“Mais de 90% das pessoas que restringem a alimentação fracassam na tentativa de perder peso” - Sophie Deram, nutricionista
“Mais de 90% das pessoas que restringem a alimentação fracassam na tentativa de perder peso” – Sophie Deram, nutricionista (Crédito:FELIPE GABRIEL)

Depois de décadas pesquisando as razões pelas quais as dietas não funcionam, a ciência encontrou o culpado: as próprias dietas. Hoje não há um estudioso, médico ou nutricionista sério que avalize a adoção de regimes que preguem a retirada de nutrientes do cardápio. O consenso é que a estratégia até pode levar à perda de peso no começo, mas os quilos extras voltarão. Por esse motivo, as dietas da moda – coloca-se aí a do glúten, da lactose e da gelatina, por exemplo – perdem espaço. “Fala-se muito do impacto que elas terão em três meses, mas não se comenta o fracasso depois de dois anos”, diz a nutricionista Sophie Deram, autora do livro “O Peso das Dietas”. Entender por que esses métodos não cumprem o que prometem exige a compreensão da complexidade que envolve a relação entre o corpo, as emoções e a comida. Tudo seria muito mais simples se a conta para emagrecer requeresse apenas tirar da frente alimentos calóricos. Mas a equação não fecha de forma tão lógica. Há vários fatores que influenciam essa contabilidade, e levantá-los é um dos alvos da ciência do emagrecimento.

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Muitas respostas têm vindo das pesquisas com gente que come bem e não ganha um grama sequer. Qual é o segredo? Entre os cientistas empenhados em desvendá-lo está o médico Tim Spector, do King´s College, em Londres. Ele acaba de lançar no Brasil o livro “O Mito das Dietas – Por Que Algumas Pessoas Comem de Tudo e Não Engordam e Outras Fazem Regime, mas não Emagrecem”, no qual fala do peso da genética na obesidade, entre outros tópicos. Sabe-se que há mais de 140 pontos no genoma associados ao ganho extra de quilos, determinando aspectos como quem armazena mais gordura ou por que o exercício físico tem mais impacto em um ou em outro. Na Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, pesquisadores também procuram saber o que se pode aprender com quem não engorda. Em um dos trabalhos, 147 participantes foram divididos em dois grupos: o primeiro, de voluntários que não faziam restrições na dieta, e, o segundo, de pessoas que se submetiam a regimes regularmente, pensavam a respeito de comida frequentemente e prestavam muita atenção no que ingeriam. Verificou-se que os eternamente magros comem alimentos de alta qualidade nutricional, cozinham em casa, alimentam-se somente quando estão com fome, não têm sentimento de culpa quando exageram e mantêm uma relação prazerosa com a comida. Mais ou menos o que faz a produtora Daniela Dezan, 45 anos, de São Paulo, que sempre foi magra. “Não me privo de nada e acho que, por isso, minha relação com a comida é tranquila”, diz. Na opinião dos cientistas, as conclusões do trabalho são encorajadoras. “Elas demonstram que o ganho de peso pode ser prevenido se ensinarmos às pessoas a ouvir desde cedo seus desejos e dar ênfase à qualidade do alimento, e não à quantidade”, disse à ISTOÉ Anna-Leena Vuorinen, coordenadora do estudo.

De fato, uma das principais lições da pesquisa é a de que a obsessão em pensar em cada caloria ingerida e a culpa de comer – características muito comuns de quem faz dieta – só jogam contra no esforço para emagrecer. “São sentimentos que trazem consigo uma ansiedade grande, que provavelmente será descontada na alimentação”, afirma o médico Pedro Assed, do Grupo de Obesidade e Transtornos Alimentares, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). A estudante Laísa Lopes, 22 anos, do Rio de Janeiro, ficou refém dessa montanha russa durante anos. “As dietas me deixavam ansiosa e eu comia mais ainda. Hoje não me privo de nada”, diz Laísa, que emagreceu após aderir a um programa no qual aprendeu a usar o bom senso nas escolhas e quantidades do que come.

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Um obstáculo puramente fisiológico também é decisivo para o fracasso das dietas. “Restringir a ingestão de nutrientes deixa o organismo em estresse e impossibilitado de realizar as funções bioquímicas naturais”, afirma a nutricionista Cinthia Leitão, do Rio de Janeiro. O corpo dará sinais de que a falta daquele nutriente não é saudável e, para compensar, o apetite aumentará. “Quando se retorna para a alimentação habitual, a tendência é comer em excesso e ganhar mais peso do que se perdeu”, diz a nutricionista Andrea Santa Rosa, do Rio de Janeiro. “Além disso, ao fim da dieta, o organismo está com o metabolismo reduzido e as pessoas voltam a engordar”, diz a nutricionista Paula Castilho, de São Paulo. O carioca Francisco Reis, 46 anos, experimentou por anos o sobe-e-desce dos ponteiros da balança. “Era bailarino e sempre fiz dietas porque precisava manter o peso. Quando diminuí o ritmo da dança, engordei.” Francisco entrou para os Vigilantes do Peso e hoje come o que gosta, mas em pequenas quantidades.

As constatações científicas não deixam dúvidas de que as dietas são ineficazes. “Mais de 90% das pessoas que restringem a alimentação fracassam na tentativa de perder peso”, diz a nutricionista Sophie. “É preciso entender que nossa fome é biológica e psicológica. Quando confiamos no corpo e escutamos o que ele diz, a vida fica mais saudável.” O aprendizado desse conceito pela estudante paulista Letícia Marinho, 18 anos, mudou sua relação com os alimentos. Ela fez dietas durante anos, sem sucesso na manutenção do peso. Sob a orientação de Sophie, descobriu que é possível emagrecer sem restrições alimentares. “Cortei a proibição da minha cabeça e a vontade de comer de tudo sumiu”, diz. Em um ano, ela já perdeu quinze quilos.

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