A Venezuela iniciou nesta quinta-feira o processo para deixar a Organização dos Estados Americanos (OEA). Qual foi a gota d’água que levou o presidente Nicolás Maduro a tomar esta decisão? O que pretende com isso? Que consequências terá esta decisão?

Por que a retirada?

A relação entre a OEA e a Venezuela nos últimos 15 anos tem sido tensa, e ainda mais com a chegada à secretaria-geral do uruguaio Luis Almagro, que não hesita em chamar Maduro de “ditador” e promover a aplicação da Carta Democrática, um instrumento que prevê sanções a um país em caso de ruptura da “ordem democrática”.

O “Vexit”, como alguns chamam, era esperado. A chanceler Delcy Rodríguez havia alertado que a Venezuela iria retirar-se do organismo caso uma reunião ministerial para avaliar a grave crise no país produtor de petróleo fosse aprovada.

E na quarta-feira, pouco depois da OEA convocar esta reunião, a Venezuela anunciou que denunciaria a Carta da OEA, citando “intervencionismo e ingerência”.

“O governo venezuelano levanta um novo escudo, em nome do princípio da não-intervenção, para evitar o escrutínio internacional em assuntos supranacionais, tais como os direitos humanos”, declarou à AFP a internacionalista Elsa Cardozo.

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail

Antes de sair do órgão, deve quitar uma dívida que em 2017 chegará a 10,5 milhões de dólares de quotas anuais para a OEA.

O mandato da Maduro termina em janeiro de 2019, quando o processo de retirada da OEA ainda não estará completo.

Evita sanções?

Rodriguez assegurou que a partir de agora a Venezuela não participará dos eventos da OEA.

Mas durante os dois anos do processo, a Venezuela “continuará sujeita às obrigações junto à OEA e passível de sanções”, explica o boliviano Jaime Aparicio, ex-presidente da Comissão Jurídica da OEA.

A suspensão de um país, prevista na Carta Democrática, precisa dos votos de 24 dos 34 países que integram a OEA reunidos em uma Assembleia Geral extraordinária. A reunião de chanceleres, que desencadeou a crise diplomática, foi aprovada pelo Conselho Permanente com 19 votos.

Denunciando a Carta da OEA, a Venezuela também sairia da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e de organizações como a CICAD (Comissão Interamericana para o Controle do Abuso de Drogas), da Comissão Jurídica Interamericana e da Comissão Interamericana de Mulheres.

A Venezuela já havia denunciado a Convenção Americana, o que implicou sua separação com a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).

Contudo, a saída não teria implicações econômicas imediatas. Paul Constance, porta-voz do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), disse que a Venezuela não tem nenhum empréstimo ativo.

“Não há disposições contratuais de empréstimo ou políticas que acelerem o reembolso de empréstimos, suspendam a elegibilidade para outros empréstimos ou que requeiram que um país membro mantenha uma relação especial com a OEA”, disse ele.

Caracas se isolaria?


A Venezuela, que também foi suspensa do Mercosul, “vai se tornar uma espécie de Coreia do Norte da América Latina, porque cortará todos os laços com o sistema interamericano”, afirma Aparicio.

E apesar de continuar como membro da OEA por mais dois anos, Caracas pode evitar que uma comissão do organismo visite o país para se encontrar com as partes em conflito e tentar promover soluções políticas.

O organismo não é convidado há tempos pelo governo venezuelano. Ele deixou de ser chamado, por exemplo, para observar as eleições desde 2006.

Cardozo advertiu, entretanto, que a Venezuela tornou-se “um grande problema” para o hemisfério, em razão da diáspora de venezuelanos que migram para outros países da região e pelas acusações dos Estados Unidos de tráfico de drogas e outros crimes contra altos funcionários, como o vice-presidente Tarek El Aissami.

Sobram aliados?

Rodriguez pediu à Comunidade dos Estados Latino-americanos e do Caribe (CELAC) para convocar uma reunião extraordinária, que foi fixada para 2 de maio em San Salvador.

Cardozo acredita que uma Venezuela mais isolada procura aliados me espaços “mais confortáveis e gerenciáveis”.

“Mas não acredito que seja fácil, na CELAC estão os mesmos 19 países que votaram a favor da reunião), com excepção dos Estados Unidos e Canadá”, ressalta Cardozo.

Na sua opinião, Maduro tentará “inventar um grupo de países amigos que lhe dê apoio”. Dos 33 membros da CELAC, 17 apoiaram a resolução da OEA.

E a nível mundial, “talvez espere apoio da Rússia ou China, denunciando manobras dos Estados Unidos, mas não haverá muitos países dispostos a fornecer abrigo para a Venezuela”, aponta o analista Carlos Romero.


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias