A manhã de 2 de janeiro, em sua ação de estreia no comando da maior metrópole do País, o prefeito João Doria (PSDB) colocou roupas de gari e se pôs a limpar uma praça na região central de São Paulo. O ato simboliza a promessa do empresário de realizar a faxina que São Paulo precisa. Mas será apenas um dos 118 compromissos que fizeram com que ele fosse escolhido ainda no primeiro turno da eleição do ano passado, um feito inédito. Cansados e estressados, os habitantes de São Paulo perdem em média três horas por dia no trânsito. No caminho, encaram os diversos problemas que o prefeito afirma que vai resolver por meio dessas medidas. “Ao lado dos garis e vestido como eles, fazemos uma demonstração de igualdade, humildade e trabalho”, disse Doria. “Vamos melhorar a qualidade da cidade. Somos servidores públicos e fomos eleitos para servir a população de São Paulo.”66

O problema que mais salta aos olhos de quem anda pela metrópole, e que o novo prefeito se comprometeu a combater de frente, é a falta de zeladoria urbana. Ou seja, o excesso de lixo espalhado, de muros pichados, de lâmpadas queimadas e de ambulantes ilegais. Por isso, nesse primeiro momento, o carro-chefe de Doria é o programa Cidade Linda, que o mandatário promoverá varrendo uma via diferente por semana. Começou pela praça 14 Bis, e já marcou faxinas também para a avenida Paulista, símbolo da capital, e a avenida Matteo Bei, na zona leste. O objetivo é realizar, com a ajuda de informações da população, mutirões de limpeza pela cidade. Além disso, ele planeja tirar 20 mil moradores de rua e colocá-los em abrigos mais humanizados. Isso vai funcionar por meio de parcerias com empresas privadas, construção de canis para os animais dessas pessoas e oferecimento de cursos profissionalizantes “A ação não pode correr o risco de ficar só nas zonas onde o prefeito vai”, afirma Américo Sampaio, gestor de projetos da Rede Nossa São Paulo. “Elas chamam atenção para a zeladoria, porém cria esse desafio para o próprio Doria”.

Problemas Imediatos

Mas não basta o Cidade Linda. Para 38% dos paulistanos, o principal problema da cidade é o descalabro da saúde, de acordo com uma pesquisa Datafolha. Para se ter ideia, o segundo lugar (segurança) fica com apenas 14% das respostas. Um levantamento feito pela Rede Nossa São Paulo mostra que a avaliação do setor só caiu desde 2009. Em 2013, 2014 e 2015, a nota dada à saúde paulistana pelas pessoas ouvidas ficou abaixo da média (4,9, 4,7, e 4,5, respectivamente). Para tanto, já na próxima semana, mais precisamente na terça-feira 10, o prefeito vai lançar o Corujão da Saúde. O programa prevê parcerias com hospitais privados para a realização de exames à noite e na madrugada. O objetivo é zerar a fila dos procedimentos, que é estimada em 417 mil e que provoca esperas superiores a seis meses. “É uma medida emergencial, que pode reduzir a fila, mas precisamos de ações de longo prazo”, diz Sampaio. “O verdadeiro problema é que ainda faltam médicos.”

A maior parte dos brasileiros pensa que a baixa qualidade da educação atrasa o desenvolvimento do País. Em São Paulo, o problema nos últimos anos esteve ligado à oferta de creches. O novo prefeito afirmou que zeraria a fila das instituições, hoje em 66 mil. Mas não se trata de um número estático. A projeção é que, com o aumento da oferta, aumente também a procura, que pode chegar a cerca de 130 mil. “É preciso aumentar o investimento e mobilizar capacidade política para oferecer essas vagas”, afirma Gustavo Fernandes, professor de finanças e políticas públicas da Fundação Getúlio Vargas (FGV). “Os primeiros anos são fundamentais para o resto da vida do indivíduo, então esse é um dos maiores crimes que os setores públicos fazem com a população brasileira.”Para isso, Doria planeja usar agências bancárias vazias para construir novas creches. Como as instituições estão diminuindo o número dessas filiais, o prefeito pedirá que alguns dos endereços sejam cedidos ao poder público.

Assumindo no mês das chuvas, Doria deverá enfrentar nesses primeiros dias de gestão um dos problemas crônicos de São Paulo, os alagamentos. O novo prefeito anunciou que vai instalar sensores de detecção de resíduos em bueiros, mas isso deve acontecer somente em 2017. Depois disso, promete construir 39 novos piscinões na cidade, que se somarão aos 20 hoje operando. Os especialistas consultados por ISTOÉ dizem que a medida pode ajudar no combate às enchentes, mas que a forma definitiva para acabar com elas passa pela diminuição da superfície asfaltada que impermeabiliza o solo. Um dos modelos que podem ser usados para alcançar esse objetivo é a concessão de benefícios fiscais para imóveis que diminuam a área coberta e a instalação de grades abertas para a terra nas faixas de estacionamento, atualmente pavimentadas. “Várias avenidas em São Paulo foram construídas em leitos de cheia dos rios. Não tem como aquilo não encher”, afirma Fernandes. “Resolver a questão dos alagamentos significa repensar a cidade completamente.”

