert, integrou-se a esse olhar sobre as desigualdades sociais do Brasil contemporâneo. Um condomínio fechado do Recife, uma família decadente (e o patriarca tenta esconder do próprio filho que estão arruinados), a filha da doméstica que vem tumultuar a ordem burguesa.

Todos esses filmes dialogam fortemente entre si, mas Gabriel é outra coisa. Isso, diz o diretor Barbosa, é o que ele pensava. Agora, ele já consegue fazer uma conexão entre Gabriel e Casa Grande, que terminava com o garoto na janela, de frente para o mundo. O novo filme começa onde o anterior terminava. O garoto agora é um homem, Gabriel, e acorda no meio da África. Gabriel Buchmann, amigo de infância do diretor – foi seu colega no Colégio São Bento e na PUC do Rio -, viajou à África para pesquisar a pobreza, mas a coisa terminou numa tragédia. Barbosa conta isso numa entrevista por telefone, de Paris. Ele está na França fazendo a mixagem do filme.

Conta que Gabriel e a Montanha vem crescendo dentro dele desde 2011, dois anos após a morte do amigo, em 2009. Nesse ínterim, Barbosa fez a própria viagem de pesquisa por sete países da África, refazendo a trajetória de Gabriel. Encontrou as pessoas que ele conheceu, e resolveu encenar o filme com elas. O ator João Pedro Zappa é quem faz o papel. Carolina Abras é sua namorada. Durante a jornada de Gabriel, ela foi ao encontro dele. Passaram três semanas juntos. O filme dá conta desse romance, do sonho de Gabriel. “Nunca me esqueço do e-mail que recebi dele, de Uganda, dando conta da felicidade imensa que estava sentindo. Amigos economistas achavam absurdo que o Gabriel tivesse ido investigar a pobreza em lugares pobres, mas para ele foi uma coisa de descoberta, de transcendência.”

No filme, Barbosa reduz a jornada de Gabriel por sete países a quatro – Quênia, Tanzânia, Zâmbia, Malaui. O filme já começa pelo fim, com a descoberta de seu corpo no mítico Monte Mulanje, onde, conta a lenda, J.R.R. Tolkien teria encontrado a inspiração para a monumental saga de O Senhor dos Anéis. Gabriel e a Montanha nasceu abençoado, diz Barbosa. O sucesso de Casa Grande na França lhe abriu portas, e a Até e o CNC, Centro Nacional do Cinema, uniram-se aos produtores do Brasil. Barbosa embarcou para a França no começo do mês, já sabendo que seu filme estaria na Semana da Crítica. O júri da seção será presidido por Kleber Mendonça Filho, seu amigo.

“Todo mundo sabe da minha admiração por ele, mas não tem nada a ver. O importante é que já viajei nesse estado de euforia. O filme passa continuamente na minha cabeça, e gosto do que vejo”, admite.

Cannes anunciou também, nesta sexta, a seleção da Quinzena dos Realizadores, que tem a chancela da Societé des Réalisateurs de Films. Será a 49ª Quinzena, e terá longas de Claire Denis, Un Beau Soleil Intérieur, logo na abertura; Abel Ferrara, Alive in France; Amos Gitai, West of the German River; Bruno Dumont, Jeannette, L’Enfance de Jeanne d’Arc; e Philippe Garrel, L’ Amant d’ Un Jour, não com Louis, mas com sua filha, Esther Garrel. O curta brasileiro da Quinzena é Nada, de Gabriel Martins, um dos criadores da produtora mineira Filmes de Plástico.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.