Realizado com um orçamento de US$ 160 milhões, o filme “A Bela e a Fera” estreia nos cinemas em boa hora, pouco depois de “La La Land — Cantando Estações” ter encantado plateias de todo o mundo e ajudado a revigorar o interesse pelo gênero musical. “Com a porta que eles deixaram aberta, há uma chance de o espectador se acostumar novamente a ver musicais nas telas”, diz Bill Condon, diretor da adaptação com atores para a clássica animação lançada pela Disney em 1991. Para ele, o filme que chega aos cinemas do Brasil na quinta-feira 16 pode atingir um público que vai além das mulheres e da comunidade gay. “Queremos trazer o homem heterossexual aos cinemas também”, afirma o diretor.

Com as próximas versões em “live-action” (filmadas com atores) que a Disney prepara de seus desenhos clássicos, incluindo “O Rei Leão”, “Mulan” e “A Pequena Sereia”, Condon espera um revival do gênero em Hollywood. “É algo que não vemos desde os anos 1950”, diz, referindo-se à era de ouro dos musicais, com “Sinfonia de Paris” (1951), “Cantando na Chuva (1952), “A Roda da Fortuna” (1953) e tantos outros. O cineasta lembra que a indústria só retomou os musicais no final dos anos 1980 e 1990 — na era conhecida como “Renascimento Disney”, quando o estúdio de Mickey Mouse lançou uma safra de desenhos com personagens cantantes. “Mesmo assim, o filão foi reduzido a produções infantis, em tom artificial”, diz o diretor da nova versão de “A Bela e a Fera”.

BROADWAY E TV
É bem verdade que houve na década passada uma tentativa de ressuscitar grandes musicais com “Moulin Rouge: Amor em Vermelho” (2001), “Chicago” (2002) e “Dreamgirls: Em Busca de um Sonho” (2006, também dirigido por Condon). “No caso de ‘Dreamgirls’ e ‘Chicago’, o que motivou as transposições às telas foi o fato de as obras terem sido musicais de sucesso na Broadway. Ainda assim, a linguagem estava muito mais próxima daquela usada no palco”, diz Condon.

Para ele, “Glee” (2009-2015) e “High School Musical” (2006), feitos para a TV, também contribuíram para quebrar a resistência do espectador diante dos filmes pontuados por números de canto e dança. E o fenômeno de ‘La La Land’ mostrou que o público está mais aberto ao gênero. “O segmento se sofisticou, usando as canções para ajudar a contar a história e não apenas para acentuar os sentimentos. Hoje, quando o personagem termina de cantar uma música, ele avançou na trama, não estando mais no ponto dramático do início da canção. O número musical precisa fazer a história seguir em frente”, diz Condon.

Em carne e osso, “A Bela e a Fera” mais uma vez retrata o improvável romance entre a jovem filha de um mercador em ruínas (Emma Watson) e um príncipe amaldiçoado a viver como monstro (Dan Stevens). A nova versão busca recriar a atmosfera mágica e romântica do desenho, tirando proveito da sofisticação atingida hoje nos efeitos especiais — a ponto de protagonista interagir perfeitamente com a Fera. Embora tenha sido gerada por computador, a performance do monstro envolveu a captura dos movimentos e das expressões do ator, deixando-a mais realista.

BAILE Recriação da cena mais famosa do clássico da Disney: rosto da fera feito por computação e vestido amarelo sugerido pela atriz
VILÃO O ator Luke Evans como Gaston: clássico repaginado e glamourizado

Para quem é fã do desenho, a boa notícia é que todas as músicas da animação estão de volta, com os personagens cantando e dançando de forma natural e vibrante. Tudo foi feito no sentido de enaltecer o aspecto de conto de fada do desenho, sem qualquer intenção de radicalizar a história (como aconteceu com “Branca de Neve e o Caçador”, que a Universal lançou em 2012). Temos aqui o clássico repaginado e glamourizado, sem perder a pureza que marcou o original.

INSINUAÇÃO GAY
Embora a ideia seja alcançar um público mais amplo, Condon não resistiu fazer uma insinuação gay em “A Bela e a Fera”, Ainda que discreto, há um momento em que Le Fou, o servo do vilão Gaston, dá a impressão de estar interessado romanticamente em seu patrão, apesar dos abusos que sofre nas mãos do chefe narcisista. “Por que não deixar esse amor em aberto no filme? Afinal, ‘A Bela e a Fera’ é uma história de pessoas se apaixonando”, diz Condon, que é homossexual e vive com o parceiro Jack Morrissey, produtor de filmes.

ENTREVISTA

Emma Watson
BELA A atriz inglesa Emma Watson

EMMA WATSON
“Tema levar um tombo”

Famosa como Hermione da série “Harry Potter”, atriz fala do desafio de dar vida a Bela

O posto de embaixadora da ONU pelo direito das mulheres influencia as suas escolhas no cinema?
Muito. A própria Bela, que eu conheci ainda criança, sempre me inspirou. Muito do que ela dizia mexia comigo, no sentido de a personagem querer mais da vida do que a sociedade espera que ela queira. A maneira como ela não aceita o status quo, acreditando na sua força como mulher independente, tem a ver com a pessoa que sou hoje. E isso se reflete em tudo o que eu faço.

Isso vale também para o clube do livro feminista (Our Shared Shelf) que você lançou no ano passado?
Sim. Depois da faculdade de literatura eu queria continuar aprendendo. No último ano pude ler muito, principalmente obras inspiradoras sobre igualdade de gêneros. A ideia do clube é compartilhar tudo o que aprendemos.

Por ser um ícone da moda, você opinou no figurino da personagem Bela, incluindo o vestido de baile amarelo?
Tive de opinar quando percebi que o vestido inicialmente escolhido pela figurinista Jacqueline Durran não daria certo. Ela optou por um modelo tradicional, com saia estilo cortina, que se revelou muito pesado, não deixando o vestido flutuar na hora da dança. Foram várias versões até chegarmos ao modelo com camadas de organza, que dá a impressão de que estou voando na pista.

Sentiu muita pressão ao recriar a lendária cena de baile?
Sim. Não só pelo carinho que o público tem pela sequência, mas pelo que ela representa do ponto de vista narrativo. Como não temos muitas cenas que mostram a Bela e a Fera se apaixonando, o grande momento é a dança. Aqui eles começam a sentir algo mais profundo um pelo outro. Na hora de filmar, no entanto, não consegui pensar em nada…

Por quê?
O que eu mais temia era levar um tombo (risos). Usei saltos altos, estilo século 18, e o Dan tinha de dançar com pernas postiças para parecer bem mais alto. Ensaiamos a coreografia inicialmente sem os adereços, e deslizar pelo salão com eles parecia uma receita para o desastre.

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