REVER_Augusto de Campos/ Sesc Pompéia, SP/ até 31/7
Artéria 40 anos/ Caixa Cultural São Paulo/ até 17/7

Duas pesquisas divulgadas em maio precisam os contornos devastadores do cenário literário hoje no Brasil. A pesquisa Produção e Venda do Setor Editorial apontou um encolhimento de 10,65% em livros vendidos em 2015 em relação ao ano anterior. Também traduziu-se menos: 4.781 ante 5.918, além da queda de 13,81% na publicação de livros de autores brasileiros. Como se não bastasse, a pesquisa Retratos da Leitura apontou que 44% da população brasileira não lê e 30% nunca comprou um livro.

Acima, o neon “Rever” (1999), título da exposição que explicita a atitude de permanente reconstrução da obra de Augusto de Campos
Acima, o neon “Rever” (1999), título da exposição que explicita a atitude de permanente reconstrução da obra de Augusto de Campos

A leitura perde para a televisão, a música e a internet, entre os hábitos dos brasileiros, mas prolifera em insuspeitos campos de resistência. Um deles é a área de convivência do Sesc Pompeia, em São Paulo, que agrega em um só espaço biblioteca, revistaria, sala de recreação infantil, área expositiva e uma lareira, em torno da qual a conversa entre os usuários do Sesc é naturalmente estimulada. É nesse espaço generoso, alegre e democrático, projetado pela arquiteta Lina Bo Bardi, que se oferece a exposição “REVER”, que revisa 65 anos de produção do poeta Augusto de Campos.

Ali, entre as sempre repletas mesas de leitura, convivem 75 trabalhos poéticos de quatro livros do autor: Viva Vaia (1979), Despoesia (1994), Não (2003) e Outro (2015), além de objetos, instalações e peças sonoras e audiovisuais realizadas com Cid Campos. Com curadoria de Daniel Rangel e concepção do ICCo (Instituto de Cultura Contemporânea), a mostra explora o conceito verbivocovisual da obra de Augusto de Campos – termo criado pelo escritor irlandês James Joyce que destaca a materialidade do poema em todas as dimensões, não só semântica, mas também sonora e visual.

Acima, “Anti ruído” (1964), da série popcretos
Acima, “Anti ruído” (1964), da série popcretos

Com Haroldo de Campos e Décio Pignatari, Augusto de Campos iniciou em 1952 o movimento concreto no Brasil, reinventando a métrica, a sonoridade e a visualidade da poesia brasileira. Desde os anos 1970, suas experiências de desconstrução e reconstrução de palavras superam os limites do livro. A vontade de se aproximar com o mundo levou-o a expandir sua produção para serigrafias, objetos, esculturas, colagens, instalações, áudios, animações e vídeos em 3D. “Estes poemas caberiam melhor talvez numa exposição, propostas como quadros, que num livro”, apontou Augusto de Campos no livro “Não”, em 2003.

Hoje os poemas de Augusto estão em duas exposições, a individual no Sesc, e a mostra comemorativa dos 40 anos da revista Artéria, na Caixa Cultural. Mas nem só por isso são organicamente conectados com o mundo. É necessário dizer que, embora a soma de ruídos do espaço de convivência não favoreça a audição de algumas versões sonoras de poemas musicados por Caetano Veloso ou Cid Campos, a vizinhança com os rituais cotidianos do Sesc Pompéia promove belas e novas relações. É notável, por exemplo, como os popcretos, colagens dos anos 1960 que flertam com a arte pop, parecem desvirtuar a leitura dos jornais naquele espaço compartilhado. Ou como o poema “Osc ont emp orâ neo snã osa bem ler” (2009), da série Intraduções, desafia com suas desconstruções silábicas a atenção do leitor visitante e torna-se mais um campo de resistência às tendências comportamentais que indicam o fim da leitura.