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Uma das maiores polêmicas desse começo de mandato é a privatização do Parque do Ibirapuera, do Pavilhão de Exposições do Anhembi e do Autódromo de Interlagos. A prefeitura diz que os aparelhos dão ganhos muito pequenos ou prejuízos, mas a SPTuris, que administra os negócios e cujo maior acionista é o município, projeta lucros para Interlagos e Anhembi. Seja como for, o novo prefeito não está disposto a voltar atrás . “O setor público tem mais o que fazer”, diz. “Isso é questão de concepção. Alguns talvez gostem de coisas estatizadas, eu gosto de coisas privatizadas.” (leia entrevista no quadro).

Do ponto de vista das finanças, o desafio do novo mandatário é fazer valer sua fama de empresário competente, implementando medidas para melhorar resultados. Sem esquecer, claro, de gerar investimentos que permitam que a metrópole continue expandindo os serviços necessários. “O maior obstáculo do Doria é manter o aparato de fiscalização de inadimplência de impostos”, diz Fernandes. “Ele precisa vincular os gastos públicos com resultados concretos para o público.”

Quem telefona para a Prefeitura de São Paulo e tem sua ligação em espera ouve a música “My Way”, do americano Frank Sinatra. O prefeito garante que não a escolheu, mas que fica feliz com a comparação dele com o personagem da letra, um sujeito firme em suas convicções e que faz as coisas “do seu jeito”. Agora, a população paulistana espera que o “jeito” de Doria corrija os muitos problemas que a cidade ainda precisará enfrentar.

“Prefeito precisa dar o exemplo”
Em entrevista à ISTOÉ, o prefeito de São Paulo João Doria explica por que se vestiu de gari e quais são os novos programas que atenderão a parte excluída da cidade

No primeiro dia de trabalho, o senhor pôs a mão na massa, se vestiu de gari, e foi limpar a avenida 9 de Julho. Isso mostra um novo jeito de governar?
Vamos deixar a cidade linda. Começamos o projeto pela 9 de julho, mas neste sábado 7 vamos fazer o mesmo na Avenida Paulista. Com roupa de gari e vassoura na mão, eu e vários secretários, vamos limpar a avenida Paulista. Toda semana vamos fazer iniciativas em outros bairros. É um gesto também para mostrar apoio aos garis. É uma nova atitude.

Era prioritário limpar a cidade?
A cidade estava maltratada. Pichada, desleixada. O objetivo é que as pessoas percebam que a cidade tem vida e que devem se motivar a deixar a cidade mais limpa, sem jogar lixo nas ruas, nos córregos. O sentimento de solidariedade precisa crescer.

A cidade vai mudar sua cara?
Está sendo criado um programa chamado Olho Vivo. Vai ser voltado para a fiscalização da cidade e vai ajudar as pessoas a informarem onde há problemas, com canal de atendimento 24 horas. Será uma operação coordenada por três secretarias: Inovação e Tecnologia, Prefeituras Regionais e Segurança Urbana. Os funcionários serão servidores treinados para essa finalidade.

Outro projeto objetiva tirar todos os 20 mil moradores de rua e colocá-los em hotéis. Como vai funcionar isso?
Várias empresas estão se envolvendo no Espaço Vida, como vai se chamar esse programa. Vamos dar dignidade às pessoas que vivem em situação de rua. Muitas não querem sair das ruas porque vivem melhor nas ruas do que nos albergues da cidade. Os nossos albergues serão mais humanos, com funcionários de limpeza de Organizações Sociais (OSs) e empresas investirão em reformas nos prédios, melhoria nos quartos, nos banheiros. Vamos criar salas de aula para cursos de formação e vamos construir até canil para o morador de rua levar seu cão. Não vamos acabar com moradores de rua, mas vamos minimizar o problema.

E os problemas mais graves da cidade, como o caos da saúde?
A saúde é a prioridade número um de minha administração. No próximo dia 10 vamos lançar o Corujão da Saúde. O programa funcionará das 20h às 8h, mas vamos priorizar o atendimento até às 0h e a partir das 6h. No segundo semestre, vamos implantar o Doutor Saúde, um programa de prevenção com carretas que vão visitar os bairros. A ação preventiva implica em um custo cinco vezes menor do que a curativa. Vamos zerar as filas por exames e consultas na cidade.

O senhor também pretende implementar um plano para minimizar os problemas com enchentes que se repetem todo verão?
Já elaboramos um plano da prefeitura em conjunto com órgãos do governo do Estado. É um problema recorrente da cidade e vamos minimizar o efeito das chuvas. Criamos um comitê de chuvas de verão, com o monitoramos 24h por dia, com os satélites do serviço meteorológico. Livrar a cidade das enchentes não vamos conseguir, mas vamos reduzir os danos. E vamos investir nos piscinões. Temos 20 e vamos construir mais 39 até o final da administração. Aí sim vamos ter uma situação suportável.

