“Aqueles que vêm aqui são geralmente do tipo mais estúpido e ignorante de sua própria nação.” A afirmação sobre os imigrantes carregada de preconceito poderia ter sido feita pelo presidente eleito dos Estados Unidos, o empresário Donald Trump, mas ela é muito mais antiga que ele. Vem de Benjamin Franklin, um dos “pais fundadores” (“founding fathers”, na expressão em inglês) do país e co-autor da Constituição americana. Ainda no século 18, Franklin se preocupava com a ameaça de os alemães que chegavam à América – como o avô de Trump, Friedrich Drumpf – consagrarem sua língua e seus costumes em vez de incorporarem a cultura local. Décadas depois, a preocupação foi transferida para os irlandeses, que, pobres e famintos, emigraram para os EUA dispostos a trabalhar por uma remuneração menor que a dos nativos. Como pôde ser visto nas eleições americanas deste ano, esse temor nunca foi superado.

Trump foi eleito ao colocar a imigração e o emprego como prioridades. Na semana passada, reafirmou os planos de construir um muro na fronteira com o México. Mais: o republicano disse que pretende deportar até 3 milhões de imigrantes ilegais assim que iniciar seu governo. Para isso, começaria por aqueles que têm antecedentes criminais, os “bad hombres”, como Trump mesmo apelidou. “É muito difícil colocar essa ideia em prática”, disse à ISTOÉ Randy Capps, diretor de pesquisas do Instituto de Política Migratória, de Washington. “O governo teria que encontrar essas pessoas, identificá-las, construir detenções, tribunais de imigração e pagar transporte para todos. Isso tudo é muito caro.”

Além do custo da operação em si – entre US$ 400 bilhões e US$ 600 bilhões –, o novo presidente teria que lidar com a falta de colaboração de metrópoles como Chicago, Nova York, Los Angeles e São Francisco. “Nós vamos confrontar tudo que é visto como uma ameaça aos nova-iorquinos”, disse Bill de Blasio, prefeito da cidade, sobre a política de deportação em massa. “Não vamos separar famílias.” Capps argumenta que essa oposição é crucial, porque a maioria dos processos de deportação realizados atualmente começa quando a polícia local prende alguém. Os imigrantes sem documentos que cometeram algum crime são, portanto, identificados por agentes locais e não federais.

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Efeito contrário
Ao lado de Trump, há ao menos dois programas lançados pela administração de Barack Obama, que agora podem ter efeito contrário. Eles protegem da deportação os filhos de imigrantes que entraram no país ilegalmente quando eram crianças, e os adultos que são pais de cidadãos americanos – hoje os bebês que nascem nos EUA recebem a cidadania automaticamente, mas Trump já prometeu acabar com essa prática. O problema é que essas iniciativas de Obama criaram um banco de dados com nome e endereço de pessoas declaradamente ilegais. Mais de 1,3 milhão de jovens se inscreveram na esperança de receber uma anistia. Agora eles podem ser os primeiros a ter que deixar o país.

Expulsá-los, no entanto, seria um erro não só por mudar a cultura de um país, que historicamente sempre foi dos mais abertos aos estrangeiros, e criar um sentimento de que os imigrantes não são bem-vindos – entre o dia seguinte à eleição, 9 de novembro, e a segunda-feira 14, o Southern Poverty Law Center, do Alabama, registrou mais de 400 casos de crimes de ódio, a maioria contra imigrantes –, mas também pelo impacto econômico que essa ação teria. Segundo o American Action Forum, a remoção de todos os imigrantes sem documentos reduziria o Produto Interno Bruto em mais de US$ 1 trilhão. Considerando que, em 2012, eles correspondiam a 5,6% do total de trabalhadores do setor privado, sua saída do mercado diminuiria o faturamento da indústria entre US$ 381,5 bilhões e US$ 623,2 bilhões. Isso porque, mesmo se os americanos preenchessem os empregos deixados pelos ilegais, não haveria desempregados suficientes para suprir cerca de 6,8 milhões de vagas de trabalho. Nem todos também estariam dispostos a encarar o que os imigrantes fazem para sobreviver (a maioria trabalha na agricultura e na construção civil).

“É impossível imaginar a América sem os imigrantes”, afirma Jeremy Robbins, diretor-executivo do Partnership for a New American Economy, organização de prefeitos e empresários que defende a reforma do sistema imigratório nos EUA. O instituto calcula que os imigrantes são duas vezes mais propensos a abrir seu próprio negócio do que os americanos e que mais de 40% das 500 maiores empresas do país foram fundadas por imigrantes ou filhos de imigrantes. “A imigração tem papel-chave para nossa competitividade”, diz Robbins. “Estamos melhor que a Europa e o Japão justamente porque temos jovens que querem vir para cá e nos ajudar a crescer.”

Diversidade
Estatísticas sobre a população de imigrantes nos EUA
11 milhões
Número estimado de imigrantes que vivem lá ilegalmente

21%
Porcentagem de casas de famílias nos EUA onde o principal idioma não é o inglês

US$ 1 trilhão
Projeção de redução do PIB americano se todos os imigrantes fossem expulsos do país

17,6%
Participação dos latinos na população americana; a maioria deles nasceu lá

28%
Do total de imigrantes vêm do México; em seguida, aparecem indianos e chineses

119 milhões
Projeção da população latina no país em 2060