Canadá, Estados Unidos e México inauguram, neste sábado (23), sua terceira rodada de renegociação do Acordo de Livre-Comércio da América do Norte (Nafta, na sigla em inglês), que se vislumbra como difícil, devido a tensões e divergências entre as partes.

Durante cinco dias, os negociadores vão trabalhar com base em um texto dotado de “uma série de propostas” elaboradas em uma reunião prévia no México, no início do mês, informou o Ministério canadense das Relações Exteriores.

A renegociação desse acordo vigente desde 1994 foi exigida pelo presidente Donald Trump, por considerar o Nafta o “pior tratado já firmado pelos Estados Unidos”.

Após as negociações no México, o representante comercial dos Estados Unidos, Robert Lighthizer, a chanceler canadense, Chrystia Freeland, e o ministro mexicano da Economia, Ildefonso Guajardo, disseram ter feito “importantes avanços”.

Ainda não se divulgou qualquer detalhe sobre os temas mais delicados. Entre eles, está o futuro do setor manufatureiro (especialmente de automóveis), ou da agricultura. Esses assuntos são o alvo principal de Trump. Com frequência, o presidente americano diz que são condições que beneficiam o México e prejudicam os Estados Unidos.

Trump ameaçou deixar o Nafta, alegando que as empresas americanas optam por se instalarem no México, país onde a mão de obra é mais barata.

Lighthizer disse ter dúvidas sobre a possibilidade de “se chegar a uma conclusão”, embora tenha reconhecido que as negociações avançam a toda velocidade.

Obrigados a negociar, México e Canadá não querem ceder as vantagens obtidas desde que esse acordo permitiu, em 1994, a livre-circulação de bens em um mercado de 500 milhões de habitantes.

– ‘Não será o fim do mundo’ –

Em conferência no Council on Foreign Relations, um “think tank” com sede em Nova York, nesta sexta-feira (22), o ministro mexicano das Relações Exteriores, Luis Videgaray, mostrou-se otimista, mas, ao mesmo tempo, disse que a saída dos EUA “não será o fim do mundo”.

“Os dois governos (México e EUA) estão indo bem. O diálogo é menos beligerante do que a gente pensava. Temos uma chance real de chegar a um acordo”, comentou Videgaray.

“Mas, se o Nafta terminar (…) não é o fim do mundo e, certamente, não é o fim do comércio entre México e Estados Unidos”, assegurou.

O chanceler mexicano explicou que mais da metade do comércio com o vizinho do norte é regida por normas da Organização Mundial do Comércio (OMC), e não pelo Nafta.

“As pessoas estão começando a se dar conta de que pode haver vida após o Nafta e a entender melhor o funcionamento do comércio bilateral, o que está estimulando a confiança empresarial e os preços de ativos”, disse Videgaray, que está em Nova York para assistir à Assembleia Geral da ONU.

Ele reconheceu, porém, que há incerteza e que isso está afetando alguns investimentos.

“Temos de admitir que existe certa incerteza. E alguns tipos de investimento, em particular, talvez não estejam chegando, porque os investidores e as empresas precisam de garantias sobre as regras do jogo e sobre as regras do comércio”, completou.

– Madeira, leite e Bombardier –

A ministra canadense insiste em que a modernização do Nafta não pode ser feita na base do “ganhar, ganhar e ganhar” para os três países.

As negociações transcorrem em um clima pouco favorável para acordos. O Canadá não é alvo da ira de Trump, mas se queixa das demandas dos EUA, devido aos supostos subsídios à madeira de construção canadense, às ameaças à sua indústria láctea e às denúncias da americana Boeing pelas ajudas do governo à Bombardier.

Esta semana, o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, ameaçou não comprar aviões de combate Boeing, se a empresa conseguir da Casa Branca direitos antidumping contra os aviões Bombardier vendidos para companhias aéreas americanas.

“Se a Boeing insiste em querer eliminar dezenas de milhares de empregos no Canadá ao atacar a Bombardier, não devem esperar (…) que compremos aviões deles”, afirmou Trudeau.

Depois da rodada de Ottawa, as partes voltarão a se reunir em outubro, em Washington, onde as negociações tiveram início, há dois meses. O objetivo é fechar o acordo até dezembro agora, porque 2018 será ano eleitoral tanto no México quanto nos Estados Unidos, e isso complicará ainda mais o diálogo.

“Para os funcionários mexicanos será muito difícil negociar” conforme se aproxima a eleição à Presidência em julho, disse Daniel Kerner, do grupo Eurasia, especializado em empresas.

“Esperamos que as negociações se acelerem (…) mas o calendário previsto não será cumprido”, garante Carlo Dade, da Universidade de Ottawa.

Ele acredita, porém, que um acordo possa ser fechado no início de 2019.

“As fortes divisões entre os três países parecem comprometer a possibilidade de um acordo no curto prazo”, reforçou Russ Crawford, da consultoria KPMG.

Por isso, a KPMG recomenda às empresas que preparem “planos de urgência (…) porque os riscos podem ser imprevisíveis”, acrescentou.