E o programa de privatização, como está?
Este ano vamos fazer todas as modelagens do programa. Algumas ainda implementadas este ano, mas as demais em 2018. O grande destaque será a privatização do Anhembi e Interlagos. Nas parcerias vamos abrir para o Estádio do Pacaembu e para os 128 parques da cidade. No setor de PPPs vamos conceder os cemitérios e o crematório de Vila Alpina. Isso é questão de concepção. Alguns talvez gostem de coisas estatizadas, eu gosto de coisas privatizadas.

*Por Germano Oliveira e Raul Montenegro

OS PROBLEMAS DE SÃO PAULO

ZELADORIA
Doria vai se vestir toda semana de gari para estimular paulistano a manter a cidade limpa
EDUCAÇÃO
Promete abrir 66 mil vagas em creches, o que especialistas acreditam ser número realista
SAÚDE
Foco hoje é programa emergencial Corujão, mas prefeito quer expandir ações no segundo semestre
ENCHENTES
Para minimizar os efeitos das chuvas de verão, quer construir 39 piscinões e instalar sensores contra entupimento de bueiros
MORADORES DE RUA
A cidade têm 20 mil moradores de rua, que deverão ser abrigados em hotéis mantidos por empresas. Eles terão canil para seus animais

Os cortes de Crivella
Em discurso de posse, novo prefeito do Rio de Janeiro prometeu austeridade

Na veia O novo prefeito do Rio, Marcelo Crivella, promete dar o sangue para tirar o Rio da crise
NA VEIA O novo prefeito do Rio, Marcelo Crivella, promete dar o sangue para tirar o Rio da crise

Empossado domingo 1º na Câmara Municipal, no Centro do Rio de Janeiro, o novo prefeito da cidade, Marcelo Crivella (PRB), anunciou diversas medidas para conter os gastos públicos. “A ordem é a seguinte: é proibido gastar”, disse. “O País está em crise. O Rio de Janeiro está em crise. A cidade está nesse cenário. É tempo de cautela”.


Entre as medidas, Crivella quer reduzir à metade os gastos com cargos comissionados. Ele aguarda um lista com os funcionários a serem cortados em 20 dias. De acordo com a nova equipe, o corte representará uma economia de R$ 300 milhões por ano.

Uma área que terá total atenção de Crivella, no entanto, é a saúde. A meta do prefeito é reduzir as filas do Sistema de Regulação (Sisreg). Hoje, cerca de cem mil pacientes estão esperando atendimento. Destes, 30 mil aguardam cirurgias de baixa complexibilidade. Ele pretende implantar um terceiro turno nos hospitais públicos e conveniados e firmar acordos com o governo do Estado e da União para fazer mutirões de cirurgias.

Como símbolo de sua preocupação, em seu primeiro ato oficial como prefeito, Crivella foi ao HemoRio doar sangue. “É um ato de solidariedade. É simbólico”, disse.

A farra de Kalil
Novo prefeito de Belo Horizonte defende cortes de gastos, mas não pretende mexer no aumento salarial para prefeito, vereadores e secretários dado pelo antecessor

Confuso O novo prefeito de BH, Alexandre Kalil disse que vai reduzir despesas, mas não cortou aumento de salário de 25,86% para ele
CONFUSO O novo prefeito de BH, Alexandre Kalil disse que vai reduzir despesas, mas não cortou aumento de salário de 25,86% para ele

Desde que tomou posse na Câmara dos Vereadores, no domingo 1º, o novo prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PHS), tem deixado os moradores da cidade um pouco confusos. Ele afirmou que pretende cortar gastos desnecessários. Porém, deixou claro que o aumento de 25,86% no salário de prefeito e de 9,82% dos vereadores, medida tomada pelo ex-prefeito Márcio Lacerda (PSB) em seu último dia de mandato, não entrará na lista de cortes que pretende fazer para reerguer as contas da cidade. “Bons técnicos precisam ter bons salários”, afirmou. O reajuste dos salários e o aumento médio de 9,04% nas passagens de ônibus na terça-feira 3, contudo, foram alvos de protesto durante discurso de posse. Em diversos momentos o público gritou “Kalil, cancela o aumento”, mas não comoveu o novo prefeito.

Como parte da medida de austeridade, Kalil exonerou 2,8 mil cargos comissionados, mas disse que algumas dessas funções seriam substituídas por pessoas de sua confiança. Na segunda-feira 2, ele voltou atrás. Depois de demitir toda a equipe de segurança, por exemplo, ele desfez a ação porque “prefeito não pode ficar sem segurança”. Kalil também afirmou que algumas das pessoas que perderam o emprego poderão voltar aos cargos.

 

 


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